sábado, 8 de setembro de 2018

OS CRAQUE E SUAS HISTÓRIAS

                                    O TEMPO PRESENTE É O MOMENTO DE
                              REVER O PASSADO E CONSTRUIR O PRESENTE.


                                            OS CRAQUES E SUAS HISTÓRIAS.



Mário Américo e Zito.
Nessa altura a bola já estava com Paulo Machado de Carvalho.

O quem importa, mesmo, é que o relato seja fiel e revele aspectos ainda inéditos. A novela da bola do último jogo, por exemplo, Mário Américo contra:

- Até que a ideia não foi minha. Quem me chamou para um canto e fez o pedido foi o dr. Paulo Machado de Carvalho.

Assim: Mário, o Brasil vai ganhar o jogo amanhã com a Suécia. Eu quero e faço questão que a bola fique conosco.

- Decidi no mesmo instante, já empolgada, que apanharia a bola da vitória custe o que custasse. Primeiro, porque se tratava de um pedido especialíssimo do dr. Paulo Machado, home bom e meu chefe. Depois, porque sempre considerei a bola do jogo o maior troféu do triunfo. Lembro-me bem: quando faltavam dois minutos para terminar a partida, corri para dentro do campo para socorrer Pelé, contundido após p quinto gol do Brasil. E pedi a Belini, e pedi a Zagalo, que apanhasse a bola e jogassem para mim, mal o jogo terminasse. Não deu tempo, porém, Mr. Guigue apitou o fim do jogo e meteu a bola debaixo do braço. Resolvi então tomar a bola na raça, disposto a tudo, inclusive a investir às cabeçadas contra quem tentasse me travar na corrida para o vestiário. Entretanto, chorando, apenas os jornalistas e locutores tentaram abraçar-me. Pedi paciência: primeiro tinha que esconder a bola no vestiário. Depois, sim, eu viria a chorar com eles a alegria de campeão do mundo.2          



BIGODE

Bigode, foi um os mais criticados da final da Copa do Mundo de 1950, conta a Copa com ele foi.

- Naturalmente que tudo correndo mais azul do que prevíamos, o jogo do Brasil contra os uruguaios era apenas como uma espécie da festa do encerramento. Fomos posto das mais sórdidas campanhas políticas e publicitária. Vários candidatos a postos eletivos começaram a demagogia. Ás agências de publicidade cercavam-nos a fim de que posássemos, aconselhar esse ou aquele refrigerante. Os mais eufóricos entregaram-se totalmente. Eu não estava entre eles. Quem me conhece percebe o meu modo de ser geralmente pacato. Numa festa desse alcance não poderia faltar uma missa solene. As seis horas da manhã de domingo, dia do jogo, fomos (por imposição do alto comando) à missa dos barbadinhos (secretamente). Tudo pronto para a festa. Faltando duas horas para enfrentarmos os uruguaios, fui advertido de que não jogasse muito pesado. Acatei as ordens, muito embora acreditasse que não seria tão fácil o jogo. Havia um homem que eu temia: Júlio Perez, conhecia todo seu maravilhoso futebol. Quando começou o jogo, numa disputa de bola com esse atacante “fui duro”. Nessa ocasião aconteceu a tal “bofetada” de Obdúlio. Na realidade ele tocou-me no pescoço e disse: “tche muchacho, vá com calma”. Zizinho e Ademir correram “calma Bigode, não precisa fazer isso”. Fiquei entre Gighia e Júlio Perez, no lance do gol, essa a minha posição. Bola de Obdúlio a Gighia, esse apertado por mim devolve a Júlio Perez. O atacante uruguaio um verdadeiro craque, devolveu a bola pelo alto, em profundidade, no que vocês chamam de espaço vazio. Esse lance foi no meio do campo. Quem atacou o Gighia até o gol? Quem me deu cobertura? Mesmo assim, o ponteiro percebendo minha aproximação chutou. Senti que seu pé chutou um pedaço de grama. O enorme silêncio do estádio disse tudo. O único homem a recriminar minha conduta foi Juvenal. Atleta sem compostura, não teve outras palavras: ”olha aí seu Bigode, essas vaias são para você”...Perdi 5 quilos em uma semana, não saia, não comia, não dormia. Uma semana depois joguei no mesmo Maracanã contra o Bangu. E se não tenho a coragem que Deus me deu, jamais jogaria cinco anos após aquele fracasso. Voltei ao Fluminense e lá terminei meus dias”.




  Silva e o gol salvo pelo massagista

Silva continua sendo o maior ponteiro esquerdo da história do futebol alagoano em todos os tempos. Ponta ofensivo, Silva é o maior artilheiro dos clássicos – CRB x CRB -  Ele foi um dos personagens daquele lance polêmico de 1976. Passados tantos, Silva diz que o lance não sai da sua cabeça.

“O massagista Castanha estava junto a trave do CSA para passar um recado do seu treinador para o goleiro Paulo Cesar. Talvez por isso, o Paulo tenha se atrapalhado e saiu mal na bola cruzada da direita. Eu vinha fechando na diagonal e, de cabeça, mandei para o gol vazio. Tinha tanta certeza do gol que virei para o meio do campo afim de receber os abraços dos companheiros. De repente vejo a bola passar por mim em direção ao meio do campo. Quando senti que o Castanha não permitiu que a boa entrasse no gol do CSA e saiu correndo em direção ao túnel azulino, eu fui atrás, mas não consegui alcança-lo. Se eu pego o Castanha e ter a maior confusão”.

Silva chega a se divertir com as comédias do Castanha nos campos de futebol.

“O jogo estava no seu final. Para nós somente a vitória interessava. O jogo estava 1x1 e o lance comentado seria o gol da vitória e o titulo de campeão do primeiro turno. Os jogadores do CRB e sua torcida estavam revoltados com a atitude do massagista do CSA. Resultado: o Castanha salvou o gol. O juiz marcou o que tinha que marcar e nós ficamos no prejuízo.”.

  

Fleitas Solich e Dida.

DECISÃO DO CAMPEONATO DE 1955
FLAMENGO 4 x AMÉRICA 1

Fletas Solich explicou os 4x1, assim.
 – Joguei uma cartada perigosa, confesso, quando lancei Servilho e Dida tirando Jadir e Paulinho. Entretanto, para o jogo que pretendia fazer, precisava dessas alterações. Não porque os entraram fossem melhores do que os que saíram. Mas, simplesmente. Porque se adaptavam melhor a tática visada. Por isso, arrisquei.
 - Servilho teve uma missão anular:  anular Leônidas. Anulou. Dida entrou para puxar a linha com sua ligeireza, para arrematar, para tontear a defesa adversária com seu jogo leve e esfuziante. Cumpriu a tarefa. Tanto que foi o artilheiro da partida.  Procurei fortalecer a defesa da área tanto quando possível. Tanto na zona central. Depois nas laterais. O bloqueio maciço tinha um objetivo: impedir os arremates à queima roupa. Deu certo: o América não chutou uma vez de perto. O próprio gol do Romeiro foi feito de fora da área.

- Com o recuo de Zagalo (às vezes) e Duca, para o trabalho de meia cancha com Dequinha foi previsto. Assim, a partir da intermediária num espaço nunca maior que dez metros, sempre com um homem, Servilho, Dequinha, Duca, Joel ou Zagalo. Era uma linha imaginária de ligação, em ziguezague. Era, também, o caminho que a bola devia seguir. E por ali, ela trafegou muitas vezes. Quando Alarcon saiu, infelizmente para o América, machucou-se, mantive o mesmo jogo. Se bem que a defesa tivesse mais desafogada. Procurei, então explorar Helio, cuja missão dobrou dentro da partida. Além do mais era o lado que devis ser explorado. Porque Rubens também avançava, fazendo parte do vai e vem que caberia, talvez, a Alarcon, depois Romeiro. Com o zagueiro na frente, Evaristo ficou muitas vezes a vontade. Por isso, que em quase todas as pontadas do nosso do nosso ataque levamos perigo ao reduto contrário. O América foi um, adversário que nunca se entregou. 

          

ALARCON

Aconteceu na negra entre Flamengo e América, pe3la decisão do campeonato carioca de 1955. Disputando uma bola com Tomires, Alarcon caiu e ficou batido na cancha. Ainda fez ato de presença durante alguns minutos, e só mais tarde seu a devida importância ao caso, porque só mais tarde se soube que Alarcon tinha sofrido uma contusão grave, tão grave que, segundo os primeiros diagnósticos, dificilmente voltaria a jogar futebol em sua vida.

Hoje, correndo, driblando e chutando Alarcon abre-se num riso que mostra todos os dentes que Deus lhe deu, e diz:

- Nasci outra vez para o futebol. Porque tanto disseram pelos jornais, tantas vezes as estações de rádio repetiram, que acabei por me convencer que era um caso perdido. Um aleijado para o futebol. Felizmente, com o correr do tempo, reagi bem, saindo de um estado de depressão quase mórbido, que deu lugar a uma vontade de ferro de voltar a jogar, custasse o que custasse. E custou muito mesmo.

Enquanto a medicina estudava o caso de Alarcon, os mexericos cresciam. Assegurava-se, por exemplo, que Alarcon, a partir do dia do acidente, devotava um ódio sem nome a Tomires. E diziam mais, diziam que, contorcendo-se em dores no vestiário, enquanto era medicado, Alarcom teria levantado as mãos para os céus, para maldizer e marcar Tomires até o fim do mundo. A praga, segundo os ouvintes interessados em alimentar ódios, teria sido feita nos seguintes termos:

- Viverei para ver uma perna de Tomires apodrecer.   

E Alarcom, com a maior simplicidade, põe o preto no branco.

- Não sei, com franqueza, se teria coragem de lançar uma praga assim. A verdade, porém, é que não tive qualquer pensamento mau para Tomires. Explico: não podia regar praga a Tomires, porque, para mim, Tomires não teve culpa no acidente que, por pouco me afastou definitivamente do futebol. Na dúvida, sofri como se tivesse amputado o pé. Minha vida está nos pés, que uso para jogar o futebol, enquanto tiver mocidade para correr e lutar durante 90 minutos.


Reportagem de Paulo Rodrigues para a Manchete Esportiva de 1957.   
         

                            1956 - JOGO DA INAUGURAÇÃO DO ESTÁDIO DE PRÓPRIA.
                                                    PASSAGEM 1 X CRB 1




                                                            PAULO PATRIOTA.
                                   Fazendo o seu depoimento para o Museu dos Esportes.

Em 1956, o Clube de Regatas Brasil foi jogar amistosamente na cidade sergipana de Própria. Lá aconteceu um fato que somente no submundo do futebol pode acontecer. Vamos contar esta história em duas versões. O árbitro Louvain Ayres e o jogador Paulo Patriota, em depoimentos ao Museu dos Esportes, contaram como tudo aconteceu.

O futebol de Própria estava parado a muito tempo. Para comemorar o retorno do esporte das multidões aos gramados daquela cidade, seus dirigentes convidaram o Clube de Regatas Brasil para um amistoso. Na delegação alagoana seguiu o árbitro da Federação Alagoana de Desportos, Louvain Ayres. Os alagoanos ficaram hospedados no Hotel de Porto Real do Colégio, no outro lado do rio.

Paulo Patriota, um dos grandes jogadores do futebol alagoano e fazia parte do time regateano. Ele contou sua versão. Antes do jogo, o árbitro Louvain Ayres, chamou os dois times e avisou: “a cidade está preparando  uma grande festa e o ideal seria que a partida terminasse empatada. É um amistoso, e assim, todos ganhariam e a festa seria completa”. O time do CRB era muito superior em tudo. Logo depois da saída, um ataque fulminante dos alagoanos que terminou com um gol de Paulo Patriota. Louvain Ayres chamou o artilheiro e pediu para ele não fazer mais aquilo porque senão teria que expulsá-lo. Paulo não levou a sério a advertência e o jogo continuou. Um pouco mais e novo gol de Paulo Patriota. O árbitro anulou o gol indicando um impedimento que não houve. Paulo reclamou e foi expulso de campo. O atacante saiu aborrecido e ficou no banco com seus companheiros.

O jogo continuou e o marcador não saía de 1x0. O CRB mudava todos seus titulares, inclusive, colocando um goleiro totalmente inexperiente. O time do Própria era muito ruim e não conseguia empatar, mesmo com o auxilio do árbitro. No finalzinho do jogo, Louvain Ayres marcou um penalti contra o CRB. Uma bola atrasada para o goleiro, um encontrão com um atacante do Própria, e penalidade máxima. Na cobrança, o jogador sergipano chutou em cima do goleiro alagoano. O árbitro mandou cobrar novamente alegando que o goleiro se mexeu. O tempo já estava escurecendo e a visibilidade não era boa. Mas, afinal a bola entrou, e com o resultado de 1x1, tudo ficou em paz.

Na festa, realizada a noite, todos estavam satisfeitos, menos Paulo Patriota. No jogo, foi expulso. Na festa, quando um dirigentes do CRB distribuía um envelope para cada jogador como prêmio para os jogadores do clube que participaram da partida, veio a surpresa. Seu prêmio veio pela metade. Indagando ao dirigente alvi rubro o porque daquela discriminação, teve a seguinte resposta –     “quem mandou você fazer gols ? “. Foi quando Paulo percebeu tudo. Não ganharam todos. Apenas alguns. Até os dirigentes do CRB tinham apostado contra seu próprio clube. Como Paulo começou a reclamar em voz alta, os diretores o colocaram numa lancha e o mandaram de volta para o Hotel que ficava no outro lado do rio.




Estourou como uma bomba: “Leônidas da Silva acaba de constituir advogado, a fim de processar Niginho, contra declarações partidas do antigo jogador do Vasco da Gama. Niginho será levado às barras do tribunal”.

A reportagem da Revista Manchete Esportiva procurou ouvir Niginho. Ele não disfarçava o seu descontentamento. Foi logo dizendo:

- Fui envolvido, não deliberadamente, creio, em uma teia de inverdades de um repórter que, levando para sua revista declarações minhas, fê-lo de modo deturpado.

Você afirmou que Leônidas havia se vendido a elementos de influência do futebol italiano, interessados na conquista, pela Itália, da Copa do Mundo de 1938?

- Nunca faria tal afirmação. Inicialmente por não ser do meu feitio acusar, sem provas. Segundo: sou filho de italianos, joguei na Itália, tenho pelo povo italiano uma grande admiração e nunca partiria de mim palavras que viessem empanar o brilho da conquista da Copa do Mundo de 38. O que afirmei e reafirmo, é que o ambiente para nós, componentes da Seleção brasileira, era tão inseguro que até mesmo insinuações de suborno existiam, mormente contra Leônidas, cujo contusão, alegada às vésperas do jogo Brasil e Itália, mereceu restrições, foi alvo de desconfiança, aumentadas quando o “Diamante” se fez presente dois dias após contra a Suécia. Apenas isto.

E o caso do penalti de Domingos?

- Afirmei e volto a afirmar, pois o fato é notório, que o pênalti sobre Piola poderia ser evitado, caso Domingos houvesse sido menos precipitado. Disse que, atualmente, não acredito que Domingos fizesse o que fez. Faltou ao grande zagueiro maior dose de experiência. Investiu sobre Piola, dando-lhe um pontapé, sem bola, reagindo contra provocações do “peninsular”.

Leônidas afirma que nunca falsificou certificado de reservista, por você afirmado.

- Em absoluto. Nada tenho com a vida particular de Leônidas. Se ele falsificou ou deixou de falsificar, isto é, com ele. Não fui eu quem afirmou tal fato. O repórter dev ser ouvido de outras pessoas.

Finalmente, que questão é esta de senhoras presentes à delegação brasileira e que foram motivos de desentendimentos?

- Afirmei que muita coisa desagradável surgiria em Buenos Ayres e na França, por ocasião dos certames Sul Americano de 36 e Mundial de 38, como por exemplo a tentativa de agressão do Bahia no Castelo Branco, bebedeiras, farras etc., fatos não contados por mim, mas por vários outros jogadores da seleção, entre eles o Hércules em recente reportagem inserida em Manchete Esportiva. Disse mas não citei nome, que determinada esposa era pivô de desentendimentos, mas fiz questão de não declinar o nome. Surgiu o nome da esposa de Leônidas. Não me responsabilizarei por um erro que não cometi. A esposa de Leônidas nem mesmo foi a Europa.
E encerrou.


- Lamento, reafirmo, os rumos tomados pela entrevista por mim concedida, mas não temo Leônidas. Creio mesmo que ele está coberto de razões. Não o temo, por não ter culpa no cartório. Não me responsabilizarei por acusações que não partiram de mim. Se levado a depor, reafirmarei o que disse. Minha consciência está tranquila e agradeço a Manchete Esportiva pela oportunidade a mim concedida. 



PINHEIRO.

As más línguas pegaram Pinheiro de “sola”. E pintaram Pinheiro como um verdadeiro alcoólatra e carne com bebida. Pelo que se dizia, Pinheiro ia de mal a pior, ameaçada de sucumbir de uma outra para outra, arrasado pelo “delirium tremens”. Torturado pelas visões de pesadelos, perseguido por dragões trespassando portas; de morcegos saindo do teto rasgando ratos pelo ventre; de serpentes que não lhe saiam, aos pedaços pela boca. E liquidavam, de maneira irreponsável, pelo disse-me disse, um jovem craque que era bom de coração e cuja cabeça era boa, apenas um tanto ou quando criança. Eis, porém, que Pinheiro acorda para a vida, chocado com o mundo que o maltratava tanto, a ponto de prestar falso testemunho, de acusá-lo na má-fé, pelo simples prazer de acusá-lo. Não bebera quando foi projetado do carro, mas tal constou até que o exame médico o absolveu. Não era amigo unha de carne da bebida, mas tal constou até que o Fluminense, padrão de disciplina, se convenceu que Pinheiro era um ótimo rapaz e se convenceu que podia confiar mesmo nele, sem reservas. E Pinheiro, justiça seja feita, parou na hora exata. E, hoje, eleito por Silvio Pirilo, o guia da equipe tricolor. O “capitão” que deve servir como exemplo e de modelo, para a geração atual e futura. Evidentemente, tal prova de confiança sensibilizou o craque. A propósito, Pinheiro faz as seguintes considerações:

Talvez eu não levasse o futebol a sério. Entretanto, exageravam os meus defeitos e, sobretudo, os meus vícios. Se eu tivesse me atolado em vícios, como diziam, nada me salvaria. Já não teria fígado, não teria coração e estaria com os nervos irremediávelmente em frangalhos. E quem, em sã consciência, pode admitir que eu não tenho bom fígado, que não tenho bom coração? Quem treme, treme e não bate pênalti. Ou bate e não acerta um. Mas tive pernas e tive nervos, quando cobrei, alternadamente, nada menos de doze penalidades máximas no Torneio Início. Se eu tivesse me atolado em vícios, como dizem, que restaria de mim, senão ruínas sobre ruínas? Eu estaria, hoje, aos vinte e poucos anos de idade, decrépito para o futebol e para a vida. Mas, graças a Deus, não me falta caráter, não me falta brio. Tenho lutado muito para fazer uma carreira brilhante. Muitas vezes fui útil ao Fluminense, muitas vezes útil ao futebol brasileiro. E de todos os prêmios que recebi, nenhum me deixou tão sensibilizado como esse dado por Sílvio Pirilo, designando a mim o “capitão” do time o Fluminense. Confesso: fiz, como qualquer rapaz, as minhas extravagâncias, pode ser que tenha exagerado, às vezes. De qualquer modo, fui bastante sensato para não insistir: risquei a boêmia do meu caderno. Meu destino está ligado ao futebol, para o bem ou para o mal. Não abusarei da sorte que Deus me deu. Sou profissional sei que a carreia é curta, e não posso pensar e nem posso só em mim. , há maus irmãos e há minha mãe, a quem tanto devo.

De Paulo Rodrigues para a Revista Manchete de 1956




                                                         GENTIL CARDOSO.

- O técnico Gentil Cardoso começou perguntando –
- Você sabe o que aconteceu comigo?
- Você conhece o fato, mas ignora o que senti. Não basta que você imagine. É preciso que eu diga. Ponha-se no meu lugar. Imagine-se levantando um campeonato. É claro que o tão esforço bem sucedido não foi de um só. Cada vitória, em futebol, traduz um efeito coletivo. Por outras palavras: a vitória veio porque a equipe funcionou. Seja como for, porém, eu era o técnico campeão. Agora eu pergunto – Como me trataram? Fui posto no olha da rua, sumariamente, despedido sem mais sem mais aquela, para quer em meu lugar entrasse outro técnico. Ora, eu podia afetar uma superioridade que seria na verdade que seria, na verdade, hiprocrisia. Prefiro, porém, confessar humanamente que sofri, então minha grande decepção.

Você é ressentido do Vasco?

- Do Vasco? Absolutamente! Afinal de contas os homens passam e o Vasco continua. E de resto, mesmo no momento em que recebi o prêmio da demissão, fui consagrado pelo quadro social e por toda torcida cruzmaltina. Creio muito na multidão. E por isso, não posso riscar de minha história individual o tempo que passe em São Januário.

Você tem algum ódio?

- Nunca e Deus me livre! Ódio por que? E de quem? Eu teria vergonha de mim mesmo no dia em que odiasse alguém. Prefiro milhões de vezes o amor. Não se pode ser técnico, não se pode dirigir um time sem grande amor ao próprio ofício, à própria função. Falei do Fluminense, falei do Vasco, clubes que tiveram todo o meu entusiasmo, todo o meu devotamento.






CANHOTEIRO

Canhoteiro era um ponteiro de verdade. Sabia ir a linha de fundo para um cruzamento e entrar enviesado pelo meio da área, batendo forte para o gol adversário. Driblava bem, e tinha um excelente preparo físico que lhe permitia fazer tudo isso. Era um futebol inteligente e criativo.

Agnaldo Berenguer veio de Recife para o nosso futebol se integrou ao plantel do Estivadores e chegou a ser vice-campeão alagoano em 1963. Era uma grande equipe onde Canhoteiro aparecia como uma de suas grandes estrelas. Depois, foi contratado pelo CSA, onde continuou jogando um grande futebol e, se tornando campeão várias vezes. Não demorou muito para ser observado pelos grandes clubes do Nordeste. O grande passo na sua carreira de jogador profissional foi sua ida para o Esporte Clube Bahia. No tricolor da Boa Terra se tornou ídolo, foi muitas vezes campeão, ganhou muito dinheiro e que poderia lhe oferecer uma vida tranquilo no futuro. Ainda jogou pelo América do Rio sem muito brilho.

Canhoteiro nunca nos pareceu um jogador ajuizado. Sempre gastava tudo ou quase tudo que ganhava. Sem estudos nem visão dos negócios que chegou a possuir, foi aos poucos perdendo controle da situação. Nesse negócio não há luvas, gratificações nem ordenados compensadores. A vida de rei que levava quando jogava futebol, acabou. A vida de Canhoteiro mudou e ele sentiu que não estava preparado para os novos caminhos que teria de seguir. Problemas familiares surgiram e ele terminou perdendo o pouco que tinha. Começou a beber e chegou ao fundo do poço. Graças a Deus ele encontrou um amigo que o levou para uma Associação e terminou o libertando da bebida. Recuperado, ele vive em Recife de bem com a vida.


Este é mais um exemplo para os novos jogadores profissionais. Procurem estudar, se preparar para quando deixar o futebol não sentirem i impacto da mudança. Muito só pensam no futebol como uma profissão de grandes oportunidades, onde em cada esquina existe uma fortuna a espera de quem possa apanhá-la. Mas, esquecem que o destino fica espreitando os jogadores a espera de uma chance para ceifar, de um só golpe, todos seus belos sonhos de atleta.



NILTON SANTOS

Nilton Santos s despede da Seleção Brasileira.


Em 1959, depois do jogo Brasil 2 x Inglaterra 0, no Maracanã, ainda no vestiário, Nilton Santos comentou:

- Este foi meu último jogado defendendo a camisa do Brasil. Fiz uma promessa que depois da Copa não atuaria mais. Quebrei minha jura e quase quebrei minha perna. Não sou um homem de grande experiência mas a quem eu consegui já me aconselhou a parar.

Mas você acha que acabou?

- Justamente porque ainda não acabei é que eu acho que devo parar. Um jogador que se respeita, ou que respeita seu passado esportivo deve sair de campo aplaudido. Em um clube é diferente, já há um entrosamento natural, já se pode pensar em termos de clube, diria bem se eu disse assim. No Botafogo e ao Botafogo eu acho que poderia ser útil mais uns três anos.
Decidido que este será o último jogo com a camisa do Brasil?    

- Tudo diz sim. Não se trata de má vontade, o duro é que eu queria ter vontade, queria ser o primeiro a manifestar essa vontade, mas, infelizmente, só tenho mesmo é pena de não ter vontade. Não são dois nem três, porém dez anos de treino, dez anos de jogo, dez anos atrás de uma bola, num trabalho insano, milhares de vezes repetido. Com licença da palavra, amigos, isso é demais, isso enche. Sim; de longe em longe me dão férias. E que faço nessas férias? Para variar me oferecem um Sul Americano Extra, um Torneio em Caracas, e até pela “Cortina de Ferro” fui levado, para mudar de cenário. DE vida, não. São dez anos correndo atrás de um homem (o homem que devo marcar, lógico), são dez anos dando umas escapadas para ver se faço um gol (as vezes faça), são dez anos a explicar por que vencemos, por que perdemos. Era para perder a voz, para perder a cabeça, mas, depois desses dez anos, estou mesmo é sem pernas. 

Esclareça-se a tempo: Santos não faz “blague”. Fala sério, sério realmente, mas para soturno, quase sinistro. E num tom de voz mais cavernoso, bate no peito e mostrar o que salta à vista:
- Reparem: ossos sobre ossos. O peso, a falta de sorte que levei nas costas, no Botafogo, durante nove anos, se foi. Mas também o peso do meu esqueleto, o peso que a balança acusa, este está por baixo. Perdi três quilos e não consigo recuperar esses três quilos. Sem vontade, sem peso, vamos e venhamos, fica difícil jogar bem. Sou bem um espelho do futebol brasileiro. Arranca-se, do jogador, até a última gota de suor, durante anos e anos. Depois se estranha que ele vá para um campeonato mundial cheio de bola até o pescoço. Um molambo de craque que, estafado por campanhas ininterruptas e intermináveis. Como qualquer jogador, considero uma honra vestir e lutar pela camisa que representa o futebol brasileiro. Nas seria justo que me poupassem, a mim e todos os outros, para mim todos os outros que fossemos – isto é vital – babando pelo caminho com fome de bola. Quem pensa disso, porém? Depois falam de tremedeira, pernas bambas, jogadores que caem à toa.

Observação nossa: Nilton Santos, quebrou a promessa e ainda jogou a Copa do Mundo de 1962.

Parte da reportagem de Paulo Rodrigues para a Revista Manchete.



 

BIGUÁ
E seu amor pelo Flamengo.

Nunca na história do futebol carioca, houve tanta identidade entre torcida e jogador, como é o caso de Biguá. Um lance célebre como exemplo dessa paixão coletiva por um jogador.

- No segundo turno, em 1945, jogando contra o Vasco, em São Januário, estava 1x1 e eu marquei um gol contra. Lelé acertou um tremendo chute na trave, eu já havia saltado, tentando desviar para corner, ao mesmo tempo que tentava impedir um avanço de Chico. Quando me virei para ver o que aconteceu, a bola bateu na minha cabeça, encobriu Luís Borracha e entrou. O Vaso venceu por 2x1 e o Flamengo perdeu o que seria o seu tetracampeonato.

Abatido, Biguá esperava no vestiário que o estádio se esvaziasse, quando apareceu o escritor José Lins do Rêgo, imortal autor do romance “Menino de Engenho”, torcedor fanático do Flamengo, que o convenceu a sair ao encontro dos torcedores.

- Saí para aruá acompanhado do Zé Lina e senti que mãos me seguravam por trás. Palavra que não via nada. Senti meu corpo erguido, enquanto gritavam meu nome.

Bria, velho amigo e companheiro de Biguá na famosa linha média Biguá. Bria e Jayme, ainda se emociona, quando se lembra daquele jogo em 1945.:

- Ele sempre foi um jogador sensacional, mas naquele jogo, não sei por que, estava se superando. Defendia e atacada, queria vencer de qualquer maneira e aconteceu de marcar um gol contra. Para ele, aquilo soou como uma tragédia. E depois a torcida o recebeu com festa, como um herói. É inacreditável.


Parte da reportagem do jornalista Aristélio Andrade para a Revista Placar.



ADEMIR NOS BRAÇOS DA TORCIDA DO VASCO
DEPOIS DO CAMPEONATO DE 1945

Não foi só bola, jogo, gol. Ademir era quase um semideus no seu tempo. Pode perguntar a qualquer Ademir de tal que você encontra. Se tiver uns vinte e poucos anos, garanto que o pai dele é torcedor do Vasco. Ou fanático pela seleção.

- Teve um torcedor que me chamou para batizar o filho em 1946. Fui lá e batizei. Ademir, é claro. Uma semana depois fui para o Fluminense. Apareceu o tal torcedor: “Quero desbatizar, você traiu o Vasco”.

E mudou mesmo o nome do garoto. Um ano depois, quando voltei ao Vasco, não é que o torcedor foi me procurar para batizar der novo o mesmo garoto. Mass aí eu não topei mais.  Em meio às memórias lamentáveis de 1950, Ademir, um mês atrás, foi despertado por um episódio feliz.

- Um garoto vascaíno ia ser operado na época da Copa. Mas, gritava muito, dizendo que só aceitava se falasse comigo antes. Me buscaram lá na Casa das Pedras. Fui ao hospital, brinquei um pouco com ele. Mais calmo, foi operado e curou-se. Há um mês, eu estava andando pela cidade, e um rapaz alto, forte, me pAra e me convida para um café. Era mesmo, não é preciso dizer. Hoje, é um bem sucedido engenheiro.

Parte da entrevista de Teixeira Heizer pata a Revista Placar. 
  

         
                                                       ARY BARROSO
                         O NARRADOR DA RÁDIO TUPI DO RIO DE JANEIRO



 Ary Barroso foi um craque como narrador de futebol no rádio carioca.


Primeira parte.

A rádio Mayrink Veiga tinha adquirido a exclusividade da transmissão dos jogos do Campeonato Sul Americano de 1942, a ser realizado em Montevidéu. Com isso não se conformara Ary Barroso. Preparando cuidadosamente um plano, que foi levado à apreciação do Dr. Assis Chateaubriand. O chefe dos “Associados” apoiou a ideia com entusiasmo, pois a Tupi não podia ser passada para trás. E trabalharam para vender, por preço altíssimo na época, a transmissão do jogo Brasil x Argentina, de grande importância no campeonato. Certos dirigentes da emissora de que Ary daria um jeito de irradiar esse jogo. Como deu.

Para Montevidéu, pelo avião dos “Diários Associados”, o “Raposo Tavares”, seguiram Ary, João Gaspary e o dirigente da Tupi, Teófilo de Barros. Na capital uruguaia tentaram, de todos os modos, conseguir permissão para transmitir o jogo. Até no telhado do Hospital das Clinicas, situado perto do campo de futebol, pensaram em montar a instalação da Tupi. O Oduvaldo Cozzi , que iria irradiar para a rádio Mayrink Veiga, soube w interditou o local. Depois conseguiram com o diretor da Rádio Nacional de Montevidéu, a cessão de um canal. Mas a turma da rádio Mayrink Veiga movimentou-se novamente e barrou-lhes os passos. E para a que a Tupi não tentasse com nova jogada, requereram uma cominatória contra o estádio, contra a Federação Uruguaia de Futebol e contra a Cia. de Telégrafos e Rádio Comunicações para evitar que furassem o bloqueio.

Não havia outra solução. Ary Barroso, de acordo com seus companheiros, resolveu botar seu plano em execução. Sem que ninguém soubesse viajaram para Buenos Ayres. E nesta cidade conseguiram com um velho amigo das “Associadas”, dono da “Casa Brasil”, um apartamento emprestado. Faltava-lhes, porém, obter uma linha que ligasse esse apartamento ao nosso país. Foram ao Telégrafos local. Mas o diretor argentino estranhou:
- Transmitir de Buenos Ares jogos que estão se realizado em Montevidéu? Não estou entendendo...

Teófilo de Barros veio com uma explicação:
- Não vamos propriamente transmitir os jogos. Daremos apenas algumas informações. Chegamos tarde a Montevidéu e todas as linhas estavam ocupadas. Vamos ouvir as notícias que nos vêm de Montevidéu e enviá-las daqui para os nossos jornais.

A explicação foi convincente e eles saíram do gabinete do homenzinho com a autorização. Foi essa linha que, na palavra experimentada de Ary Barroo, trouxe para o Brasil todos os lances do jogo Brasil x Argentina realizado em Montevidéu, nossa terceira partida naquele Sul Americano.

Continua.




Ary Barroso foi um craque como narrador de futebol no rádio carioca.
Conclusão. Ele aparece na foto ao lado da cantora Angêla Maria outra fanática torcedora do Flamengo comemorando o tri campeonato de 1955.

Vejamos como isso foi possível. Ary e seus companheiros eram hóspedes do mesmo hotel onde estavam instalados todos os outros locutores, jornalistas, juízes, etc. Na manhã do jogo encontravam-se em Montevidéu, tomando tranquilamente seu café matinal, quando o juiz José Ferreira Lemos (o popular Juca) perguntou a Ary Barroso:

- Como vai transmitir o jogo?
- Perfeitamente – respondeu Ary.
- De onde? Quis saber Juca.
- Isso é problema meu...

Na hora que todos saíram para o estádio, mais ou menos ao meio dia, Ary e seus companheiros estava com eles. Numa rua paralela à do hotel, porém, conseguiram driblar os colegas e tomar um taxi que já os estavam esperando. Este carro levou-os ao porto de um hidroavião, fretado pelos “Associados”, voou com Ary para Buenos Ayres. Chegaram 40 minutos depois. Lá um outro taxi aguardava o locutor da Tupi. E deste Ary foi levado para o apartamento onde havia instalado uma linha direta para o Brasil. Com todas as adaptações pedidas, feitas por um técnico especialmente contratado.

Levara, na sua bagagem, um “pick-up” e um disco com ruído de multidão, ovacionando. A uma e meia da tarde tudo estava pronto. Ary comunicou-se, então, com a rádio Tupi do Rio de Janeiro, dano o necessário “ok”. Quando perguntou se a voz estava chegando bem, responderam-lhe que nunca estivera melhor.

Tudo acerto, Carlos Frias pôs a boca no mundo e, de 10 em 10 minutos, passou a anunciar a anunciar que a Rádio Tupi apesar de todas as proibições, iria transmitir a partida Brasil x Argentina, em disputa do Campeonato Sula Americano de 1942. E assim que o juiz deu o apito inicial, e a bola foi movimentada pela primeira vez, ouviu-se em todo Brasil a inconfundível voz de Ary Barroso transmitindo a peleja.

Lá no apartamento de Buenos Ayres ele ouvia, por um fone, Oduvaldo Cozzi e, por outro, Luís Elias Sojit, excepcional locutor esportivo da Argentina. Passados os primeiros minutos do jogo, com medo de cair numa armadilha preparada por Cozzi, Ary passou a ouvir apenas o “speaker” platino. E com um atraso máxima de 4 segundos descreveu toda a partida.

No Rio de Janeiro, o povo delirava com a façanha de Ary Barroso, em Montevidéu, Cozzi e os demais componentes de sua equipe (que haviam recebido a notícia da transmissão da Tupi) viraram a cidade pelo avesso para descobrir de onde a emissora associada estava irradiando. E a cada vez que Ary tocava a sua gaitinha, confirmando um gol, recebiam verdadeira punhalada no coração.

Terminado o jogo, Ary agiu da mesma maneira, só que em um sentido inverso: taxi até o porto de Buenos Ayres; hidroavião até Montevidéu; taxi até o hotel, na capital uruguaia. Entrando quase na mesma hora em eu seus colegas voltavam do estádio. Quando Juca perguntou-lhe:
- Como é, transmitiu o jogo?
Respondeu triunfante:
- Naturalmente.

Fim.

Parte da terceira reportagem, escrita por Mario Moraes, sobre a vida do Ary Barroso na Revista O Cruzeiro.





 CHICO
O ATACANTE DA SELEÇÃO BRASILEIRA DE 1950

O ponta esquerda Chico quer contar um segredo dos bastidores da tragédia de 50.
- O que foi contar ninguém vai achar em livro – garante.
Chico primeiro repete a recomendação que ouviu de Flávio Costa:
- Nosso treinador disse a Bigode que exigia disciplina. Se houvesse derrota com indisciplina, o indisciplinado seria o responsável. Bigode, então, modificou o estilo de jogo.

“Quando o Brasil estava ganhando de 1x0, tive um pressentimento: o Uruguai iria ganhar o jogo. Lá dentro do campo, pedi o apoio de Zizinho e Ademir porque eu ia tirar o Obdúlio Varela de campo. Todos nós sabíamos que Obdúlio Varela era chave do time do Uruguai. Um jogador que exercia comando, o líder absoluto. Eu conhecia bem o gênio daqueles uruguaios. Bastava que eu desse uma entrada desleal no Obdúlio e pronto. Tenho certeza que ele não resistiria. Mas aí meus companheiros perguntaram se eu tinha esquecido a ordem da disciplina dentro do campo”.

Chico lembrou outro detalhe importante.
- Nós estávamos concentrados na estrada Niemeyer. O contato com os jogadores era difícil. A condução era dificílima. Naquela época, pouca gente tinha automóvel. Não sei porque a concentração foi mudada para o Vasco em São Januário. É aí que entra o dedo da direção, nesse erro. Passou a existir uma frequência diária de visitantes na concentração. Tínhamos que fugir porque estávamos cansados de tanto dar autógrafos. Atender os torcedores era prazer, uma alegria, porque a gente sabia que essa gente tinha vindo de longe. Tínhamos de atender, mas aquilo estava nos prejudicando. Sem dúvida, a movimentação na concentração era maior do que deveria. Evidente. Houve reuniões e apresentações de políticos na concentração. Nenhum jogador participou da mudança da concentração para São Januário. Não fomos ouvidos. A mudança foi automática. Quando vimos, já estávamos transferidos. O estádio de São Januário era uma concentração boa – ótimo, até - mas ficava num ponto de fácil acesso. Então, a mudança nos trouxe prejuízo. Éramos apresentados a vereadores, deputados, candidatos. A politicagem nos prejudicou.
(parte do depoimento de Chico para o livro de Geneton Mo



O ÁRBITRO PELÓPIDAS ARGOLO               
                                   

O árbitro de futebol tem problemas que ninguém tem. Para exercer sua profissão somente tem dificuldades. Os juizes alagoanos são iguais a todos os outros do mundo inteiro. Até mesmo nas “cantadas”.

As “cantadas”, mesmo de forma indireta, surgem das mais diversas formas. O ex arbitro, Pelópidas Argolo, em depoimento para o Museu dos Esportes, fez sérias denuncias contra alguns maus dirigentes. Esses maus dirigentes são os grandes problemas dos árbitros. Eles perseguem, criticam, xingam, e muitas vezes, tentam subornar.

Pelópidas Argolo conta que estava escalado para apitar Capelense e Penedense, na cidade de Capela. Com um empate, o Penedense estaria classificado para o quadrangular final do campeonato. No sábado pela manhã, Pelópidas recebeu, em sua casa, a visita do presidente do Penedense, Severino Camilo, que estava acompanhado do treinador do Capelense, Eraldo Lessa. É isso mesmo. Eraldo Lessa era técnico do time adversário. Enquanto o dirigente elogiava a residência do arbitro, o técnico foi direto ao assunto. Disse que o Penedense não podia perder o jogo e esperava que Pelópidas tivesse uma boa atuação. Ao mesmo tempo, Severino Camilo abria sua capanga e, acintosamente, mostrava um punhado de dinheiro. Pelopidas pediu que ele fechasse sua capanga. Já nervoso, Camilo disse que estava apenas tirando um endereço telefônico para entregar a Eraldo Lessa. Ao se despedir, o presidente do Penedense declarou que confiava na arbitragem de Pelópidas.

Depois que os intrusos foram embora, o arbitro e sua esposa foram ao  mercado fazer compras. Ao retornarem, encontraram em sua varanda, um saco de arroz. Seu filho explicou que tinha sido os dois homens que o visitaram logo cedo. Pelópidas arranjou duas testemunhas, colocou o saco de arroz no carro e foram direto para a Casa dos Pobres. Lá, procurou a madre superiora e fez a doação. Ainda recebeu da madre um recibo também assinado pelas duas testemunhas.

O caso foi levado ao presidente da Federação, Heider Silveira, que não gostou da atitude do dirigente penedense. Entretanto, pediu para que o caso não fosse divulgado pela imprensa. Pelópidas Argolo foi a Capela e teve sua arbitragem elogiada pela imprensa e o jogo terminou em zero a zero. Antes do inicio do jogo, o arbitro contou o caso ao funcionário da Federação, Walfredo Oliveira que falou com Severino Camilo. O presidente se desculpou e disse que o saco de arroz tinha sido um pedido do Eraldo Lessa que queria oferecer a um doutor.



                                                                         DANILO

E as lições da Copa.

Para Danilo, não foi só a fatalidade que tirou a vitória do Brasil na Copa de 50. Houve muitos erros. Alguns repetidos em 1954, até que a lição fosse aprendida e o Brasil se organizou para garantir seu verdadeiro lugar no futebol mundial.

- Na minha opinião, o maior erro de 50 foi a transferência da concentração para o estádio do Vasco, em São Januário. Estávamos tranquilos na Barra da Tijuca, então um lugar de difícil acesso para o público. De repente os cartolas mudaram tudo, e no campo do Vasco foi aquele inferno. A época era de campanha eleitoral, e não pararam as fotos, s entrevistas, as reuniões com figurões que disputavas cargos políticos. E tudo isso em ritmo alucinante, de manhã, à tarde e à noite. Na manhã do jogo com o Uruguai a coisa piorou: todo mundo era campeão do mundo, amigo e protetor do jogador A ou B. E tome de fotografia, de discurso, de um movimento digno de feira livre. Nós a mercadoria, estávamos apodrecendo e não sabíamos. Ainda não.

- Além do mais, fomos muitos inocentes, muito diplomatas. Ninguém perderia assim uma Copa em casa. Eu acho que a imagem daquela final solidificou o Maracanã como o único campo realmente neutro do mundo. Jogamos limpo; o juiz apitou serenamente. As 200.00 pessoas que encheram o estádio eram, na verdade 200.000 de desportistas. Nem um aperto no juiz; nem uma entrada desleal; nada de pressão contra os uruguaios.

- Eu já disse que a gente devia colocar uma pedra sobre tudo isso. Mas é preciso falar. Transmitir a lição. A questão dos erros técnicos, por exemplo. É claro que Flávio Costa não foi o culpado direto, mas teve seus pecados, como a dispensa de Cláudio, do Corinthians. Depois de Tesourinha, Cláudio era o melhor da época. Aí Tesourinha se machucou e nós ficamos com Maneca na ponta. Maneca era um craque, mas não era ponta. E sua índole não se coadunava com o espirito de uma decisão como Brasil e Uruguai. Na reta final, Maneca sentiu dores nas pernas. Aí entrou Friaça: fez o gol, mas não ganhamos. O Friaça não teve culpa, como Alfredo, jogando de ponta direita e fazendo um dos gols no empate de 2x2 contra a Suíça. Eles estavam quebrando o galho. E o Cláudio acompanhando a Copa como um torcedor qualquer.


Reportagem da Revista Placar. 



                 BIGUÁ NA SUA VOLTA OLÍMPICA NA DESPEDIDA DO FUTEBOL

Na tarde de 3 de novembro de 1953 – Biguá vai deixar o futebol.

Uma ruptura nos ligamentos do joelho direito e um incidente de seu amigo Bria com Fleitas Solich (coincidentemente, foi quem lanço Bria no time do Olímpia, de Assunção, e que o afastou do time do Flamengo, escalando Dequinha) apressaram a despedida.

Naquela tarde, Biguá vestiu o uniforme do Flamengo e entrou em campo com o time no gramado do maracanã. Posou para as fotos e descalçou as chuteiras. Chorando, iniciou a volta olímpica no sentido contrário ao dos ponteiros do relógio – deixaria a torcida do Flamengo para os últimos metros.

Ainda entregou suas chuteiras a um menino que pintava bem: Carlinhos. Tentou chutar a bola para a arquibancada, enquanto a massa rubro negra gritava seu nome. A emoção foi maior do que a vontade: falhou no chute, a bola caiu a poucos metros, nas gerais.

Correu e entrou no primeiro túnel que encontrou: o do Botafogo. Quando percebeu que tinha errado, não pôde voltar, pois Carlito Rocha já estava de braços abertos, pronto para o abraço enternecido, e a frase que ficou para a história: - Pena que no futebol poucos tenham sido iguais a você.


Parte da reportagem do jornalista Aristélio Andade para a Revista Placar.


                                                     
                                                                      NETINHO

Netinho foi um craque no CSA. CRB. Auto Esporte e Esporte Clube Alagoas. A torcida se encantava com suas jogadas. Era um jogador elegante, clássico e dono de um vistoso futebol.

Não adianta nossa preocupação em encontrar razões para explicar as coisas ruins que surgem em nossas vidas. Não nos cabe outra alternativa senão apontar os acontecimentos. Por razões extracampo, Netinho começou a cair de produção. Seu estupendo futebol foi murchando, sumindo. A torcida já não via mais suas grandes apresentações. A imprensa não lhe dava a mesma atenção. E aquele que foi ídolo, que teve seus dias de glória, começou a ser esquecido por todos.

Netinho desapareceu. Começou a beber. Não parava em qualquer emprego. Dava pena ver Netinho, no Mercado Publico, pedindo dinheiro para beber. Era um quadro triste onde ele aparecia como uma figura deformada. Netinho estava perdido, tragado pelo lamaçal da bebida. Alguns amigos procuravam ajudá-lo. Em princípio, ele tomava jeito. Parecia ter expulsado a bebida de sua vida. Parecia querer reencontrar a porta para uma saída que lhe colocasse novamente na sociedade sadia e equilibrada. Tudo isso, porém, durava pouco tempo. Logo ele voltava a ser superado pelo álcool.

Diz o poeta que “o coração tem razões que a própria razão desconhece” E Netinho deve ter tido fortes razões para se deixar devorar pelo vicio da bebida. Jovem ainda, mas com o físico debilitado, Netinho encontrou a morte prematuramente. Nunca mais tivemos a chance de assistir aquele futebol inteligente, cheio de talento e habilidade.

                                                      



FRIEDENREICH


O futebol que tinha sido toda sua vida (por ele largou os estudos quando estava no terceiro ano de engenharia) serviu apenas para piorar seus últimos dias. No dia 6 de setembro de 1969, Artur Friedenreich, El Tigre, aos 77 anos, morria sozinho. Perdido dentro da própria saudade (muitas vezes esquecia até o próprio nome), esquecido entre a poeira e tristeza que cercavam seu tesouro de glórias numa velha casa, no bairro do Pinheiro em São Paulo.

- Ele foi muito esquecido e ninguém nunca se lembrou que tinha sido El Tigre, rapaz de futebol perfeito, elegante, melhor até que Pelé.

Dona Joana continua a mesma velhinha simpática, paciente, que apesar dos 57 anos vividos o lado de Friedenreich, como mulher, enfermeira e, antes de tudo, admiradora, fala com o mesmo entusiasmo e amor dos primeiros tempos.

- Vi poucas vezes Fried jogando. Mas assim mesmo me lembro que era um futebol diferente: mais elegante, humano. Na Revolução de 32, efe foi como sargento, voltou como tenente e herói. Comandava o pelotão dos desportistas e subiu o morro debaixo de tiros para tomar a posição.

- Nos últimos anos, eu e meu filho notamos que Fried estava sentindo muito esquecimento em sua vida. Quando havia futebol na televisão, virava o rosto e fingia dormir. Não gosta e comentar nada. Só uma vez, em 1965, foi assistir um jogo de futebol, do Santos. Mas foi outra desilusão: para entrar teve que pagar ingresso, depois de muita confusão para poder sentar na Tribuna de Honra. Ninguém o reconhecia e El Tigre sentia isso.

Parte do texto do jornalista Paulo Mattiussi para a revista placar.

   


                                                         1943 - Isaias no Vasco da Gama. 

                         


                                                       
O Vasco estava com tudo. Tinha dinheiro, tinha torcida e muita sorte, mas nem naquele ano de 1946 conseguimos o titulo. Com a surpreendente saída do técnico Ondino Viera, o time se desorientou e perdeu um pouco do entrosamento. Ondino não aceitou a oferta de renovação do contrato e foi embora, sendo substituído por seu auxiliar Ernesto Santos. Não deu certo. Ernesto era um ótimo técnico, sabia tudo, mas era bom caráter demais para agüentar um clube grande. E, além de tudo, era bom e ingênuo. Só tinha que ser engolido, porque aquela turma de raposa só entendia uma linguagem: a da porrada. Logo Ernesto saiu e o Vasco contratou Flávio Costa, outro homem duro como Ondino. Flávio assumiu o time no meio do caminho e não teve tempo de recuperar o grupo. Já no ano seguinte as coisas melhoraram, principalmente com a volta de Ademir Menezes, um dos maiores goleadores que vi em meus quarenta anos de futebol. Novamente entrosada e disciplinada, o Vasco deu um passeio  em todo mundo e foi campeão invicto.

A alegria foi obscurecida logo depois, por um acontecimento muito doloroso: a morte do nosso querido companheiro Isaias, aquele centro avante de sete fôlegos que desmoralizava quase todos os goleiros do Brasil com seus chutes violentos e traiçoeiros.  Nós estávamos nos preparando para uma viagem ao Uruguai, onde haveria um torneio e o entusiasmo era geral. Uns dias antes, Isaias me procurou na concentração. Fiquei pasmado ao vê-lo. Não era possível. Diante de mim, rouco e triste, estava um fantasma. Quase não o reconheci, tão magro ele estava. Isaias respirava com dificuldade. Sentou-se e balbuciou:

-          Estou muito mal, Mario, acho que vou morrer.

Levei-o imediatamente ao Dr. Amílcar Gifffone, mas, ao que parece o médico não se impressionou tanto quanto eu. Deu-lhe um remédio e mandou que ele voltasse no dia seguinte. Ele voltou e eu mais uma vez me espantei. Já nada mais restava daquele negro raçudo e alegre que um dia, quando jogava pelo Madureira, eu vira marcar quatro gols no poderoso Fluminense. Já não era mais aquele Hercules de Ébano que um dia marcou um golaço de letra também contra o Fluminense. O que estava a minha frente, agora, era um moribundo, um esqueleto ambulante. O médico diagnosticou tuberculose galopante e ele foi internado num Hospital de Petrópolis, onde deveria receber uma injeção de ouro que fora encomendada nos Estados Unidos. Mas não chegou a toma-la. Sua família, contrariando as ordens médicas, tirou Isaias do Hospital para tentar uma cura num centro espírita.

Isaias morreu quinze dias depois. Ocorreu, então, um fato que só de lembrar me enche os olhos de lágrimas. Nós tínhamos um amistoso marcado contra o Olaria, justamente na data do enterro.  Para surpresa nossa, dirigentes do Vasco não quiseram adiar o amistoso. No sepultamento de Isaias, só Ademir Menezes se fez presente, mesmo assim, porque estava contundido e não tinha condições de jogo para enfrentar o Olaria. Essa é uma mágoa que tenho do Vasco da Gama.


                                                                 Mendes
                                                O goleiro indisciplinado em 1923

Na época do amadorismo aconteciam coisas que jamais poderiam acontecer nos dias de hoje. O goleiro Mendes, chamado de Gato do Nordeste, jogava futebol no CSA, mas também gostava de remar na Lagoa Mundaú. A diretoria azulina havia proibido jogadores do seu clube ter acesso a garagem de barcos que existia no mutange. Mendes desrespeitou a ordem, arrombou a porta da garagem, tirou uma yole e foi passear na Lagoa. Para seu azar, na volta, quebrou a yole. Mesmo assumido a responsabilidade de seus atos, o goleiro teve um desentendimento com o diretor Luciano Lordeslen, e foi suspenso por quinze dias.

Ao invés de passar quinze dias fora do time, Mendes ficou trinta dias sem comparecer ao mutange. Achava que a punição mais certa seria um mês. Depois dos quinze dias, a diretoria pediu ao Mendes para voltar porque precisa dele para disputar partidas importantes. Ele não aceitou. Então os dirigentes foram falar com Álvaro Peixoto, uma das figuras mais importantes do clube azulino. Entretanto, o patrão do grande goleiro afirmou que, Mendes era empregado da firma e não do CSA. Por isso, ele é quem devia decidir se voltava ou não. Por esse motivo, Luciano Lordeslaen renunciou o cargo de Diretor Náutico do CSA.



Castanha
O massagista que evitou o gol do CRB.

              Para jogadores, treinadores e, mesmo, para os “cartolas”, a fama no futebol é coisa relativamente fácil. O jogador porque faz um gol ou defende um pênalti e evita a derrota do seu time. Os “cartolas” porque aparecem nas rádios, jornais e, até televisão, concedendo entrevistas e falando sobre seu clube. Mas outras profissões, ainda que importantes no futebol, a fama não existe. Por exemplo, para um massagista, que cuida dos músculos dos atletas, que os prepara para os jogos, tudo não passa de rotina. A fama e a glória não existem para os massagistas, mesmo nas alegrias de uma vitória. Muitas vezes, o recado do treinador é dado pelo massagista com rapidez e oportunismo, e pode transformar a sorte de uma partida. Ninguém duvida que os massagistas além de massagear pernas famosas, muitas vezes, se tornam confidentes de seus jogadores.


Entretanto, alguns massagistas, ganham manchetes no noticiário esportivo, graças a uma ação deliberada ou surpreendente que cometeu. Um desses casos aconteceu em Alagoas envolvendo Cícero Lopes de Araújo, o popular Castanha, que foi massagista do CSA por mais de dez anos. Um caso curioso que ganhou notoriedade por ter criado uma polemica incrível. Foi num clássico CRB x CSA, ocorrido no dia 8 de abril de 1976, no Trapichão. O jogo era válido pelo quadrangular decisivo do primeiro turno.  O vencedor seria campeão do turno. O juiz era Pedro Rufino. O jogo estava empatado em 1x1. Então aconteceu um ataque do CRB. O lateral Espinosa fez um cruzamento para a área azulina e o goleiro Paulo Sérgio saindo precipitadamente, não segurou a bola que caprichosamente sobrou para o ponteiro Silva. Era a chance do gol da vitória regateana.  Silva vinha chegando e chutou em direção as redes azulinas. Foi no momento exato em que o massagista Castanha se aproximava da meta de Paulo Sérgio para transmitir um recado do treinador. Vendo que o chute de Silva tinha endereço certo, não pensou duas vezes, entrou no gramado e, junto ao poste lateral direito, não deixou a bola entrar no gol do CSA, dando um chute em direção ao meio campo.

A torcida do CSA vibrou como se seu clube tivesse marcado um gol. A torcida do CRB ficou revoltada. Todos queriam o gol que parecia iminente. Como a bola não ultrapassou a linha de meta, o juiz não confirmou o tento, mas expulsou o massagista Castanha. O caso durou muitos anos nos noticiários esportivos e causou debates violentos entre as duas torcidas de Alagoas.  Um acontecimento inusitado, no qual, pela primeira vez um massagista ganhou notoriedade e fama.





Juca da Praia
O árbitro da Federação Metropolitana de Futebol.

Juca da Praia, árbitros dos mais conceituados no futebol brasileiro e Sul Americano, teve várias passagens rumorosas no futebol. Vamos contar um dessas histórias.

Uma passagem rumorosa foi por ocasião dos incidentes do jogo Fluminense e Botafogo. Juca validou o gol de Botafogo que o Fluminense reputava off-side escandaloso. E o presidente Marcos de Mendonça afirmou que Juca não apitaria mais jogos do seu clube. Mas pela regulamentação então vigente no Colégio de Árbitros da Federação, do qual era diretor o senhor Joaquim Guimarães, Juca teria que apitar o jogo seguinte do Fluminense x Vasco. No dia do jogo houve um corre-corre danado. Juca não abria mão do seu direito de apitar o jogo. Joaquim Guimarães chamou o presidente Vargas Neto para conversar com Juca. Vargas Neto chamou João Lira, o pacificador de todas as encrencas. E houve uma reunião agitadíssima na sala do presidente da Federação. Gritos, lágrimas, revolveres na mão... Juca descontrolado gritava que iria ao campo de qualquer maneira, nem que tivesse de abrir caminho a bala. Marcos de Mendonça manara avisar a Vargas Neto que Juca só entraria em Álvaro Chaves passando por cimo dos cadáveres dos diretores do Fluminense que ficariam na porta para impedir a entrada do juiz. A situação era gravíssima e daí a reunião dos dirigentes com o juiz. Afinal, João Lira venceu o duelo Juca desistiu de ir a Álvaro Chaves, tentar abrir caminho a bola. E Mário Vianna foi chamado às pressas na Polícia Especial, quase na hora do jogo, para ir apitar a partida do Fluminense com o Vasco. E quando Mário chegou ao portão de Álvaro Chaves encontrou realmente a diretoria tricolor a postos, esperando a chegada de Juca para o “entrevero”.

Da Revista – O Globo Esportivo de 1948.




DEDA

Deda saiba jogar bola. Era todo arrojo, ímpeto e bravura. Fazia jogadas sensacionais e empolgava os torcedores. Ele conta como chegou ao fundo poço e conseguiu sua recuperação.

- Quando eu ainda estava no CSA e não bebia nem fumava, dirigentes do Bangu tentou me levar para o futebol carioca. O CSA não deixou. Fui a Federação Alagoana de Desportos e constatei que tinha passe preso. Quando assinei meu primeiro contrato com o CSA, seus dirigentes afirmaram que era passe livre no final do compromisso. A partir daí comecei a sentir que não poderia acreditar em dirigentes do futebol. Lamento não ter tido um amigo ou alguém que me orientasse para viver nesse mundo do futebol. Eu pensava somente no presente. Depois de três anos vestindo a camisa do CSA fui contratado pelo CRB. Acho que foi um erro jogar no CRB. Não estava vivendo um bom momento e a torcida do CRB queria que rendesse o mesmo quando jogava no CSA. Foi nessa época que começou minha derrocada. Não podia errar em campo. Minhas condições físicas não estavam boas e quando entrava em campo procurava acertar e não conseguia. Comecei a beber e sair da linha.

Deda fez uma pausa para depois continuar seu grande drama no futebol.

 Em pouco tempo me senti perdido. Era a areia movediça que me arrastava para o fundo do poço. Continuei bebendo e tendo problemas com minha família. Até muita gente que se dizia meus amigos começaram a se afastar. Um dia, eu estava bebendo no bar de seu Alciro, em Murici, quando Cleane, minha esposa, apareceu e me entregou a página esportiva da Gazeta de Alagoas onde tinha uma matéria assinada pelo meu amigo Lauthenay Perdigão que fazia comentário sobre um craque da Seleção Brasileira chamado Fausto dos Santos. Esse craque que disputou duas Copas do Mundo, depois de viver na boemia, a noite toda com bebidas e mulheres, faleceu longe dos amigos, esquecido por todos e somente ao lado da mãe. Um jogador que foi chamado de “A Maravilha Negra” poucos souberam que ele tinha falecido.

Emocionado, Deda concluiu.


Depois de ler a reportagem, tomei uma decisão. Ou procuro me curar ou vai acontecer a mesma coisa que aconteceu com Fausto dos Santos. Fui para casa do meu sogro e pedi ajuda a esposa e a família.  Me colocaram em um quarto que ficava em cima da Farmácia do meu sogro e fecharam a porta. Muitas vezes, eu batia na porta pedindo para sair. A esposa e meus cunhados não abriam. As vezes chegava a ouvir o choro dos meus filhos pedindo para ver o pai e eu me revoltava comigo mesmo. Sentia vergonha de tudo que tinha feito. Somente depois de uma semana tomando agua é que senti o cheiro de comida boa, e pedi a Cleane para me trazer um pouco. Era a primeira vitória. A recuperação estava começando. Mais uma semana e eu já estava me alimentando bem. A porta ficou aberta, mais eu não saia. Um mês depois, comecei a sair e me tornei um grande amigo do meu sogro. Depois que ganhei a luta contra o vício. Me transformei completamente. Consegui um emprego na Salgema de onde saiu aposentado.




ZÉ ROBERTO

Zé Roberto começou no juvenil do CSA nos anos 70 quando mostrou logo o estilo artilheiro para jogar. Em 1980 foi para o profissional do clube azulino, foi campeão e marcou o título de campeão. Logo depois foi para o Moto Clube. Em nove anos que passou defendendo as cores do Moto, assinalou 280 gols.
“Nessa época me estruturei financeiramente, conquistei fama e dinheiro, virei ídolo no Maranhão. Porém tufo foi por agua abaixo no dia em que eu deixei o Brasil, ilusão de ir jogar na Bélgica”.

Zé Roberto conta que para deixar o Brasil teve que comprar o próprio passe, na época pertencia ao Sampaio Correia.

“Para isso, vendi meu apartamento, carro, tirei todo dinheiro que tinha no Banco e gastei tudo. Comprei também a passagem para ir para a Bélgica. Peguei o avião e fui embora. Quando desembarquei no aeroporto de Bruxelas, não tinha nenhum empresário me esperando. Ainda telefonei para ele que disse que não poderia me pegar. Sozinho, chorei e fiquei desesperado. Uma última pessoa destruiu a minha vida”.

Zé Roberto revela que foi com a ajuda de um amigo, o jogador Serjão, que tinha jogado no Sampaio Correia, e estava jogando no futebol belga que conseguiu se instalar. “Pedi socorro e ele me levou para jogar no Arobick, time da segunda divisão da Bélgica, onde fiquei dois anos.  O Serjão ainda me conseguiu cerca de U$$ 10 mil para eu recomeçar a vida. Com esse dinheiro mandei minha família, que estava no Maranhão, de volta à Alagoas assim como a mobília que tínhamos”

No clube Belga, Zé Roberto foi campeão e o time subiu para a primeira divisão. Ele foi o artilheiro. Depois voltou para ao Brasil para jogar no Maranhão Atlético Clube, que estava a seis anos sem conquistar um campeonato. Depois voltou pra Maceió, onde jogou no Dínamo e Ferroviário.


“Tudo que aconteceu na minha vida considero que foi por falta de experiência e por ter ficado deslumbrado com a possibilidade de jogar na Europa. Todo jogador sonha com isso, quer estruturar a família, dar conforto, ganhar muito dinheiro, mas comigo não deu certo. O problema é que ainda hoje muitos atletas jovens se iludem com promessas de empresários e não pensam antes de tomar uma decisão”.


FAUSTO DOS SANTOS



                                                A mãe de Fausto dos Santos. dona Rosa.


Miséria depois da glória do filho.

Dona Rosa, a mãe de Fausto, falou sobre os últimos dias do filho famoso.
“Desconfiei. Surpreendi-o, e uma feita, nervoso, em prantos, fechado em um velho coração de mãe, que é que se pode esconder? Quando meu filho começou a adoecer para se acabar, quando começou a sentir que os pulmões ameaçavam romper-se de tanto tossir, Fausto foi ficando sozinho, foi ficando isolado. Eu e ele, ele e eu. Passamos aí, a contar apenas com pouquíssimos amigos dos bons e maus momentos”.

O repórter perguntou. E o dinheiro das economias? O dinheiro dos dias de glória?
“Nessas alturas dos acontecimentos já não havia mais economia. O dinheiro foi sumindo, foi se acabando. Acabou nas custas do processo entre ele e o Flamengo. Acabou em remédios.  No fim, adeus casa, adeus guardado, adeus projeto de casa própria. Bem que avisei a ele. Bem que lhe disse: cuidado Fausto! Um dia isso termina! Meu filho sofreu muito na doença, no abandono, no exilio. Sofreu muito mais quando teve que jogar uma preliminar no campo do São Cristovão. Aquilo o matou moralmente”.

Fausto durou alguns meses depois daquela preliminar. Morreu tentando a cura. Em Santos Dumont, longe da casa. Longe da sua mãe. Longe dos poucos amigos. Monologando. Ele e sua sombra. Ele e o seu fantasma. Esquelético. Febril. Anônimo. Foi enterrado anonimamente. O que foi que sobrou dona Rosa?

“Um vestido que ele me mandou da Espanha e algumas medalhas, que trocadas por dinheiro não dariam nada, mas que eu não trocaria, embora valessem, uma fortuna!”

Depois da morte do seu filho famoso, dona Rosa mora, de favor, em um pequeno quarto. E o resto ela consegue fazendo com o trabalho nas camisas que passa e com as compras que mandam ela fazer.

Matéria de Geraldo Romualdo da Silva para a Revista Globo Esportivo.





DIDI

Depois da conquista do mundial de 1958, Didi falou ao repórter – Ronaldo Bôscoli – sobre as promessas que foram feitas para os campeões que nunca receberam nada.

O próprio Didi explica: “Ninguém, e juro por essa luz, ninguém pediu nada. Os homens é que prometeram. Em São Paulo a coisa andou melhor”.
E quais foram essas promessas? Você pode enumerá-las?
“Não sem antes explicar que interpreto o pensamento de todos os companheiros cariocas que estiveram na Copa. Não sou ovelha negra, nem quero onda para o meu lado. Lembrou-me da Comenda que nos seria ofertada pelo CND com a ordem de Cavaleiro do Esporte. Em segundo lugar os tais talões que teríamos durante um ano para não pagar a gasolina que nossos carros consumiriam. Eu, toda vez que entro num posto, desembolso o quando estiver marcando o aparelho que serve gasolina para o meu Oldsnobile. Mais uma, e aí coisa já vai ficando mais séria. Falava-se que o comércio daria milhões de prêmios. A maior parte deste mesmo comércio – ficou só na conversa. Viajamos sob promessas de milhões e...nada. Eu citaria, também, a desavença com a tal caixa única. Pelé ganhou um carro e eu, depois disso, ganhei uma radiola. Quero dizer que a partilha dos prêmios não foi adiante. Mas duas promessas mais sérias deixei para citar no final. A da Fundação da Casa Popular. Até hoje aquilo ficou no papel. Teríamos terreno para construirmos nossas casas. Até agora, nada. Finalmente o emprego público, tantas vezes adiado. Na época o Presidente JK havia suspendido as nomeações, mas depois daquilo houve mais duas chances. Claro que preciso de um emprego. Amanhã meu futebol acaba. Minha renda cai de oitenta por cento. Só os leigos acreditam que eu seja mesmo um milionário. Você mesmo conhece minha vida. Não vivo miseravelmente, mas nunca esbanjei. E depois assumi compromissos que terei de saldar, muito depois do final do seu futebol. Eu preciso de um emprego público, sim senhor”.




BALTAZAR

Sem amigos e sem dinheiro, o “Cabecinha de Ouro” prova que só usou a cabeça para fazer gols.

Por confiar demais no seu cartaz e não pensar no futuro, Baltazar (o famoso Cabecinha de Ouro” atualmente está passando maus momentos em Santos. Quando a sorte o bafejou, gastou dinheiro e viveu uma vida de rei. Agora está sentindo o erro de não ter economizado para os dias incertos do futuro. Talvez tenho pensado que o futebol lhe seria eternamente rendoso.

Os amigos também não são muitos, pois ele não soube fazer. Se assim tivesse acontecido, hoje, naturalmente seria amparado. Dentro do gramado era uma fera como centro avante. Certa feita em São Paulo, jogou Castilho com bola e tudo para dentro do gol com uma cabeçada. O goleiro tricolor era seu companheiro na seleção. Seu gênio incontrolável permitia-lhe cometer muitos desatinos dentro do gramado. Assim, nunca teve grandes amigos dentro do campo.  

Depois de ter sua época de ouro no futebol, Baltazar, ídolo do Corinthians, começou a cair e foi parar no interior, mostrando seu futebol por pouco dinheiro. Praticamente, Baltazar acabara para o futebol. A cabecinha de ouro já não funcionava mais. Chegara ao fim uma carreira que fora iniciado sob o signo da fortuna e da popularidade. A fama tomou conta de sua mente e não o deixou pensar no futuro. Fez ótimos contratos com o Corinthians, onde foi ídolo como artilheiro, mas o dinheiro se extinguiu rapidamente, pois ele gostava imensamente de automóveis.

E assim acabou o futebol de Baltazar, pode-se dizer. Não economizou, não fez amigos e a pobreza rondou-lhe os passos. O antigo e vigoroso craque não soube fazer cálculos para o futuro. Hoje, nem futebol, nem amigos, nem dinheiro. Só tristeza por ter usado a cabeça apenas para marcar gols. Mas uma coisa não se pode negar, dentro do seu estilo foi um dos maiores centroavantes do Brasil.  

Matéria na Revista do Esporte.



PAULO CESAR CAJU

Quando ele diz que superou o sistema, a máquina montada sobre os oprimidos, Paulo Cesar se refere à briga que teve com André Richer, diretor da CBD, e Cláudio Coutinho, técnico que o ressuscitou para a Seleção, nas eliminatórias de 1977, e que depois também se enquadrou nos esquemas do futebol. Sabe que foi banido porque reivindicou bichos melhores contra Peru e Bolívia o mesmo argumento que afastou Marinho Chagas.

- Lembro da reunião como se fosse hoje. Richer foi ríspido na defesa dos interesses da CBD e eu respondi à altura. Não levo desaforo para casa.

Paulo Cesar ouve novas acusações: mal profissional, porque arruma contusões para não jogar quando há corridas de longas distâncias nas Paineiras, foge dos jogos nos campos do interior e não cumpre as determinações táticas.

- Se sou mesmo tudo isso, como consegui ser campeão em todos os times que defendi? Inclusive o Grêmio, que joga no interior, onde existem verdadeiros alçapões. Não gosto de me exibir em campos que só servem pra peladas doidas e de baixa categoria. Os melhores bailarinos do mundo se exibo em nos melhores palcos. No futebol acontece o mesmo: o craque deve mostrar seu talento no Maracanã.                                                                                                                                          
Muitas recordações ele prefere esquecer para sempre, mesmo momento em que o adeus se aproxima lentamente e começa a acuá-lo, a encher seu futuro de temores e incertezas. As distensões, as torções, as pancadas são cada dia mais frequentes. Crescem na proporção em que declina seu prestígio. É Paulo Cesar sentindo o peso da idade, o correr dos dias que o afastarão dos campos e principalmente do Maracanã, santuário e provável túmulo de uma carreira polêmica.                                                                                                                                                   Paulo Cesar, negro de infância humilde que hoje, cheio de dinheiro, de autoproclama o Muhammad Ali do futebol. Mas com uma diferença: saberá se retirar de cena no momento certo.

  

ELY

O relato é de médio vascaíno, Ely do Amparo.
Quando foi convocado para o Pan Americano fiz ver a Zezé Moreira que não modificaria minha forma de jogar. Era um homem calejado e sabedor de que, lá fora, não se ganha campeonato sem peito, sem grito. Zezé concordou plenamente e declarou-me capitão do time. Convoquei os rapazes antes do primeiro encontro e adverti-lhes do que certamente iria acontecer. Estufei o peito e gritava dentro do campo como uma fera ferida. Tropeçamos contra nos peruanos e continuamos a campanha de cabeça erguida. Quem se escondesse ouvia minhas broncas.

Veio jogo contra o Uruguai. Logo nos primeiros minutos, um atacante uruguaio começou a sambar na minha frente, entrei duro. Carballo, o valentão uruguaio, correu ao meu encontro. Esperei de cara feia, o rapaz preferiu argumentar. Só então os companheiros entenderam que ali estava a receita para vencermos. Combinamos com os reservas: se eles invadirem o campo, invadam também. Não deu outra coisa seu moço. Eles invadiam, nós também. Vencemos o encontro.

No derradeiro jogo contra o Chile, e decisivo, expulsei Ademir de campo. O grande craque conquistou dois gols de saída e começou a se encolher. Mandei-o ir para frente e ele não obedeceu. Os chilenos começaram a endurecer o jogo. Corri para Zezé: Se você quer vencer o jogo, tire o Ademir. 
“Mais quem é que vai entrar?”
Outro qualquer. Zezé fez que não entendeu. Os chilenos ameaçavam. Corri para Ademir e o mandei para fora de campo. Zezé veio ao meu encontro.
“Quem é que pode entrar?”

Apontei Pinga. E Pinga entrou para fazer gol. Levou uma grande corrida dos chilenos enfurecidos com as comemorações. Colocou-se atrás de mim. Abro os braços e disse: Aqui ninguém entra. Vencemos então, no grito, no peito e na raça. Quando saímos do campo choveram muitas garrafas jogadas pela torcida chilena. Fiquei sozinho, dentro do Estádio Nacional, esperando amainar a onda. E trouxemos o título.                  



LELÉ AFIRMA QUE GOL DO FLAMENGO FOI IRREGULAR

Lelé não se lembra somente das emoções que teve no futebol.  Lelé fazia parte do trio do Madureira – Lelé. Izaias e Jair – que foi contratado pelo Vasco em 1942. Tinha um canhão nos pés e foi várias vezes convocado para a seleção brasileira e conquistou muitos títulos pelo Vasco da Gama. Em seu depoimento a revista placar, Lelé comentou sobre a decisão do titulo carioca de 1944.

“Eu tenho a amarga lembrança da final do campeonato carioca de 1944 quando perdemos o titulo para o Flamengo. Era uma decisão o Vasco tinha um time melhor e o Flamengo jogava desfalcado de alguns titulares. O Vasco não poderia perder aquele jogo, pois o Flamengo seria tri campeão. No final, uma vitória do rubro negro por 1x0, fruto de um gol ilegal marcado por Valido, ponta direita do Flamengo. Tínhamos tudo para ganhar e acabamos derrotas por um gol irregular”.


“Eu só me lembro do momento em que cruzaram a bola para a área. O Valido viu que não conseguiriam cabecear e apoiou os dois braços nos ombros de Argemiro. Conseguiu a cabeçada e o gol saiu. O Argemiro, nesse lance, até caiu sentado, pois Valido jogou toda a força nos ombros do nosso lateral. Discutimos bastante, mas naquele tempo já existiam os juízes que davam uma colherzinha-de-chá para certos clubes. O Vasco ainda tentou de todas as formas possíveis  invalidar o gol  e também a partida. O lance do gol do Flamengo foi filmado e os dirigentes do Vasco utilizaram o filme como prova na Federação Carioca de Futebol. Mas de nada adiantou, pois a Federação não anulou nada e o Flamengo acabou tri campeão carioca. Daquele jogo, sempre terei as piores recordações – concluiu Lelé.



Primeiros dias do Dida no Flamengo.

É Dida quem conta.
- Aos 17 anos fui convocado para a Seleção Alagoana, que iria disputar o campeonato brasileiro. E isso me incentivou muito. Durante a competição, no jogo contra a Paraíba, a delegação de voleibol do Flamengo, que estava excursionava pelo Nordeste, estava lá, assistindo. O nosso time perdia de três a um e eu marquei os dois últimos gols, virando o jogo para quatro a três. Quando cheguei em casa, já estavam lá dois representantes do Flamengo, que me propuseram a transferência para o Rio.
Apoio do pai, choro da mãe, Dida acabou embarcado para a cidade grande, em maio de 1954. Mas, na escala do avião da FAB, em Salvador, os problemas de saúde começaram a aparecer. Não que ele fosse doente. Esmo assim, Dida chegou ao Rio de Janeiro debaixo de injeções e cheio de timidez.


- Fiquei em tratamento durante 40 dias. Foi minha sorte. Os 20 últimos, o time principal que era campeão da cidade, estava excursionando pela Europa, voltou. Com isso, pude fazer um bom ambiente, antes do meu primeiro jogo, o que oi muito importante para mim, garoto bobo, chegado do Norte, que tinha até vergonha para tantos craques, quanto mais jogar junto. Mas com o tempo fui fazendo as amizades e ficando à vontade. Assim, entrei no time de aspirante, que foi campeão de 1954, enquanto o principal conquistava o bicampeonato. Nesse ano, joguei pelos aspirantes quatro meses e entrei em alguns jogos do time de cima. No aspirante tinha grandes jogadores como Duca, Moacir, Henrique, Babá e outros. Acabamos bicampeões, em 1955, quando o time principal no qual também joguei, conquistou o tricampeonato. 




Haroldo Miranda concedendo seu depoimento para o Museu dos Esportes.
Com ele estão os cronistas Lauthenay Perdigão e Luiz Alves.

O saudoso Haroldo Miranda viu o rádio esportivo nascer em Alagoas. Com outros companheiros, fez a sua história. Aprendeu e ensinou nas suas andanças por esse Brasil. Inaugurou dezenas de prefixos pelo Nordeste. Viveu emoções e decepções na longa caminhada de jornalista autêntico, verdadeiro e que combatia e era combatido. Apesar de ter participado do rádio alagoano antes da inauguração da Rádio Difusora de Alagoas, Haroldo Miranda não viu a inauguração da Pioneira. Estava no rádio baiano. Como ele não queria morrer teve que sair de Maceió. Marques Mesquita foi quem o tirou de avião de Palmeira dos Índios.

E Haroldo Miranda falou sobre a primeira emissora de rádio em Alagoas -     

- Antes de tudo isso, mesmo faltando uma emissora de rádio e Alagoas, que somente veio em 1948, existia em Maceió, o CRF e o PRFC, a primeira estação de rádio da nossa terra. Jaques Mesquita e Luiz Gonzaga construíram um transmissor, conseguiram burlar os Correios e Telegrafos e colocaram a voz de Alagoas no ar. Mas, logo depois, proibiram e calaram essa voz.


Como era homem de palco e fazia teatro Haroldo teve uma ideia.

- Resolveu falar com o Miguel para saber como podia transmitir uma partida de futebol, já que tinha visto em Aracaju uma transmissão do jogo da bola. Essa transmissão teria que ser feita através do telefone. Na época, os telefones eram raros. Mesmo assim, a linha telefônica da Fábrica Alexandria passava ao lado do campo do Mutange. Miguel, usando um amplificador, puxou uma linha da Fábrica, mesmo sem pedir permissão. Desta forma, nos anos quarenta fizemos a primeira transmissão esportiva no Estado de Alagoas para uma enorme rede de doze altos falantes espalhados pela cidade. Não tinha comentarista e no intervalo se transmitia uma seleção de músicas. O primeiro patrocinador foi Arestor Marques, dono de uma casa funerária. E eu anunciava assim - “Arestor Marques, o amigo certo para as horas incertas”.  



ZIZINHO NO BANGU

Certa manhã, o presidente do Flamengo, Dario de Melo Pinto, telefonou para Silveirinha, patrono do Bangu. Tinha negócios a tratar. Combinaram um almoço. De repente, como não podia deixar de acontecer. A conversa passou para o futebol. Em determinado instante, Dario achou chegado o momento de tentar a compra de Mariano. Depois de ouvir Dario, o patrono do Bangu admitiu a venda do Mariano, desde que o Flamengo lhe cedesse um jogador.

Dario deu a entender que aceitava a proposta. Silveirinha apelou - “É que o diabo o Flamengo, time grande de cobras, só tem jogadores inegociáveis”.
Dario rebateu: “Inegociáveis não. Dependendo do dinheiro, o Flamengo venderia qualquer um”.
Silverinha – “Até o Zizinho?”
“Até o Zizinho” – Confirmou Dario, longe de pensar que Silveirinha queria exatamente ele.
Como estava interessado em comprar Mariano, Dario resolveu liquidar a conversa sobre Zizinho, com uma proposta que julgava inaceitável – “ Zizinho custa 800 mil cruzeiros”.
”Eu pago”, atalhou Silverinha. Dario tentou recuar. Explicou que Zizinho não trocaria o Flamengo pelo Bangu, que não desejava sair da Gávea. Silverinha não se deu por vencido – “Quem sabe se uma conversa com Zizinho não resolveria tudo?”

Zizinho estava concentrado com a Seleção Carioca, que disputaria com a Paulista a final do Campeonato brasileiro. Era fácil localizá-lo. O próprio Silveirinha foi ao telefone. Contou a história. Zizinho Parecia não entender – “800 mil cruzeiros?”  Sim! Confirmou o patrono do Bangu. Zizinho sem querer acreditar – “Mas seu Dario disse que me vende por 800 mil cruzeiros”. Disse, não. Vende, interrompeu Silveirinha.

E Zizinho desabafou – “Pois então compre meu passe, seu Guilherme, que agora quem não quer ficar no Flamengo sou eu. Compre meu passe”. Silveirinha voltou à mesa e gritou, erguendo os braços – “Negócio fechado!” 

Dario balançou a cabeça afirmativamente. Quem assistiu à cena disse que havia um espanto e tristeza em sua face. Na semana seguinte, os cariocas golearam os paulistas por 4x0 e Zizinho fez dois gols. Logo depois, já banguense, embora apenas ter vestido a camisa do clube para as clássicas fotografias, seguiu para Araxá, primeira etapa dos preparativos para a Copa de 1950.

A torcida do Flamengo nunca entendeu a saída do Zizinho do clube. Para evitar uma reação pior, Dario falava em reforços. Anunciou a contratação de uma revelação gaúcha, Hermes, um goleador. Ele chegou cercado de carinho, era uma esperança. Mas, na primeira vez que Zizinho jogou contra o Flamengo, Hermes não fez nada. O Bangu ganhou de 5x0, Zizinho deu um show. A torcida do Flamengo ficou sem entender nada.


Da Revista Placar. 




FRIEDENREICH

Friedenreich, El Tigre, viveu um de seus maiores momentos no futebol no Campeonato Sul Americano de 1919. O campeonato que foi realizado no Brasil. O Fluminense construiu um estádio com capacidade para 25 mil pessoas especialmente para o evento.  Era o terceiro campeonato realizado.

Friedenreich, em entrevista para a Manchete Esportiva, jornalista José Romualdo da Silva, contou sua emoção na conquista daquele campeonato.

- Se vocês, hoje em dia, consideram os argentinos autênticos “bichos papões” multipliquem por dez o que eram os uruguaios na minha época. Para vencermos o Sul Americano de 1919 tivemos que jogar 2 horas e 15 minutos. Vinhamos, como eles, de quatro partidas sem derrota. No primeiro encontro perdíamos por 2x0. Viramos e conseguimos um 2x2 em cima da hora. Credenciamos a uma segunda disputa. Jogaríamos numa quarta-feira, por esse motivo foi decretado feriado para nossa sorte. Como não existia refletores a peleja foi marcada para as 3 horas, possibilitando  assim, as prorrogações. Terminou o jogo: 0x0. Prorrogação de 30 minutos: 0x0. Nova prorrogação de 30 minutos. Idêntico 0x0. No terceiro desdobramento aconteceria aos dez minutos a maior emoção da minha vida. Neco no meio campo fintou um adversário e deslocou-se para a direita cedendo a Millon que devolveu a Neco. Houve a repetição de lance mais próximo à área uruguaia. MIllon calculou e centrou. Senti que a bola não seria alcançada por mim. Heitor pediu - “deixa Fried”. Parei. Heitor cabeceou. Saporiti, goleiro uruguaio, rebateu e perdeu o equilíbrio. A bola veio em minha direção. Matei-a no peito e, de pé esquerdo, conquistei o campeonato de 1919. O delírio foi indescritível. O número de chapéus de palha jogados no campo determinou a interrupção do jogo. Os empregados do clube tiveram que recolhê-los. Saímos do estádio do Fluminense carregados, atravessamos as ruas da cidade, passamos pelo Palácio e o Presidente Bernardes nos saudou. Voltei para casa a uma madrugada completamente rasgado e sem um pingo de voz.  A festa dos dez mil chapéus de palha não me sai da lembrança.


( Parte da reportagem  de Ronaldo Boscoli para a Manchete Esportiva de 1957)




MÁRIO VIANNA

- Era véspera do jogo entre Hungria e Brasil pela Copa de 1954. Eu estaca de folga num hotel em Berna onde ficavam todos os árbitros. Puskas, o fantástico craque húngaro, não ia jogar e vi quando ele entrou no hotel e foi para o quarto no Mr. Ellis, juiz escalado para apitar o jogo. Eles ficaram lá dentro mais uma hora. Eu desconfiei. No dia seguinte, ao ver o Brasil ser vergonhosamente roubado (resultado final foi de 4x2 para a Hungria), botei a boca no mundo.

- Contei tudo que sabia à imprensa e chamei a FIFA de camarilha de ladrões. Meses depois recebi um comunicado da FIFAS, me consultando sobre as tais declarações. Diziam eles que se eu confirmasse as denúncias, seria expulso do quadro de árbitros. Como não sou homem de duas palavras, preferi ser expulso.

Mario não se emendou. Quando era comentarista de arbitragem na Rádio Globo, ao comentar uma partida apitada por Abraham Klein, mandou este para ar –
- Esse juiz além de judeu é ladrão!

Quase perdeu o emprego, porque os patrocinadores eram, como Klein, judeus.

Gafe semelhante voltaria a cometer numa mesa redonda de televisão, comanda por Luís Mendes. Sentindo-se asfixiado pela fumaça dos cigarros dos companheiros desabafou:
- Parem de fumar, isso é um veneno, polui os pulmões!


Enquanto isso, por trás das câmaras, Luís Mendes, com gestos desesperados, tentava lembra-lo de que o patrocinador ninguém menos do que a Souza Cruz.



Chico
na seleção brasileira de 1950

 O ponta esquerda Chico quer contar um segredo dos bastidores da tragédia de 50.
- O que foi contar ninguém vai achar em livro – garante.
Chico primeiro repete a recomendação que ouviu de Flávio Costa:
- Nosso treinador disse a Bigode que exigia disciplina. Se houvesse derrota com indisciplina, o indisciplinado seria o responsável. Bigode, então, modificou o estilo de jogo.

“Quando o Brasil estava ganhando de 1x0, tive um pressentimento: o Uruguai iria ganhar o jogo. Lá dentro do campo, pedi o apoio de Zizinho e Ademir porque eu ia tirar o Obdúlio Varela de campo. Todos nós sabíamos que Obdúlio Varela era chave do time do Uruguai. Um jogador que exercia comando, o líder absoluto. Eu conhecia bem o gênio daqueles uruguaios. Bastava que eu desse uma entrada desleal no Obdúlio e pronto. Tenho certeza que ele não resistiria. Mas aí meus companheiros perguntaram se eu tinha esquecido a ordem da disciplina dentro do campo”.

Chico lembrou outro detalhe importante.
- Nós estávamos concentrados na estrada Niemeyer. O contato com os jogadores era difícil. A condução era dificílima. Naquela época, pouca gente tinha automóvel. Não sei porque a concentração foi mudada para o Vasco em São Januário. É aí que entra o dedo da direção, nesse erro. Passou a existir uma frequência diária de visitantes na concentração. Tínhamos que fugir porque estávamos cansados de tanto dar autógrafos. Atender os torcedores era prazer, uma alegria, porque a gente sabia que essa gente tinha vindo de longe. Tínhamos de atender, mas aquilo estava nos prejudicando. Sem dúvida, a movimentação na concentração era maior do que deveria. Evidente. Houve reuniões e apresentações de políticos na concentração. Nenhum jogador participou da mudança da concentração para São Januário. Não fomos ouvidos. A mudança foi automática. Quando vimos, já estávamos transferidos. O estádio de São Januário era uma concentração boa – ótimo, até - mas ficava num ponto de fácil acesso. Então, a mudança nos trouxe prejuízo. Éramos apresentados a vereadores, deputados, candidatos. A politicagem nos prejudicou.

(parte do depoimento de Chico para o livro de Geneton



Dida
o garoto de ouro do Flamengo.

A estreia de Dida no time principal, foi em 1954, contra o Vasco, no Maracanã. Era o chamado jogo dos invictos do turno e o estádio estava repleto (160 mil pessoas). E o Dida contou como aconteceu.

- Só fui avisado de que iria entrar, na véspera do jogo. E, é claro, me emocionei. Também olha o time: Garcia. Tomires e Pavão. Jadir. Dequinha e Jordan. Joel. Rubens. Índio. Eu e Babá. No ataque, além de Joel. Rubens e Índio, ainda eram titulares o Benitez e Zagalo. Quando Benitez se machucava, o Evaristo entrava no seu lugar. Mas acontece que Benitez e Evaristo se machucaram ao mesmo tempo. Então tive a minha chance. E o Fleitas Solich colocou também o Babá, que jogava comigo nos aspirantes para ele me dar apoio. No final ganhamos de 2x1, gols de Rubens e Índio. Em seguida, veio o Fla-Flu, zero a zero, que também joguei. Depois Evaristo se recuperou e voltou a posição. Só entrei no time outra vez contra o Olaria quando marquei três gols. Daí em diante, fui me firmando como titular. O curioso é que só fui artilheiro em 1955, com 16 gols, no time de cima e 24 nos aspirantes.

Tempos da Seleção Brasileira em 1958 teve uma das suas maiores alegrias, ao passar a titular do time que estreou contra a Áustria na Copa da Suécia, onde sofreu, também, a sua maior decepção que o futebol lhe trouxe.

- Depois de ganhar a condição de titular, mesmo machucado no tornozelo, estreei na Copa contra a Áustria, ainda sem totais condições. Joguei evitando os choques, abrindo espaços para os companheiros. Mas, apesar da vitória, não me pouparam críticas. Houve que me chamasse de covarde, omisso e medroso. Entre eles, Leônidas da Silva, como me contaram depois. Logo ele, que tinha sido meu maior ídolo, o melhor jogador do meu time de botão, nos tempos de garoto. Do que ele fez naquela época não esqueci até hoje e não o perdôo. Carreguei aquela fama por muito tempo e isso foi responsável pela pior fase da minha carreira. Depois, perdi a condição de titular, já que contra a Inglaterra entrou Vavá. Quando a crise acabou, isso já no campeonato carioca, voltei a marcar gols e jogar normalmente. Fiquei no Flamengo até 1963, indo para a Portuguesa de Desportos, nos dois anos seguintes, e jogando mais dois anos pelo Junior de Barranquila, da Colômbia. Parei de jogar em 1968.




João Saldanha

 Jogadores brasileiros atuam dopados

João Saldanha aponta nomes. Paes Barreto garante que só usava sal. Ex-presidente
                                                   acusa Dr. Hilton Gosling.

Confirmando que os jogadores de futebol usam drogas em campo, uns por ignorância, outros com olho grande nos “bichos” e outros mais por interesses dos próprios clubes, o comentarista João Saldanha deu a nota de sensação no inquérito instalado contra o tráfico e o uso de entorpecentes no País. João Saldanha fez questão de frisar que falava como ex-técnico e mais de 20 anos de experiência em vários esportes.

Saldanha começou explicando que o uso de psicotrópicos (calmantes e estimulantes), injetáveis ou em comprimidos, no Rio ou em São Paulo, tem como objetivo colocar o jogador em campo na plenitude de suas energias. Afirmou que o uso de estimulantes foi incrementado após a última Grande Guerra, quando surgiu anunciado como droga miraculosa o Perventin. Disse que o finado Heleno de Freitas usava e abusava dessa droga, tendo sucumbido vitima dela.  Para Saldanha, a prática de saunas, às segundas feiras, por iniciativa dos clubes ou dos próprios atletas, é visando a desintoxicação do organismo, em conseqüência do uso do psicotrópicos.  Exemplificou o comentarista que, no campeonato carioca de 1948, por ocasião do jogo Botafogo e Madureira, em Conselheiro Galvão, ele, inadvertidamente, tomou um café que (foi informado mais tarde) continha uma dose concentrada de cafeína. Resultado: ficou dois dias sem dormir. Revelou que o mesmo aconteceu com o técnico Tim quando estreou no Guarani de Campinas. Por causa disso, Tim proibiu que fosse servido café, chá ou laranjada antes dos jogos. Saldanha ainda comentou que quando era técnico do Botafogo, no jogo em que seu clube goleou o Fluminense e conquistou o titulo de campeão, o time estava quase todo dopado. Apenas Nilton Santos, Garrincha e Servilho não usaram drogas. Disse ainda que Paulinho estava dopadissimo. Paulinho Valentim fez cinco dos seis gols do Botafogo naquela tarde. Para relembrar o time do Botafogo daquela tarde foi Adalberto. Beto. Tomé.  Servilho e Nilton Santos. Didi e Pampolini. Garrincha. Paulinho. Edson e Quarentinha.

O médico Nilton Paes Barreto, do Fluminense, que teve seu nome arrolado entre os depoentes, disse que jamais fez uso de estimulantes nos atletas em toda sua carreira. Confirmou, porém, que nos jogos importantes dava uma pitada de sal de cozinha aos jogadores do seu clube, mais por motivos psicológicos do que por outra coisa. E acrescentou em tom de brincadeira – Se sal de cozinha dopa, eu sou o maior dopador de todos os tempos.

O ex-presidente do Bangu, Fausto de Almeida, discordou ao depor na Comissão de Inquérito contra o uso de entorpecentes. Fausto afirmou que a “escola de doping” ou “o milagroso sistema de recuperação rápida e estimulante” foi criado por Dr. Nilton Paes Barreto, cujos ensinamentos foram assimilados pelo Dr. Hilton Gosling.  Disse ainda que quando assumiu a presidência do Bangu, em 1957, ali se fazia uso abertamente de estimulantes e afirmou que uma de suas primeiras providências foi substituir quem se encontrava à frente do departamento médico. Segundo Fausto de Almeida quem o advertiu sobre os problemas foram os jogadores Zizinho e Nivio.  Entretanto, os craques Zizinho e Nivio desmentiram o presidente e defenderam o Dr. Hilton Gosling. Zizinho acusou Dr. Nilton Paes Barreto, apontando-o como aplicador de “doping”.



Reportagem da Revista do Esporte de 1963



PAULO CESAR CAJU


Quando ele diz que superou o sistema, a máquina montada sobre os oprimidos, Paulo Cesar se refere à briga que teve com André Richer, diretor da CBD, e Cláudio Coutinho, técnico que o ressuscitou para a Seleção, nas eliminatórias de 1977, e que depois também se enquadrou nos esquemas do futebol. Sabe que foi banido porque reivindicou bichos melhores contra Peru e Bolívia o mesmo argumento que afastou Marinho Chagas.

- Lembro da reunião como se fosse hoje. Richer foi ríspido na defesa dos interesses da CBD e eu respondi à altura. Não levo desaforo para casa. Paulo Cesar ouve novas acusações: mal profissional, porque arruma contusões para não jogar quando há corridas de longas distâncias nas Paineiras, foge dos jogos nos campos do interior e não cumpre as determinações táticas.

- Se sou mesmo tudo isso, como consegui ser campeão em todos os times que defendi? Inclusive o Grêmio, que joga no interior, onde existem verdadeiros alçapões. Não gosto de me exibir em campos que só servem pra peladas doidas e de baixa categoria. Os melhores bailarinos do mundo se exibo em nos melhores palcos. No futebol acontece o mesmo: o craque deve mostrar seu talento no Maracanã.                                                                                                                                          
Muitas recordações ele prefere esquecer para sempre, mesmo momento em que o adeus se aproxima lentamente e começa a acuá-lo, a encher seu futuro de temores e incertezas. As distensões, as torções, as pancadas são cada dia mais frequentes. Crescem na proporção em que declina seu prestígio. É Paulo Cesar sentindo o peso da idade, o correr dos dias que o afastarão dos campos e principalmente do Maracanã, santuário e provável túmulo de uma carreira polêmica.                                                                                                                                                   Paulo Cesar, negro de infância humilde que hoje, cheio de dinheiro, de autoproclama o Muhammad Ali do futebol. Mas com uma diferença: saberá se retirar de cena no momento certo.



                               

Zizinho
Na Seleção Carioca.

No campeonato brasileiro de 1942 deu-se um fato que marcou muito o mestre Zizinho como jogador violento e desleal para a imprensa paulista. Em jogada com o zagueiro Agostinho da seleção de São Paulo e ídolo da torcida corinthiana, Zizinho saltou e caiu sobre a perna do zagueiro paulista que havia se atirado de carrinho para tirar a bola do craque carioca. Resultado do choque foi à perna quebrada do zagueiro Agostinho.

Uma semana depois, um advogado e duas testemunhas processavam Zizinho por haver inutilizado Agostinho. José Padilha, como advogado do Flamengo, argumentou que futebol é assim, um jogo violento e o lance pode acontecer com qualquer um. Depois o juiz ouviu o pronunciamento de Zizinho.

- Bem, era uma bola dividida. Agostinho correu e eu também. A menina estava entre nós dois. Ele entrou de carrinho e se a gente facilita acaba levando a pior. Mas eu não quis inutilizar ninguém seu juiz.

O juiz não entendeu nada. Aquele negocio de menina, carrinho e bola dividida, era tudo estranho para o juiz que nada sabia de futebol. E ele pediu que Zizinho repetisse o depoimento. Zizinho repetiu e o juiz continuou sem entender nada e solicitou que o jogador do Flamengo contasse a história novamente. Zizinho irritou-se e perdeu a calma.

- Eu acho que o senhor está de mau humor, seu juiz. Porque não toma um sal de frutas? O que não posso é ficar aqui repetindo  sempre a mesma coisa.

Resultado: Zizinho foi condenado a dois meses de prisão da qual se livrou por causa de um “sursis”.
 
(do livro: Mestre Ziza).
   



Friaça
Convocado para a seleção brasileira de 1950.

FRIAÇA NÃO ESQUECE A COPA DE 1950.

Quando voltamos para São Januário, eu, o Bauer e o Rui estávamos transtornados e ficamos dando voltas em torno do gramado. Depois de um tempo, subimos para o dormitório e aí apagou tudo. A coisa seguinte de que eu me lembro é que estava na porta de hotel em Teresópolis. Eu não sei o que me aconteceu, mas peguei o carro e fui dirigindo até lá. Acho que foi Deus que me guiou, porque eu estava fazendo as  coisas sem saber direito.


Chegando lá, o porteiro do hotel me reconheceu e começou a conversar comigo, mas eu não devia estar falando coisa com coisa, porque ele chamou o doutor Magliardi e o doutor me levou para uma casa de saúde. Minha família estava desesperada, todo mundo procurando por mim, mas eu nem me lembrei de falar com eles. Eu estava totalmente ausente, fora do ar mesmo, só me recuperei uns dois dias depois.



O SUPER ZÉ FOI TRAÍDO POR FALSOS AMIGOS
                               
José Maria Rodrigues Alves foi lateral do Corinthians campeão paulista em 1977 e um dos jogadores mais queridos da torcida corinthiana. Sua lamentação foi vê sua carreira chegar ao fim quando poderia ter sido mais longa e feliz. Em 1966 Zé Maria conheceu Zé Roberto quando começou no Botucatu. Foi seu amigo, matou sua fome e o Zé Roberto o fez sofrer como não se faz a um cão danado. Eram amigos inseparáveis. Zé Maria abriu   as portas de sua casa, dividia com ele suas refeições, pagava as cervejas que tomava nas noites de farra, e para complementar, ainda lhe emprestava dinheiro. Até que um dia acabou sendo traído. Zé Roberto furtou alguns talões de cheques da bolsa do Zé Maria e passou a usa-los, falsificando sua assinatura. Depois, para confundir o inquérito policial, Zé Roberto ou alguém em seu nome, declarou levianamente que Zé Maria era homossexual. E a sórdida trama acabou dando certo. Mal aconselhado por dirigentes do Corinthians, Zé Maria retirou a queixa e, sozinho, passou a viver um drama que duraria alguns anos. Ainda hoje, o Super Zé não sabe quem lhe causou o mal maior: se o falso amigo ou os diretores que não deixaram o craque tirar tudo a limpo.

Seu Durvalino, pai de Zé Maria, sempre fez questão de administrar a carreira do filho. Em 1970 forçou a ida do Zé para o Corinthians onde poderia ganhar mais. Comprou seus primeiros imóveis, discutia renovação de contrato, recebia seus salários, pagava suas dívidas e chegava a dividir o dinheiro com os outros filhos que ganhavam pouco. Depois da morte de seu Durvalino Zé Maria se viu transformado no chefe da sua complicada família.  Sua casa foi invadida pelos “amigos”, muitos dos quais somente se aproveitaram da situação. Todos os dias, Zé Maria levava para casa com pelos menos dois amigos para comer e dormir. Alguns, como Marco Antonio “Visgo”, chegaram a ficar mais de três meses. Depois saiam se dizer nem muito obrigado.  Outros como Mirandinha, Augusto e o seu compadre João, abusaram da hospitalidade e ainda deixaram dívidas para Zé Maria pagar.  Pior que seus “amigos”, só as trapalhadas dos irmãos. Tuta acabou seu Volkswagen que o Zé ganhou depois da Copa de 1970. Gil, Moisés e Modesto se encarregaram de destruir um Corcel novinho. Até suas roupas eram de uso comum. Com seu jeito simples, o Super Zé nunca reclamava de nada.  Se seu Durvalino estivesse vivo, talvez fosse diferente. Zé Maria não teria de assumir a complicada família e, com certeza, teria extraído melhores frutos de sua bem sucedida carreira. Mas, na falta de uma orientação segura ele deixou de assinar contratos realmente bons.

Josephine, que o amou intensamente, declarava para todos que, se podia dizer tudo do Zé Maria, menos que ele não é homem em todos os sentidos.  Tão homem que tinham muitas namoradas. Mas, entre as tantas namoradas, o Zé foi escolher Siomara, mesmo contrariando sua família. Para seu Durvalino, aquele casamento era coisa de bruxaria. Para Josephine, um caso de amor unilateral. O irmão Marco Antonio, dizia que era um homem bom dominado por uma mulher terrivelmente ambiciosa. Quando o Zé estava presente, Siomara tratava todos muito bem. Quando ele estava ausente, maltratava muito mal a mãe do craque, a quem chamava de “negra boba”.  A família sabia que não ia dar certo. E realmente não deu. Zé Maria casou apaixonado, mas sua alegria durou poucos meses. Siomara o proibiu de reunir seus amigos para as churrascadas, a família se afastou e as brigas começaram a ficar mais sérias. Até que, grávida de oito meses, Siomara abandonou a casa e procurou a policia para acusar o marido de agressão física. Zé Maria nega. A acusação foi apenas um pretexto pra ela sair de casa. Ele ainda afirma que o erro foi não perceber, antes do casamento, todos os problemas que poderiam existir entre ele e Siomora.  Estava muito ocupado, resolvendo os problemas da família e da própria mulher.

-          O Zé é bom demais. Tão bom que ás vezes chega a ser bobo. Essa declaração foi do irmão Gil, com autoridade de quem sempre deu muitas dores de cabeça ao irmão.



Revista placar




                                                   Memórias de Mário Américo 

                                      Gentil Cardoso, bom técnico e mau caráter

Em 1951 estava chegando o fim do grande Vasco, apesar de que, ainda por mais dois anos, ele manteria parte do seu poderio.  Quando Oto Glória assumiu o cargo de técnico encontrou mais obstáculos do que esperava. Os jogadores eram experientes, malandros, mal acostumados, difíceis portanto, sobretudo para um técnico como Oto Glória, na época um pouco ingênuo. Mudamos a concentração de Uruçanga para uma casa do cantor Carlos Galhardo, em Jacarepaguá.  Perto da casa havia uma grande mata e, no centro dela, um botequim de madeira com muita cachaça. E era apenas eu para tomar conta de todos. Resultado: alguns deles se enfiavam pelo mato e iam até o boteco encher a cara. Eu disse alguns? Enganei-me. Eram quase todos. Os únicos que permaneciam na concentração eram o Tesourinha e o Maneca. Como não poderia deixar de ser, o campeonato foi um desastre para o Vasco.

Gentil Cardoso sucedeu a Oto Glória. Bom como técnico, mas mau como caráter. Gentil era inclusive mentiroso e falso. Tanto assim que, pelo menos naquela época, não conseguiu ficar mais de um ano  no mesmo clube, ganhasse ou não o campeonato. Em 1952 houve um problema sério, quando ele tentou tirar do time titular os jogadores Augusto, Danilo, Jorge, Tesourinha, Ipojucan e outros. As mulheres desses jogadores foram São Januário e botaram ele na parede. Com intimações como esta:

-          Se nossos maridos não voltarem ao time, vamos dizer a todo mundo, inclusive a imprensa, que você anda cantando a gente.

No dia seguinte, Gentil recolocou todos no time. Ele sabia que no final do campeonato, seria substituído por Flávio Costa  e fazia tudo para brilhar. Foi nessa época que ele mandou buscar um macumbeiro na Bahia e transformou a vida de todo mundo. O pai-de-santo era doido. Seguia-nos por toda parte com uma espada de São Jorge na mão e fazia Gentil Cardoso andar com outra.  O fim de Gentil no Vasco seu deu depois de um telefone do técnico para o Nascimento do Bangu para onde ele queria se transferir. O telefone tinha extensão e, um diretor do Vasco ouviu tudo. Pouco depois, ele saiu escondido, mas quando voltou a porta estava fechada. Foi até a minha janela e chamou:

-          Pombo, Pombo, sou eu, seu chefe. Abra aporta pra mim.

Eu fui até a cozinha e dei de cara com o diretor sentado atrás da porta. Ele mandou que eu voltasse para o quarto e abriu a porta. De longe a gente ouvia briga.  O último jogo do campeonato foi contra o Olaria na rua Bariri. Ganhamos por 1x0 com um gol de Sabará nos últimos minutos.  Fizemos a volta olímpica com o macumbeiro exibindo sua espada e o Gentil Cardoso também. Quando ele chegou perto do túnel os dirigentes gritaram para o técnico que não adiantava festejar, ele estava despedido.




DARIO

No começa da sua carreira, Dario encontrava-se encostado no Atlético Mineiro. Ninguém lhe dava bola. O técnico Iustrich, um dia, aproximou-se e abriu o jogo.

- Dario não sei o que fazer com você. Ninguém do Atlético te quer e nenhum outro clube se interessa pelo teu passe.

- Mas, seu Iustrich o senhor nunca me deu uma chance. Só me deixa entrar quando faltam cinco minutos para acabar o jogo. O dia que começar o coletivo e senhor vai ver do quer o Dadá é capaz.

Mesmo sabendo que aquilo não levaria a nada, o treinador ficou com pena e deu a chance pretendida por Dario. Na metade do coletivo os reservas já ganhavam de 2x0, dois gols do Dario. Iustrich se surpreendeu.

- Que é isso Dario? O que aconteceu? Você nunca jogou desse jeito!

- Eu falei pro senhor. Agora me põe nos titulares que viro este coletivo.


Iustrich topou o desafio. E os titulares viram para 3x2. Três gols de Dario. Depois desse treino, Dario participou do tri campeonato mundial da Seleção Brasileira em 1970, acumulou títulos nacionais e regionais, jogou nos quatro cantos do país e foi artilheiro por onde passou. Virou o Dadá Maravilha.




MARINHO PERES

Na Copa de 1974, reviveu ao lado de Luiz Pereira uma dupla de área que se revelou no São Bento. Era a chance de consagrar-se, de confirmar o talento que vinha exibindo no Santos. Mas o Brasil fracassou na Copa e poucos jogadores escaparam ilesos daquele desastre. Um desfecho melancólico, mas absolutamente coerente como clima que dominava a delegação brasileira na Alemanha.

- Havia um inconcebível duelo de vaidades entre Marinho Chagas e Leão – afirmava Marinho – Os dois e mais alguns cujo nome prefiro não citar, só acordava para dar entrevistas e aparecer na TV. Em campo pouco produziam para o time. Depois das derrotas para a Holanda e Polônia, foi uma vergonha. Todo mundo se apressava em dar entrevista e jogar a culpa nos outros companheiros. Mas os atacantes tivemos muito a ver com o nosso fracasso. Perderam gols e não ajudaram na marcação como havia sido estabelecido na preleção.

Os erros daquela seleção, segundo Marinho Peres, começaram muitos antes do time disputar a primeira partida na Copa. Durante a preparação no Brasil, a equipe era escalada de acordo com o Estado onde iria se apresentar. Jogo em São Paulo, predominava os jogadores paulistas. Se era no Rio, jogavam os cariocas e assim por diante.

- Durante os 60 dias, um longo e desumano regime de concentração, só tivemos dois dias de folga. Um negócio altamente contraproducente tanto para os solteiros como para os casados. Então era um tal de passar filmes eróticos às escondidas que não acabava mais. Até guardas de segurança serviam de intermediários na compra de revistas pornográficas e o que dava de gente se masturbando era incrível. Aí, amigo, não há preparação física que aguente.

Depois do trauma da Copa, restou-lhe o consolo, ao menos de se transferir para o Barcelona de Johann Cruyiff, o holandês que liquidou o Brasil na Copa da Alemanha.





TESOURINHA

O ano de 1949 traz uma grande alegria e uma imensa tristeza. A alegria é por ter sido escolhido o Melhorar dos Craques do Brasil, um concurso nacional com a participação das torcidas. No dia 19 de janeiro, uma multidão posta-se à frente de sua casa, As 6 horas da tarde quando a Rádio Nacional anuncia o resultado e ele vai a janela comunicar que está eleito, a torcida invade o pátio. Tinha recebido 3.888.840 votos e o concorrente mais próximo, o príncipe Danilo, do Vasco, com 3.388.968 votos. Tesourinha ganhou um apartamento da Tijuca.

Dali para frente foi só tristeza como jogador do Internacional. O joelho direito o incomodava muito. Quantas vezes os diretores lhe pediram para entrar no sacrifício? Mas uma vez perdido o titulo para o Grêmio, era ele o maior culpado. “Está mascarado. Quer ir para o Rio” - diziam muitos dos que, tempos atrás, viviam abraçados a ele. Decepcionado, sentiu que estava acabado aquele relacionamento com o clube em que, por dez anos, jogou por muito mais do que um ordenado.

Em dezembro, estava vendido ao Vasco por 300 contos. No torneio Rio São Paulo de 1950, num jogo contra o Corinthians, Belfare caiu sobre o joelho, e ele não voltou a ser o mesmo. Esteve convocado para a Seleção Brasileira que disputou a Copa do Mundo. A cada treino o joelho inchava. Os médicos, Amilcar Giffone e Paes Barreto, olhavam-no em silêncio, penalizados. Não havia outra saída: Tesourinha foi cortado.  

Ele voltou para Porto Alegre. Esperava que dirigentes do Internacional estivessem lhe esperado. Não estavam. O Presidente Joaquim Difini comunicava a seus diretores. “Se ele entrar por uma porta, eu saio pela outra”. Um dia, passeava pela rua da praia e topou com Aparício Viana e Silva, conselheiro do Grêmio – “Te querem lá”. Informou o Aparicío – “Mas como? E o preconceito?”. E o conselheiro respondeu – “Tem uma ala muito forte que quer acabar. Tu servirias para um golpe psicológico. Nome nacional, ex jogador do Inter, sabe como é”. Tesourinha pensava em aceitar. Mas como calar o coração? Como encarar os amigos do peito que acostumaram a vê-lo com a camisa vermelha? Por outro lado, uma frase lhe martelava o cérebro – “Se ele entrar por uma porta....” .

No dia em que estreou, o vice-presidente do Grêmio, Luís Assunção, declarou ao Correio do Povo – “Tesourinha acabou com o arianismo no Grêmio. É um abolicionista que o Vasco nos mandou.  Tesourinha ficou no Grêmio de 1952 a 1955.

De Divino Fonseca para a Revista Placar.






                                        MEMÓRIAS DE MÁRIO AMÉRICO                                                        


O Vasco estava com tudo. Tinha dinheiro, tinha torcida e muita sorte, mas nem naquele ano de 1946 conseguimos o titulo. Com a surpreendente saída do técnico Ondino Viera, o time se desorientou e perdeu um pouco do entrosamento. Ondino não aceitou a oferta de renovação do contrato e foi embora, sendo substituído por seu auxiliar Ernesto Santos. Não deu certo. Ernesto era um ótimo técnico, sabido tudo, mas era bom caráter demais para agüentar um clube grande. E, além de tudo, era bom e ingênuo. Só tinha que ser engolido, porque aquela turma de raposa só entendia uma linguagem: a da porrada. Logo Ernesto saiu e o Vasco contratou Flávio Costa, outro homem duro como Ondino. Flávio assumiu o time no meio do caminho e não teve tempo de recuperar o grupo. Já no ano seguinte as coisas melhoraram, principalmente com a volta de Ademir Menezes, um dos maiores goleadores que vi em meus quarenta anos de futebol. Novamente entrosada e disciplinada, o Vasco deu um passeio em todo mundo e foi campeão invicto.


A alegria foi obscurecida logo depois, por um acontecimento muito doloroso: a morte do nosso querido companheiro Isaias, aquele centro avante de sete fôlegos que desmoralizava quase todos os goleiros do Brasil com seus chutes violentos e traiçoeiros.  Nós estávamos nos preparando para uma viagem ao Uruguai, onde haveria um torneio e o entusiasmo era geral. Uns dias antes, Isaias me procurou na concentração. Fiquei pasmado ao vê-lo. Não era possível. Diante de mim, rouco e triste, estava um fantasma. Quase não o reconheci, tão magro ele estava. Isaias respirava com dificuldade. Sentou-se e balbuciou:


-          Estou muito mal, Mario, acho que vou morrer.


Levei-o imediatamente ao Dr. Amílcar Gifffone, mas, ao que parece o médico não se impressionou tanto quanto eu. Deu-lhe um remédio e mandou que ele voltasse no dia seguinte. Ele voltou e eu mais uma vez me espantei. Já nada mais restava daquele negro raçudo e alegre que um dia, quando jogava pelo Madureira, eu vira marcar quatro gols no poderoso Fluminense. Já não era mais aquele Hercules de Ébano que um dia marcou um golaço de letra também contra o Fluminense. O que estava a minha frente, agora, era um moribundo, um esqueleto ambulante. O médico diagnosticou tuberculose galopante e ele foi internado num Hospital de Petrópolis, onde deveria receber uma injeção de ouro que fora encomendada nos Estados Unidos. Mas não chegou a toma-la. Sua família, contrariando as ordens médicas, tirou Isaias do Hospital para tentar uma cura num centro espírita.


Isaias morreu quinze dias depois. Ocorreu, então, um fato que só de lembrar me enche os olhos de lágrimas. Nós tínhamos um amistoso marcado contra o Olaria, justamente na data do enterro.  Para surpresa nossa, dirigentes do Vasco não quiseram adiar o amistoso. No sepultamento de Isaias, só Ademir Menezes se fez presente, mesmo assim, porque estava contundido e não tinha condições de jogo para enfrentar o Olaria. Essa é uma mágoa que tenho do Vasco da Gama.




ZIZINHO

Zizinho terminou a carreira dignamente. O futebol fascinante, irresistível mesmo, não evitou vexames inesperados. Num jogo entre carioca e paulista, no Pacaembu, Agostinho ganhou uma disputa com Jair, mas deixou que a bola se distanciasse. Zizinho vinha chegando e Agostinho, apelou para o carrinho. Foi tudo muito rápido: Zizinho escorou a perna do lateral e ouviu um, estalo seco.
“Quebrou a perna em duas”, afirmavam alguns.
“matou”, diziam outro.
O certo é que a fratura afastou Agostinho dos campos e Zizinho ganhou a fama de violento e desleal. Afonsinho processou o companheiro. Zizinho defendeu-se perante o juiz disse que o lance foi casual. Mas o juiz julgou de acordo com os autos, que resumiam uma lamentável realidade: um homem impossibilitado de continuar sua carreira, atingido no trabalho por um companheiro de profissão. Zizinho acabou condenado, mas beneficiado pelo susis, pôde seguir jogando.

Tempos depois, num Flamengo x Bangu, disputou uma bola com Adauto e o estado que abalou o Pacaembu repetiu-se em Moça Bonita. Só que, desta vez, a vítima era Zizinho.
“Castigo!”, afirmavam alguns.
“Coisa feita”, juravam outros.

Perna gessada, sem previsão de quando voltaria a jogar, houve quem o aconselhasse: “Processa!”. Zizinho ficou irritado: “Processar o Adauto? Se eu fizer isso estarei passando recibo de que atingi o Agostinho de proposito”. A ideia morreu ali. O drama do jogador, não. Ele voltou meses depois, mas ainda sentia dores. Ouvia sempre os mesmos comentários: “É assim mesmo. Dói um pouco depois passa”. Só que as dores não passavam. Novas radiografias mostravam que a fratura não estava consolidada, havia “uma rachadura” como dizia de maneira engraçada Tião. Zizinho teve que gessar a perna novamente. Meses depois, a volta. Ele voltou melhor.

De Fausto Neto para a Revista Placar.




SPINELLI

   Spinelli era um jogador que atuou nol Fluminense e no Botafogo do Rio de Janeiro. Como jogador não tinha muitos recursos, apesare de ter jogado em grandes clubes como titular. Pelo que conta a história, Spinelli era um bom aliciador.

Nas Memórias de Jurandir, goleiro do Flamengo nos anos quarenta, é contada uma história que envolve o ex-tricolor. Jurandir foi taxativo – “Spinelli procurou-me para uma engavetada”.

Na semana do clássico Flamengo e Botafogo, a grande sensação era a partida de aspirantes que decidiria o titulo de campeão. Afastado do time há algumas semanas, Jurandir recebeu um telefonema do técnico Flavio Costa que pretendia utilizá-lo no time de aspirantes. O goleiro começou a treinar forte e se preparar para o grande jogo.

Às vésperas da partida Jurandir foi procurado por Spinelli, que já tinha fama de subornador. Ele trazia uma ótima proposta para amolecer o jogo de aspirantes para o Botafogo.

Dizia Spinelli – “Vou precisar de você. O Botafogo precisa ganhar o jogo de aspirantes de qualquer jeito, e estou incumbido de sondar às possibilidades”.
Jurandir respondeu – “Vá dizendo...”
E Spinelli continuou – “Você quer vender o jogo?
Jurandir respondeu – “Vender eu não vendo, pois o jogo não é meu, é de todos nós. Além disso, para o vencer o Flamengo, o Botafogo não precisa de mim. Pode ganhar sozinho”.
E o dialogo continuou –
-          Enfim, você pensa. Se resolver favorável, estou autorizado a lhe pagar dez mil cruzeiros.
-          É de ordem do Bebiano?
-          Não. O doutor Bebiano não tem nada com isso. É de ordem de um diretor de Departamento Amador, cujo nome não posso dizer.

Jurandir deixou Spinelli e foi embora. Mais adiante encontrou o companheiro Vevé, ponta esquerda do Flamengo, e lhe contou o acontecido. O velho amigo Vevé deu uma enorme gargalhada e disse para Jurandir que era brincadeira de Spinelli. Que o Botafogo não iria gastar tanto dinheiro em um jogo de aspirantes. O goleiro não disse nada e aguardou o jogo. Através do telefone, Spinelli ainda procurou Jurandir que sentiu que a oferta era para valer.  Ele desligou e esperou o domingo.

E Jurandir concluiu- “O Botafogo venceu por 1x0 e se sagrou campeão. Spinelli estava nas arquibancadas e fiz que não o vi. Ele também fingiu que não me viu. Mas, joguei bem e o Botafogo venceu porque era melhor”. (Gazeta Esportiva de São Paulo).
                         




ZÉ MARIO

Zé Mário afirma que houve má fé do Grêmio.
O Grêmio propôs ao Vasco a compra de Zé Mário por 3 milhões de cruzeiros. O apoiador vascaíno acreditava que, enfim, havia feito um bom negócio na vida. E fez seus planos: jogariam dois anos em Porto Alegre e voltaria ao Rio de Janeiro para encerrar sua carreira jogando pelo Bonsucesso, clube onde começou. Aos 30 anos de idade, Zé Mario não poderia proposta melhor, e só com os 15 por cento que receberia do Grêmio poderia ficar tranquilo com relação ao futuro. Mas, para sua surpresa e do Vasco também, ao fazer exame médico no clube gaúcho, foi vetado e a negociação acabou desfeita. Zé Mário não entendeu o motivo de sua dispensa, preferindo acreditar que tenha sido pelo preço de seu passe, pois a desculpa dos exames não convenceu.


“Confesso que não entendi porque não me aprovaram no exame médico. Só pode ter sido má fé do clube gaúcho. Quando fiz o exame com o médico Luiz Marchek, ele nem sequer pediu uma radiografia ou me exigiu testes físicos. Limitou-se a apalpar meu joelho e garantiu que estava tudo certo e que não havia derrame. Só mais tarde é que soube que não tinha sido aprovado, pois, segundo o médico, precisaria de um prazo de dois a seis meses para me recuperar”.





                                                           EDER JOFRE

A rigor, essa luta excepcional não começou exatamente naquele dia, 18 de agosto de 1960, mas dez dias antes, no momento em que Eder chegou aos Estados Unidos com excesso de peso para a categoria. Ele ficou obrigado a passar vários dias sem comer. Isso aumentou a preocupação, que já era grande, pois enfrentar um lutador muito forte. No dia da pesagem passou quase um quilo do limite permitido. Teve um choque muito grande. Já estava desgastado, pois teve poucos dias para uma adaptação, e enfraquecido, pois na véspera não almoçara nem jantara para atingir o limite. De repente, surgiu aquela inacreditável necessidade de perder quase um quilo em pouco mais de uma hora. Ele e seu pai, Aristides Jofre, voltaram às pressas para o Hotel Alexandria, onde Eder envolveu-se em três quilos e meio de roupas de lá e plástico e começou a treinar duro para suar muito. Fez o que correspondia cinco ou seis rounds de muita movimentação. Conseguiu chegar ao exigido na hora da pesagem oficial, só que estava mais morto do que vivo. Voltou ao hotel, tomou sucos de frutas, mel, comeu doces e saladas. Descontou um pouco e as 16 horas tomou outro lanchezinho. Voltou a descansar até hora de ir para o Oympic Auditorium.

Eder Jofre nunca tinha cruzado com Joe Medel, mas foi seu mais duro adversário. Na luta em Los Angeles, Eder Jofre teve suas maiores emoções. Aquela luta foi tudo para Eder. Lutou como um campeão. Se não aparecesse na carreira de Medel, acha que ele ficaria invicto.  Ele ganhou até do Harada. E Eder ainda derrotou o Medel, mais uma vez, em 1962, em São Paulo. Na luta de Los Angeles, Joe Medel foi um adversário duro que no segundo round Eder quase foi a nocaute.


(Continua da quinta feira)



DANILO ALVIM
   

Na seleção tive meus momentos de glórias. Lembro, por exemplo, que em 1949, tivemos uma conquista que me gratificou particularmente, que foi a do Campeonato Sul Americano, realizado no Rio de Janeiro. Esse campeonato serviu também para preparar o time que disputaria a Copa do Mundo, realizado um ano depois. Não resta dúvida que, em termos de seleção, uma das maiores emoções que vivi foi o campeonato de 50, quando iriamos disputar, com o Uruguai, o título máximo, com a com a vantagem de um empate para os brasileiros. Até o momento do segundo gol uruguaio, aquele dia era para mim, e meus companheiros, uma mistura de orgulho, emoção, deslumbramento. Eram várias sensações ao mesmo tempo. Após o segundo gol do Uruguai, senti como se o mundo tivesse desabado. Parecia que eu tinha perdido um parente muito chegado, tal a tristeza que me dominou. Aliás, com time todo. Aquela era uma partida em que já estávamos vitoriosos por antecipação, por termos o melhor time, a melhor campanha e grandes jogadores. Portanto, naquele dia, o povo tinha ido ao Maracanã para assistir a vitória do Brasil, e não à disputa de uma disputa de futebol. Na verdade, ninguém estava preparado para a derrota, nem o público, e muito menos nós, jogadores. Então em poucas horas, passamos do êxtase ao pesar profundo.


       

 JULINHO

Julinho recebeu a maior vaia de uma torcida. Aconteceu no maracanã antes de um jogo amistoso entre o Brasil e a Inglaterra. Julinho nunca esqueceu.

“Eu e o Garrincha disputávamos a posição. Ele era ídolo, campeão do mundo em 1948, endiabrado. Mas estava muito gordo, fora de forma. Na concentração das Paineiras, onde ficamos 10 dias, o técnico Vicente Feola me disse que eu ia jogar. Responde que haveria muita vaia. Os fãs de Garrincha apareciam na concentração exibindo faixas que exigiam sua presença no time”.

“No Maracanã, do vestiário nós ouvíamos a torcida nas arquibancadas. E até o locutor do estádio provocou. Foi anunciando a escalação: Gilmar. Djalma Santos. Belini. Orlando e Nilton Santos. Dino Sani e Didi. Julinho...aí parou, deu uma pausa, para dar ênfase as vaias. E elas foram de ensurdecer. Eu disse a Djalma Santos, esta torcida vai engolir, vai engolir”.

“Mas eu tinha fé. Muita fé. E ela me ajudou. Começou o jogo, em 10 minutos eu já tinha virado o panorama. Dei um passe para Pelé entre as peras do lateral, o Pelé me devolveu entre as pernas dele de novo. O lateral fechou as pernas e caiu, eu saí com a bola. E aos 13 minutos fiz o primeiro gol, entrando na corrida para encher o pé num cruzamento de Canhoteiro. Aos 25 minutos veio o segundo gol. Outra jogada minha. Driblei o goleiro e chutei em diagonal, o Henrique completou de carrinho para fazer o gol. Aí a torcida já estava comigo. Toda vez que eu pegava na bola, eram aplausos. Nunca ou esquecer aqueles momentos. Pode não ter sido minha melhor atuação na seleção. Mas, em termos de repercussão, aquele jogo contra a Inglaterra foi o mais importante”.

                        



ADEMIR MENEZES

Ele era um pesadelo para a torcida do Flamengo, uma garantia para a Seleção Brasileira, um atacante que muitos consideraram acima de qualquer marcação.

Ademir comentou sobre seu tempo de jogador de futebol nos anos 50.
“Em 1950, depois de uma paralização de doze anos devido à guerra, eu repetia Leônidas da Silva, como detalhe de fazer um gol a mais. Foi também uma Copa de algumas contagens extravagantes. A maneira de jogar mudara um pouquinho. Era a época da diagonal, que Flavio Costa utilizou durante todo o seu reinado. Dois laterais presos, Bauer e Danilo soltou no meio-campo, Jair e Zizinho indo e vindo, de acordo com o lado da jogada, eu lá na frente, com função específica de marcar gols”.

“Eu dei sorte, sabe? Tanto na seleção como no Vasco. Na seleção, estava entre Zizinho e Jair. No Vasco, entre Maneca e Ipojucan. Mas a diagonal ainda manteve o futebol descontraído e o centro avante tinha espaço para jogar. Ficava naquela de esperar o lançamento, geralmente longo. Eu virava o corpo e, como tinha velocidade, ganhava sempre na carreira. Como a marcação era pouco móvel, cada um ficava com o seu, os zagueiros sofriam muito”.


“Mas, entre 1950 e 1952, um fato isolado marcou o começo das dificuldades para o centro avante. Dificuldades que o chamado homem-gol já sentia quando enfrentava os times armados por Zezé Moreira. O Botafogo trouxe um zagueiro argentino excepcional, o Basso, logo depois da Copa de 50. Além de muitas qualidades técnicas e com perfeita colocação em campo. Foi com Basso que comecei a perder terreno. Ele não colava em mim, como os outros, e também não me acompanhava quando eu procurava fugir da área para ser lançado. Marcava a área, a zona. O Basso sabia que, encostando, poderia perder no pique. O que ele fazia era ganhar terreno, obrigando-me a tentar o drible ou o passe para o lado”.






                                                             LUIZ BORRACHA                                  

Luiz era reserva do titular Jurandir no gol do Flamengo. Sempre que entrava, fazia defesas eletrizantes com saltos acrobáticos. Assim surgiu o apelido “Luiz Borracha” que foi dado pelo locutor esportivo Ary Barroso. O técnico Flávio Costa foi quem o lançou na equipe principal do clube rubro negro. E foi ainda com Flávio que defendeu a seleção carioca e brasileira.

E foi num jogo contra o Botafogo que aconteceu o lance fatal para o goleiro. A bola era para Luiz Borracha. Seu companheiro Biguá se chocou com ele e na sobra Braguinha fez o gol do Botafogo. Biguá  olhou para  Luiz Borracha com as mãos na cintura e o jogou contra a torcida. Ali, em General Severino, sem saber, ele estava sendo enterrado para o futebol. Dirigentes o acusaram de venal e ele terminou saindo do time. Se transferiu para o Bangú. Depois passou pelo São Cristovão, jogou no clube da Universidade de Caracas na Venezuela, correu meio mundo e, sempre que alguém desconfiava, as portas se fechavam para o goleiro. Luiz Borracha continua sendo vitima de uma injustiça de alguns dirigentes do Flamengo.

O lado exclusivamente humano reclamava a injúria. Luiz Borracha era uma vitima. Nunca ninguém conseguiu provar as acusações que lhe foram feitas. Mas, para que uma injustiça seja reparada é preciso que haja o altruísmo da confissão de quem a cometeu. Oito anos depois, Luiz Borracha voltou ao Flamengo como massagista, e dele, voltou a merecer toda confiança. Naquele jogo de 1948, depois de uma derrota inexplicável, dirigentes rubro negros resolveram antecipar o fim do seu goleiro. Foi acusado e afastado do clube. O rotulo de venal acompanhou o resto de sua carreira. E terminou como limpador de automóveis. Os dirigentes do Flamengo de 1956 acolheram uma solicitação de Jaime de Almeida, antigo companheiro de Luiz Borracha, e lhe ofereceram um cargo de auxiliar de massagista no clube. Foi retirada a calunia que morava em seu nome e ele passou a viver em paz. Luiz Borracha é um homem recuperado para a sociedade. Mas, seus anos perdidos no futebol nunca ninguém pagará. Foi um preço alto demais para um craque de um clube tradicional como o Flamengo, e das seleções carioca e brasileira.




                                                                   ALMIR                            

 Bandido e idolatrado. Foi talvez o maior marginal do futebol brasileiro. Mas dava a vida pela vitória. Por isso, foi ídolo de todas as torcidas. Fez gol metendo a cara na lama, estremeceu o maracanã, armou grandes brigas, quebrou pernas, não teve medo de nada e acabou assassinado.

Implacável, o tempo muitas vezes faz até os heróis caírem no esquecimento. Poucos, na verdade sobrevivem na memória do povo, e um deles é Almir Pernambuquinho, certamente o craque da raça mais passional da história do futebol brasileiro. Em campo ele experimentou todas as emoções: vencer era uma questão de vida ou morte e, se a violência não contribuía para uma boa imagem, pelo menos lhe  assegurava gordas gratificações. Odiado pelos adversários e temido pelos próprios companheiros, foi um antético anti-herói. Assim viveu seus 36 anos incompletos. Como num faroeste, estava sempre desafiado a um novo duelo por algum desconhecido.


O zagueiro Helio, do América, ficou inutilizado aos 32 anos de idade num choque com Almir. Dizem que o estalo da perna foi ouvido da arquibancada do maracanã. Para Almir, a cena se resumiu a uma simples explicação: - Era ele ou eu – O episódio marcaria definitivamente sua carreira. Cronistas carregavam o nome de Almir com qualificativos como “marginal”, “bandido” ou “facínora”, expressões repetidas quando ele, com a cabeça cheia de anfetaminas levou o Santos, em 1963, a ser bi campeão mundial de clubes, no maracanã, diante do Milan. Intimidou os italianos com um pontapé na cabeça do goleiro Balzarani e uma entrada violenta em Amarildo que foi jogado para fora do campo. Se a imprensa o punia como covarde, a torcida o atirava aos céus. Assim era Almir. Em constante estado de autopunição, não queria cultuar atos de bravura. Tratava-se de um passional na luta pela sobrevivência.

Jogou no Sport, Vasco, Corinthians, Boca Juniors, Fiorentina, Gênova, Santos, Flamengo e América. Entretanto, foi no Flamengo que ganhou  status de craque da raça. Em sua concepção, aquela camisa, rubro negra como a do Sport, não podia ser humilhada e nada o revoltava mais que a humilhação.  No Flamengo fez um gol com a cara na lama, contra o Bangu em 1966. A bola estava presa numa poça, mais próxima do goleiro Ubirajara, e ele, herói daquela noite chuvosa, foi arrastando milímetro por milímetro o rosto pela terra.  O gol foi registrado em página dupla 



Foi esse homem incompreendido, que trilhou, inclusive, caminhos condenáveis para se transformar em um craque da raça, que numa noite, durante uma discussão de bar com homossexuais que insistiam em perturbá-lo, levou dois tiros de uns desconhecidos. Estirado naquela calçada inunda de Copacabana, ganhou apenas uma rosa vermelha atirada por uma mulher da vida. É que ela, só ela, parecia identificar em Almir o que era o sofrimento de viver.




                                                                       
FELIX

Na Portuguesa de Desportos nunca conquistou um título de campeão. Quando contratado pelo Fluminense, em 1968, ganhou os títulos do campeonato carioca nos anos de 1971, 73, 75 e 76, a Taça Guanabara, em 1971 e a Taça de Prata, em 1970. Mas, de todas as suas glórias, só  22 jogadores tem igual, a Copa do Mundo de 1970. 

Na Seleção Brasileira, Felix teve as emoções que nenhuma outra conquista pôde lhe proporcionar em sua longa carteira. E não foi só o título, o momento final da consagração, quando o juiz apitou, encerrando o jogo contra a Itália e passando as mãos brasileira a posse definitiva da Taça Jules Rimet. Foi muito mais que isso. Foram detalhes comovedores, momentos inesquecíveis, defesas brilhantes, gols sensacionais. As emoções, em Guadalajara e na cidade do México, aconteceram a casa dia, a cada jogo, a cada chute.

“Todos pensam que o meu maior momento foi na defesa que fiz contra a Inglaterra, na cabeçada de Bobby Charlton, quando os ingleses mais apertava. Porém, não foi; pelo para mim. Sei que naquela partida eu provei que sabia sair bem do gol, que tinha reflexo e tranquilidade; que a tal defesa foi importante para o time, mas, mesmo assim, não esse meu melhor momento daquela Copa do Mundo. Aliás, não há um só lance, mas, sim, dois que me gratificaram ainda mais”.

“Faltavam quatro minutos para acabar o jogo Brasil x Uruguai e vencíamos por 2x1. A bola veio alta para a área e encontrou no caminho a cabeça do atacante uruguaio Cubillas. E eu vi a bola entrando no ângulo. Seria o gol do empate dos

uruguaios, o que nos obrigaria e disputa de mais 30 minutos de prorrogação. Porém, fui lá em cima e consegui defender. A bola nem chegou a sair de campo e fomos, em seguida, ao ataque, marcando o terceiro gol através do Rivelino. Era a vitória assegurada em pouco mais de um minuto. Aquela defesa e o gol no contra-ataque nos garantiu a passagem à finalíssima contra a Itália. Esse sim, foi meu dias e foi meu momento de glória”.


                  



RUI REI

Expulso no jogo final do Campeonato Paulista, Rui Rei viu desabafar sobre ele o ódio de muita gente. Ontem, se ele dava um drible ouvia os aplausos, se marcava um gol sentia a vibração. Hoje, se fala, ninguém ouve. Se diz que não tem culpa, duvidam.

E Rui Rei, aos 24 anos de idade, vive os piores momentos de sua carreira por ter sido expulso no início da partida final contra o Corinthians, na disputa do título de campeão paulista. Por causa das críticas violentas a até ameaças, passou vários dias trancado em casa, sem disposição para sair. Dele, o mínimo que falam é que provocou propositadamente a sua expulsão.

“Se discuti com o juiz logo no início do jogo é porque não acreditava que pudesse ser expulso assim, tão rápido. Não esperava mais do que uma advertência. Mas o que posso fazer? Dulcídio Vanderlei Boschila não gosta de mim. Até cultivou o costume de me chamar de macaquinho. Reconheço que caí numa armadilha, que fui ingênuo. Ele me advertiu antes do jogo, ameaçou com uma punição se eu reclamasse.  Queria que eu ficasse caladinho, sem agitar os zagueiros como sempre faço. Mas eu lutava por um time e não podia aceitar uma intimidade dessas. Levei um chute sem bola e reclamei. Vi o cartão amarelo e gritei – Eu apanho e ainda tenho que ficar quieto? E ele puxou o cartão vermelho – Agora eu pergunto: se fosse um jogador do Corinthians, teria acontecido a mesma coisa? Nunca. Jamais!”.     

Uma ocorrência que talvez tenha prejudicado um pouco sua carreira.

“Não vejo as coisas assim. Siou um grande artilheiro, faço gols e nunca tinha sido expulso antes, com a camisa da Ponte Preta. Ou será que esses detalhes não serão levados em conta pelos meus críticos? E eu ainda jogava sem contrato, com seguro. O que houve ali, naquele dia, foi uma revolta natural a um jogador de sangue quente, como eu. Se perdi a cabeça foi batalhando pelo meu clube".

(Reportagem de Brasil de Oliveira para a Manchete Esportiva).


                                        A INCRÍVEL HISTÓRIA DE BAUER




                                                         Bauer na Seleção Brasileira.
“Vim para ser campeão e voltei para São Paulo no chão do trem”.

Bauer veio de São Paulo para o Rio para ser campeão mundial de futebol. Jamais imaginaria que iria fazer uma viagem de volta, derrotado e dormindo no chão de um trem.

Precavido, Bauer comprou uma passagem de trem para domingo à noite. Queria fazer a festa com o pai e a mãe em São Paulo – “Antigamente era assim, cada um cuidava de si. Então, comprei a minha passagem de trem para depois do jogo com o Uruguai”.     

Durante a semana, um repórter da revista O Cruzeiro o procurou para dizer que ele não poderia viajar no domingo para São Paulo. Haveria uma comemoração com os campeões, os brasileiros, é claro. A missão do repórter era acompanhar todos os passos de Bauer. Insistente, o repórter conseguiu convencer Bauer a devolver a passagem de trem – “O repórter me obrigou a devolver a passagem, para ter a certeza de que eu ficaria no Rio depois do jogo. Fui até a Central do Brasil. Eu até já conhecia o homem do guichê, Seu Paixão. Recebi o dinheiro da passagem de volta”.

E Bauer continuou – “Mas domingo, quando a tragédia calou o maracanã, a comemoração virou pesadelo. Não tinha revista, não tinha repórter, não tinha ninguém. E eu estava sem a passagem. Naquele domingo o Rio de Janeiro morreu. Então, em companhia do falecido Geraldo José de Almeida e de um amigo, voltei até a estação. A gente embarcou no trem. Aquele fiscal que marca as passagens queria parar o trem porque eu não tinha passagem. Queria que eu descesse. Conseguimos convencer o homem. A cabine era de dois. Comigo três. Pedi um cobertor. Fui dormindo no chão. A verdade é essa”.


E completou – “Quero dizer o seguinte: sou católico, mas até hoje recrimino aquela missa que foi rezada às sete horas da manhã para os jogadores, no dia da final da Copa do Mundo de 1950.  Não perdemos por causa daquela missa, celebrada como parte de um dia glorioso em que poderíamos ser campeões do mundo. Mas a inconveniência do horário foi uma das causas”. 



                                                            JAIR DA ROSA PINTO
        

Jair da Rosa Pinto tinha 28 anos e num domingo de 1949 enfrentaria sua ex-equipe, que estava mais forte do que nunca, enquanto seu atual time vinha sendo formado por veteranos como Bria, Jaime, Gringo e Esquerdinha. Dava para comparar?  E ainda tinha gente queriam que ele dissesse que ia ganhar.

Quando lhe perguntaram - Ganhamos do Vasco?   - Jair levantou os olhos e viu a figura de Ary Barroso, popularíssimo narrador de rádio e rubro negro fanático.
Ganhamos Jair? – Não sei não – respondeu seu entusiasmo – Se Deus ajudar...

Abatido por causa de certas incompreensões de que se julgava vitima e pessimista por conhecer o poderio do Vasco, Jair estava desanimado principalmente com o técnico do Flamengo, Kanela, que viera do basquete e criara para o jogo uma tática complicada. Ele queria que Jair fizesse um tipo de marcação em Danilo que lhe exigiria uma intensa mobilidade no gramado. Jair não gostava disso, discutiu com Kanela e pediu para não ser escalado. No domingo, porém, voltou atrás e todas suas previsões começaram falhando. O Flamengo fez 2x0 e partiu para uma goleada sobre o imbatível Vasco da Gama. De repente, num ataque rápido, Jair ficou frente a frente com o goleiro Moacir Barbosa, considerado o melhor do Brasil. O que se passou naquele momento ninguém mais conseguiria reconstituir com exatidão. Presença de espírito de Barbosa, que fechou o ângulo?  Nervosismo de Jair?  O fato é que a bola foi para fora. E a partir daí ocorreram duas coisas espantosas: o Flamengo inteiro se encolheu, com Jair se escondendo para trás do grande circulo, e o Vasco iniciou uma fulminante reação, marcando um, dois, três, quatro, cinco gols. Final: Vasco 5x2.

Ary Barroso, transmitindo a partida, não pôde conter sua indignação pelo que via. Aquilo era uma vergonha, algo indigno das tradições rubro negras. Ao microfone, relembrou seu diálogo com Jair na concentração. – “Um covarde” – bradava o locutor, para quem o jogador, depois de sua resposta, de seu gol perdido e de sua omissão, não tinha condições de defender o Flamengo. E incitou a torcida, pelo ar, a queimar a camisa de Jair.

Até morrer, em 1964, Ary Barroso garantiu que a camisa fora queimada. E até enquanto estava vivo, embora detestasse abordar o assunto, Jair afirmava o contrário. A camisa realmente queimada durante a revolta irada dos flamenguistas foi uma camisa qualquer, apanhadas ao acaso para simbolizar o inconformismo  da massa.

Jair ficou inconformado e não poderia continuar no Flamengo nem no Rio de Janeiro. Uma semana depois, se transferiu para o Palmeiras e recomeçou tudo outra vez.


(da Revista Placar)



PERÁCIO

A História tem o sabor das coisas pitorescas da vida de Perácio. Aconteceu num trem, durante a viagem de uma Seleção Carioca para São Paulo, onde se disputaria jogos decisivos do Campeonato Brasileiro. Como geralmente acontecia, a viagem foi noturna. De manhã, um cartola começou a acordar o pessoal: “Vamos pessoal, são 6 horas! Já é dia!

Um a um todos eram despertados, orientados para que procurassem o banheiro antes que a maioria dos passageiros o fizesse, prejudicando o café que a delegação inteira tomava em conjunto. O center-half, também do Botafogo, dividia a poltrona com Perácio. Foi um dos primeiros a correr para lavar o rosto e escovar os dentes. Perácio o secundou. De volta, Martim notou que tinha esquecido a escova de dentes sobre a pia. Correu para o bandeiro, empurrou a porta e surpreendeu Perácio escovando os dentes – justamente com sua escova.
- Perácio, essa escova é minha - gritou Martim espantado.
- Desculpe Martim, pensei que fosse do trem.

O falecido Mario Filho – dono do Jornal dos Sports e autor de várias obras sobre o futebol brasileiro - costumava dizer que era impossível escrever sobre Perácio sem se colocar o humor à frente da bola. Tinha toda razão. De fato, além da lembrança, do chute violento, o que marcou a imagem de Perácio foram suas histórias. Ou as histórias a ele atribuídas. Ele reunia tantos lances engraçados, mistura de humor, ingenuidade e desconhecimento. De poucas letras, comunicativo e alegre como uma criança, Perácio foi sobretudo um ingênou. Uma pessoa que conviveríamos cem anos sem um arranhão na amizade – diziam os amigos mais antigos.

Parte da reportagem de Fausto Neto para a Revista Placar.





HÉLVIO

Acusado de “gaveta”, foi destruído quando ostentava sua melhor forma. Tinha amigos, muitos. As vezes era carregado em triunfo. Enquanto a maré lhe foi favorável era um “Deus” daquela gente. Humildes, vaidosos, ricos e pobres, bancos e pretos tinham nele um ídolo. Pernas compridas, possuindo um físico elogiável, veio do Fluminense para o Santos. Muito cedo ganhou o posto de titular. Mais tarde, também nas seleções paulistas seu nome era obrigatório.

Com o tempo sua sorte mudou. Aqueles mesmos diretores que o carregavam em triunfo, a mesma imprensa que gastou manchetes com suas exibições, a mesma torcida que o adorava, mudaram da noite para o dia.

- “Ele é um gaveteiro. Vendeu tal jogo, Fez dois pênaltis em troca de dinheiro”.
Neste dia estava iniciada sua via crucis. Não teve mais sossego. Mesmo em sua melhor forma foi afastado da equipe. Falamos de Hélvio Peçanha, um dos jogadores mais injustiçados do futebol paulista. Ninguém conseguiu provar se o zagueiro era realmente gaveteiro. Falar, todo mundo falou. Acusar, todo mundo acusou. Provar, ninguém provou. Fizeram com Hélvio uma das maiores injustiças de todos os tempos. Sofreu calado. Deus e aqueles que realmente acreditam no Hélvio, sabem que ele não errou, não se vendeu.

Depois de abandonar o futebol e quando estava descansando em Santos, foi procurado pelo mesmo diretor que tinha lhe acusado naquela tarde exigido sua dispensa do clube da Vila Belmiro, foi procurá-lo para ser treinador para ser o treinador substituto de Filpo Nunes. Hélvio bem que gostaria, mas com aquele diretor, não aceitou.

Mesmo assim, não tenho mágoas de ninguém. Foi taxado de gaveteiro, não era. Sofreu calado essas perseguições e perdoou todos aqueles que lhe fizeram mal.

(Da Gazeta Esportiva).






                                                        RANULFO
                                               
Ranulfo foi um dos mais brilhantes jogadores do América vice-campeão carioca de 1950. Jogando pela meia esquerda, era o termômetro dos americanos.  Pelas brilhantes atuações no campeonato, Ranulfo terminou sendo convocado para a seleção carioca que disputou o campeonato brasileiro de seleções. E Ranulfo foi titular com jogando com Telê. Didi. Ademir e Nivio. Ranulfo Pereira Machado nasceu na Bahia, onde começou jogando pelo Ipiranga. Em 1949 foi contratado pelo América do Rio onde formou com Natalino. Maneco. Dimas e Jorginho, o ataque que levou o América ao vice-campeonato carioca. Na decisão, perdeu para o Vasco da Gama, base da seleção brasileira, por 2x1.

Jogando um belo futebol, começou a ser procurado pela torcida feminina. E Ranulfo conheceu uma mocinha, filha de um grandola que podia levar alguém para a cadeia. O jogador do América fez bobagem, passou dos limites, foi denunciado e preso. Foi um crime de sedução que acabou com sua carreira. Os pais da garota exigiram uma reparação. Ranulfo não tinha certeza de que o filho era seu. A garota era daquelas que saia com todo mundo. O craque resolveu se casar com outra mulher. A mulher que le gostava. E aconteceu a vingança dos pais da garota levada. Veio o processo que começou a mexer com Ranulfo. Sem ambiente no Rio de Janeiro, foi para a Portuguesa de Desportos onde passou apenas três meses. Também passou pelo São Paulo e depois se transferiu para o Noroeste de Bauru no interior paulista. Nesse período que estava ausente do Rio de Janeiro, o processo correu a revelia e Ranulfo terminou sendo condenado pela justiça carioca. Ele confiou nos dirigentes do América que prometeram acompanham o processo e defender seu ex-atleta. Os diretores não cumpriram o prometido e Ranulfo se ferrou. Foi preso e ficou no Sanatório Penal de Bangú.


Cumprindo sua pena, Ranulfo via o tempo demorar a passar. Parecia um pesadelo. Seu bom comportamento fez muitos amigos na penitenciária. Jogava bola, organizava partidas, esperava o tempo de quatro anos passar mais depressa. Um erro com uma pessoa errada fez o futebol carioca perder um grande jogador de futebol.



BARBOSA

Quase cinqüenta anos depois do desastre do maracanã, o goleiro Barbosa ainda convivia com aquele gol de Gighia. Dia 16 de julho de 1950, decisão do mundial. Maracanã lotado. O maior estádio do mundo foi construído para a vitória, estava completamente cheio e pronto para comemorar o titulo de campeão mundial de futebol. Aos trinta e seis minutos do segundo tempo com o resultado de 1x1, veio o lance fatal. Gighia recebeu de Schiafino em profundidade, bate bigode na corrida, e chuta entre Barbosa e a trave. Era o gol do titulo para os uruguaios, o gol do desespero para os brasileiros. A derrota que transformou o dia 16 de julho de 1950, no dia de finados para o nosso futebol. Um lance que marcou para sempre, um dos maiores goleiros da história do futebol brasileiro – Moacir Barbosa.

Para o resto de sua vida, aquela tragédia permaneceu vida na memória de Barbosa. Nunca deixaram que ele apagasse o lance fatal. Duzentos mil torcedores comprimidos no maracanã e a lembrança é todo estádio em silêncio, pessoas imóveis, caladas, tristes, recebendo com espanto e sem acreditar naquele gol que permanece até hoje.

Barbosa foi culpado? Achamos que não. Não se pode culpar um único jogador por uma derrota. Entretanto, a justiça dos torcedores foi cruel no seu veredicto – Barbosa foi condenado por um crime que não cometeu. Ele que estava a pouco menos de dez minutos para se transformar em herói, de repente, passou a ser um eterno e desacreditado vice-campeão. Moacir Barbosa faleceu e levou consigo a mágoa de ter sido crucificado pela opinião publica por um erro que não foi somente seu.





                                                                    MARINHO
                           

Problemas com bebidas também colocaram o ex-craque do Bangu, Marinho, à beira de um precipício no qual ele despencou depois de uma tragédia. Em 1988, seu filho Marlon, de um ano, morreu afogado na piscina da casa. Marinho entrou em uma roda-viva de noitadas que o afastou de tudo que um dia havia importado para ele. “Depois da tragédia morava na minha Mercedes, o porta-malas servia de guarda-roupa, e o banho era de perfume Azzaro. Futebol já não tinha mais valor, os amigos corriam de mim, a família foi embora. Fiquei só” – diz com olhos marejados.

A virada de Marinho, há 16 anos, se deve a um desconhecido. “Um dia, sentei num boteco, às sete da manhã e comecei a chorar, desabafei com o dono. E ele me disse – Meu filho, peque seu carro e vá ver a sua mãe. Conte tudo a ela – Obedeci, nem sei bem o motivo. Minha mãe ouviu tudo calada e me pediu o telefone de Emil Pinheiro (presidente do Botafogo). Eu não ia treinar há muito tempo, mas ele me recebeu de volta. Voltei para os treinos e nunca mais sai”.

Hoje (2005), tem uma vida tranqüila ao lado da segunda mulher, Liza Minelli, e dos filhos, Laís de Minelli, 12 anos e Stevie Wonder, 14 anos jogando no infantil do Botafogo. “Eles têm esses nomes, mas eu, Mario José, é quem sou o artista da família. Sou um cidadão trabalhador, respeitável, mais feliz do que quando tinha dinheiro. Trabalho bebo minha cerveja, durmo e acordo cedo. Meus quatro filhos se orgulham de mim – referindo-se também aos dois do primeiro casamento, Marinho com Priscilla.

Diz que tirou o “diploma da vida” e que orienta os meninos dos juvenis do Bangu, onde trabalha a nove anos. “Digo para eles fazerem o que eu falo, nunca o que fiz. No meu trabalho tento primeiro formar o homem, para só depois treinar o jogador”.

(Da revista placar de 2005)





JURANDIR


Jurandir estava jogador no Ferro Carril na Argentina. Ele comentou como tentaram suborná-lo.
“Certo dia estava pregando fotografias em meu álbum quando bateram à porta. Alguém me esperava lá fora. Encontrei um cavalheiro impecavelmente vestido, falando depressa e com maneiras que demonstravam tratar-se de um vigarista. Ele enrolou a língua durante um bom tempo e, no final pôs as cartas na mesa. Era um torcedor rico do San Lorenzo chamado Martinez e propôs-me o seguinte:  - Dou 7.500 pesos para você amolecer o jogo de domingo. Fiz uma aposta de 15 mil. Se eu ganhar nós repartimos o lucro. Você é brasileiro e o nosso futebol pouco lhe importa. O Ferro Carril pequeno e dois pontos a mais ou menos não fazem diferença e nem lhe trará mais glória. O San Lorenzo precisa da vitória e eu do dinheiro. Você aceita?

Era a conversa de todos os emissários.
E continuou – Além do que você se venderá para seu futuro clube, pois você já está na lista das contratações imprescindíveis do próximo ano. Compreendeu?
- Compreendi...volte as 6 horas da tarde com dois mil e quinhentos pesos. É o sinal para fazer o negócio – O vigarista respondeu: hoje mesmo você terá os dois mil.
- Mal o homem virou as costas corri para o presidente. Contei com todas as minucias a conversa que mantive com aquele vigarista. O presidente ficou possesso, começou a tremar e a mudar de cor e gritou: Esse miserável merece uma bala na cabeça. Vou convocar a diretoria imediatamente...iremos direto a delegacia!
- Na polícia, os repórteres farejaram a coisa e a bomba deveria estourar naquele dia mesmo. Foi um escândalo dos diabos. Às 6 horas chegamos à pensão. Disfarçadamente vieram os repórteres, diretores e dez “tiras”. Era uma quinta feira, três dias antes do jogo. A dona da pensão desesperada com tamanho aparato bélico começou a pedir pelo amor de Deus para que todos abandonassem, a casa, pois isso ia arruinar a reputação do estabelecimento. O homem não apareceu. Escondera-se por perto quando viu o movimento, fugiu. Dez minutos depois telefonava:
 - Você quis me trair, mas não teve sorte. Sou mais esperto do que você. Perderá o jogo, o dinheiro e não me prenderá. Trouxa! Sei onde você e vou dar uma surra. Faço parte de uma quadrilha. Vamos lhe arrebentar.

Se eu já era querido, depois destes acontecimentos a simpatia dos argentinos transformou-se numa quase idolatria. Agora, era respeitado não apenas como profissional, mas como homem também. Domingo chegou. O jogo também. Estava nervoso e assustado com as ameaças do bandido. O San Lorenzo espremeu o nosso quadro dentro da área e o jogo terminou em zero a zero. Fiz uma grande partida. Foi a minha consagração no futebol argentino.

(Memórias do Jurandir - da Gazeta Esportiva de São Paulo).



                                                                BIGUA E O TRI CARIOCA DE 1944

Quando estava vivo, o craque Biguá do Flamengo relembrou a conquista do tri campeonato de 1944. Aqui está o relato do antigo jogador do Mengo.

Foi a maior emoção que tive como jogador do Flamengo. Nosso time ficou desfalcado durante toda a campanha do tri de seu maior jogador, o Domingos da Guia. Aliás, Domingos foi o maior jogador de futebol da sua época. Ele jogou conosco em 1942 e 1943, mas no ano seguinte foi para o Corinthians. O time sentiu muito a sua falta. Afinal era a nossa peça mais importante. Em seu lugar entrou Quirino, que procurou dar tudo de si para que ninguém sentisse a falta do grande Domingos da Guia. Mas não era a mesma coisa. Nosso técnico, Flavio Costa, costuma chamar o Quirino e dizer que ele podia jogar igual ao Domingos, bastava querer. O rapaz ficava empolgado e às vezes, até surpreendia, tal a sua vontade de vencer. Naquele ano, além de Domingos, o time ficou desfalcado de Perácio, que foi para a guerra. No seu lugar entrou Tião. Mas, da mesma forma que o Quirino não substituía bem o Domingos, o Tião não era igual ao Perácio.

      A partida decisiva pelo tri campeonato foi contra o Vasco, na Gávea. Ganhamos de 1x0, no peito e na raça. Quando ninguém mais acreditava no titulo, eis que os jogadores se superaram e arrancaram o tri campeonato histórico para as cores rubros negros. Foi uma conquista memorável. O time do Vasco era superior ao nosso e estava completo. Mas nós tínhamos a vantagem de jogar em casa, onde dificilmente perdíamos. Prá falar a verdade esse era o nosso único ponto positivo e nós não podíamos deixar escapar um titulo tão importante, dentro do nosso terreno. Entramos em campo certos de que enfrentaríamos uma batalha dura, mas sabíamos também que cada um de nós daria o máximo para chegar a vitória. A vitória de 1x0, gol de Valido, foi contestado pelos vascaínos. Para o Flamengo o que interessava é que conquistamos o tri campeonato carioca em 1944 e aquele dia se tornou um dia de glória para os jogadores da Gávea. Foi um titulo muito importante e um dia muito especial na minha carreira – concluiu Biguá.

(da Manchete Esportiva)



    





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