OS CRAQUE E SUAS HISTÓRIAS
O TEMPO PRESENTE É O MOMENTO DE
REVER O PASSADO E CONSTRUIR O PRESENTE.
OS CRAQUES E SUAS HISTÓRIAS.
Mário Américo e Zito.
Nessa altura a bola já estava com Paulo Machado de Carvalho.
O quem importa, mesmo,
é que o relato seja fiel e revele aspectos ainda inéditos. A novela da bola do
último jogo, por exemplo, Mário Américo contra:
- Até que a ideia não
foi minha. Quem me chamou para um canto e fez o pedido foi o dr. Paulo Machado
de Carvalho.
Assim: Mário, o Brasil
vai ganhar o jogo amanhã com a Suécia. Eu quero e faço questão que a bola fique
conosco.
- Decidi no mesmo
instante, já empolgada, que apanharia a bola da vitória custe o que custasse.
Primeiro, porque se tratava de um pedido especialíssimo do dr. Paulo Machado,
home bom e meu chefe. Depois, porque sempre considerei a bola do jogo o maior
troféu do triunfo. Lembro-me bem: quando faltavam dois minutos para terminar a
partida, corri para dentro do campo para socorrer Pelé, contundido após p
quinto gol do Brasil. E pedi a Belini, e pedi a Zagalo, que apanhasse a bola e
jogassem para mim, mal o jogo terminasse. Não deu tempo, porém, Mr. Guigue
apitou o fim do jogo e meteu a bola debaixo do braço. Resolvi então tomar a
bola na raça, disposto a tudo, inclusive a investir às cabeçadas contra quem
tentasse me travar na corrida para o vestiário. Entretanto, chorando, apenas os
jornalistas e locutores tentaram abraçar-me. Pedi paciência: primeiro tinha que
esconder a bola no vestiário. Depois, sim, eu viria a chorar com eles a alegria
de campeão do mundo.2
BIGODE
Bigode, foi um os mais
criticados da final da Copa do Mundo de 1950, conta a Copa com ele foi.
- Naturalmente que tudo
correndo mais azul do que prevíamos, o jogo do Brasil contra os uruguaios era apenas
como uma espécie da festa do encerramento. Fomos posto das mais sórdidas
campanhas políticas e publicitária. Vários candidatos a postos eletivos
começaram a demagogia. Ás agências de publicidade cercavam-nos a fim de que
posássemos, aconselhar esse ou aquele refrigerante. Os mais eufóricos
entregaram-se totalmente. Eu não estava entre eles. Quem me conhece percebe o
meu modo de ser geralmente pacato. Numa festa desse alcance não poderia faltar
uma missa solene. As seis horas da manhã de domingo, dia do jogo, fomos (por
imposição do alto comando) à missa dos barbadinhos (secretamente). Tudo pronto
para a festa. Faltando duas horas para enfrentarmos os uruguaios, fui advertido
de que não jogasse muito pesado. Acatei as ordens, muito embora acreditasse que
não seria tão fácil o jogo. Havia um homem que eu temia: Júlio Perez, conhecia
todo seu maravilhoso futebol. Quando começou o jogo, numa disputa de bola com
esse atacante “fui duro”. Nessa ocasião aconteceu a tal “bofetada” de Obdúlio.
Na realidade ele tocou-me no pescoço e disse: “tche muchacho, vá com calma”.
Zizinho e Ademir correram “calma Bigode, não precisa fazer isso”. Fiquei entre
Gighia e Júlio Perez, no lance do gol, essa a minha posição. Bola de Obdúlio a
Gighia, esse apertado por mim devolve a Júlio Perez. O atacante uruguaio um
verdadeiro craque, devolveu a bola pelo alto, em profundidade, no que vocês
chamam de espaço vazio. Esse lance foi no meio do campo. Quem atacou o Gighia
até o gol? Quem me deu cobertura? Mesmo assim, o ponteiro percebendo minha
aproximação chutou. Senti que seu pé chutou um pedaço de grama. O enorme
silêncio do estádio disse tudo. O único homem a recriminar minha conduta foi
Juvenal. Atleta sem compostura, não teve outras palavras: ”olha aí seu Bigode,
essas vaias são para você”...Perdi 5 quilos em uma semana, não saia, não comia,
não dormia. Uma semana depois joguei no mesmo Maracanã contra o Bangu. E se não
tenho a coragem que Deus me deu, jamais jogaria cinco anos após aquele
fracasso. Voltei ao Fluminense e lá terminei meus dias”.
Silva e o gol salvo pelo massagista
Silva continua sendo o maior
ponteiro esquerdo da história do futebol alagoano em todos os tempos. Ponta
ofensivo, Silva é o maior artilheiro dos clássicos – CRB x CRB - Ele foi um dos personagens daquele lance
polêmico de 1976. Passados tantos, Silva diz que o lance não sai da sua cabeça.
“O massagista Castanha estava
junto a trave do CSA para passar um recado do seu treinador para o goleiro
Paulo Cesar. Talvez por isso, o Paulo tenha se atrapalhado e saiu mal na bola
cruzada da direita. Eu vinha fechando na diagonal e, de cabeça, mandei para o
gol vazio. Tinha tanta certeza do gol que virei para o meio do campo afim de
receber os abraços dos companheiros. De repente vejo a bola passar por mim em
direção ao meio do campo. Quando senti que o Castanha não permitiu que a boa
entrasse no gol do CSA e saiu correndo em direção ao túnel azulino, eu fui
atrás, mas não consegui alcança-lo. Se eu pego o Castanha e ter a maior
confusão”.
Silva chega a se divertir com
as comédias do Castanha nos campos de futebol.
“O jogo estava no seu final.
Para nós somente a vitória interessava. O jogo estava 1x1 e o lance comentado
seria o gol da vitória e o titulo de campeão do primeiro turno. Os jogadores do
CRB e sua torcida estavam revoltados com a atitude do massagista do CSA. Resultado:
o Castanha salvou o gol. O juiz marcou o que tinha que marcar e nós ficamos no
prejuízo.”.
Fleitas Solich e Dida.
DECISÃO DO CAMPEONATO DE 1955
FLAMENGO 4 x AMÉRICA 1
Fletas Solich explicou
os 4x1, assim.
– Joguei uma cartada perigosa, confesso,
quando lancei Servilho e Dida tirando Jadir e Paulinho. Entretanto, para o jogo
que pretendia fazer, precisava dessas alterações. Não porque os entraram fossem
melhores do que os que saíram. Mas, simplesmente. Porque se adaptavam melhor a
tática visada. Por isso, arrisquei.
- Servilho teve uma missão anular: anular Leônidas. Anulou. Dida entrou para
puxar a linha com sua ligeireza, para arrematar, para tontear a defesa
adversária com seu jogo leve e esfuziante. Cumpriu a tarefa. Tanto que foi o
artilheiro da partida. Procurei
fortalecer a defesa da área tanto quando possível. Tanto na zona central.
Depois nas laterais. O bloqueio maciço tinha um objetivo: impedir os arremates
à queima roupa. Deu certo: o América não chutou uma vez de perto. O próprio gol
do Romeiro foi feito de fora da área.
- Com o recuo de Zagalo
(às vezes) e Duca, para o trabalho de meia cancha com Dequinha foi previsto.
Assim, a partir da intermediária num espaço nunca maior que dez metros, sempre
com um homem, Servilho, Dequinha, Duca, Joel ou Zagalo. Era uma linha imaginária
de ligação, em ziguezague. Era, também, o caminho que a bola devia seguir. E
por ali, ela trafegou muitas vezes. Quando Alarcon saiu, infelizmente para o
América, machucou-se, mantive o mesmo jogo. Se bem que a defesa tivesse mais
desafogada. Procurei, então explorar Helio, cuja missão dobrou dentro da
partida. Além do mais era o lado que devis ser explorado. Porque Rubens também
avançava, fazendo parte do vai e vem que caberia, talvez, a Alarcon, depois
Romeiro. Com o zagueiro na frente, Evaristo ficou muitas vezes a vontade. Por
isso, que em quase todas as pontadas do nosso do nosso ataque levamos perigo ao
reduto contrário. O América foi um, adversário que nunca se entregou.
ALARCON
Aconteceu na negra
entre Flamengo e América, pe3la decisão do campeonato carioca de 1955.
Disputando uma bola com Tomires, Alarcon caiu e ficou batido na cancha. Ainda
fez ato de presença durante alguns minutos, e só mais tarde seu a devida
importância ao caso, porque só mais tarde se soube que Alarcon tinha sofrido
uma contusão grave, tão grave que, segundo os primeiros diagnósticos,
dificilmente voltaria a jogar futebol em sua vida.
Hoje, correndo,
driblando e chutando Alarcon abre-se num riso que mostra todos os dentes que
Deus lhe deu, e diz:
- Nasci outra vez para
o futebol. Porque tanto disseram pelos jornais, tantas vezes as estações de
rádio repetiram, que acabei por me convencer que era um caso perdido. Um
aleijado para o futebol. Felizmente, com o correr do tempo, reagi bem, saindo
de um estado de depressão quase mórbido, que deu lugar a uma vontade de ferro
de voltar a jogar, custasse o que custasse. E custou muito mesmo.
Enquanto a medicina
estudava o caso de Alarcon, os mexericos cresciam. Assegurava-se, por exemplo,
que Alarcon, a partir do dia do acidente, devotava um ódio sem nome a Tomires.
E diziam mais, diziam que, contorcendo-se em dores no vestiário, enquanto era
medicado, Alarcom teria levantado as mãos para os céus, para maldizer e marcar
Tomires até o fim do mundo. A praga, segundo os ouvintes interessados em
alimentar ódios, teria sido feita nos seguintes termos:
- Viverei para ver uma
perna de Tomires apodrecer.
E Alarcom, com a maior
simplicidade, põe o preto no branco.
- Não sei, com
franqueza, se teria coragem de lançar uma praga assim. A verdade, porém, é que
não tive qualquer pensamento mau para Tomires. Explico: não podia regar praga a
Tomires, porque, para mim, Tomires não teve culpa no acidente que, por pouco me
afastou definitivamente do futebol. Na dúvida, sofri como se tivesse amputado o
pé. Minha vida está nos pés, que uso para jogar o futebol, enquanto tiver
mocidade para correr e lutar durante 90 minutos.
Reportagem de Paulo
Rodrigues para a Manchete Esportiva de 1957.
1956 - JOGO DA INAUGURAÇÃO DO ESTÁDIO DE PRÓPRIA.
Em 1956, o Clube de Regatas Brasil foi jogar amistosamente
na cidade sergipana de Própria. Lá aconteceu um fato que somente no submundo do
futebol pode acontecer. Vamos contar esta história em duas versões. O árbitro
Louvain Ayres e o jogador Paulo Patriota, em depoimentos ao Museu dos Esportes,
contaram como tudo aconteceu.
O futebol de Própria estava
parado a muito tempo. Para comemorar o retorno do esporte das multidões aos
gramados daquela cidade, seus dirigentes convidaram o Clube de Regatas Brasil
para um amistoso. Na delegação alagoana seguiu o árbitro da Federação Alagoana
de Desportos, Louvain Ayres. Os alagoanos ficaram hospedados no Hotel de Porto
Real do Colégio, no outro lado do rio.
Paulo Patriota, um dos grandes
jogadores do futebol alagoano e fazia parte do time regateano. Ele contou sua
versão. Antes do jogo, o árbitro Louvain Ayres, chamou os dois times e avisou:
“a cidade está preparando uma grande
festa e o ideal seria que a partida terminasse empatada. É um amistoso, e
assim, todos ganhariam e a festa seria completa”. O time do CRB era muito
superior em tudo. Logo depois da saída, um ataque fulminante dos alagoanos que
terminou com um gol de Paulo Patriota. Louvain Ayres chamou o artilheiro e
pediu para ele não fazer mais aquilo porque senão teria que expulsá-lo. Paulo
não levou a sério a advertência e o jogo continuou. Um pouco mais e novo gol de
Paulo Patriota. O árbitro anulou o gol indicando um impedimento que não houve.
Paulo reclamou e foi expulso de campo. O atacante saiu aborrecido e ficou no
banco com seus companheiros.
O jogo continuou e o marcador não
saía de 1x0. O CRB mudava todos seus titulares, inclusive, colocando um goleiro
totalmente inexperiente. O time do Própria era muito ruim e não conseguia
empatar, mesmo com o auxilio do árbitro. No finalzinho do jogo, Louvain Ayres
marcou um penalti contra o CRB. Uma bola atrasada para o goleiro, um encontrão
com um atacante do Própria, e penalidade máxima. Na cobrança, o jogador
sergipano chutou em cima do goleiro alagoano. O árbitro mandou cobrar novamente
alegando que o goleiro se mexeu. O tempo já estava escurecendo e a visibilidade
não era boa. Mas, afinal a bola entrou, e com o resultado de 1x1, tudo ficou em
paz.
Na festa, realizada a noite,
todos estavam satisfeitos, menos Paulo Patriota. No jogo, foi expulso. Na
festa, quando um dirigentes do CRB distribuía um envelope para cada jogador
como prêmio para os jogadores do clube que participaram da partida, veio a
surpresa. Seu prêmio veio pela metade. Indagando ao dirigente alvi rubro o
porque daquela discriminação, teve a seguinte resposta – “quem mandou você fazer gols ? “. Foi
quando Paulo percebeu tudo. Não ganharam todos. Apenas alguns. Até os
dirigentes do CRB tinham apostado contra seu próprio clube. Como Paulo começou
a reclamar em voz alta, os diretores o colocaram numa lancha e o mandaram de
volta para o Hotel que ficava no outro lado do rio.
Estourou como uma bomba: “Leônidas da Silva acaba de constituir advogado, a fim de processar Niginho, contra declarações partidas do antigo jogador do Vasco da Gama. Niginho será levado às barras do tribunal”.
A reportagem da Revista
Manchete Esportiva procurou ouvir Niginho. Ele não disfarçava o seu
descontentamento. Foi logo dizendo:
- Fui envolvido, não
deliberadamente, creio, em uma teia de inverdades de um repórter que, levando
para sua revista declarações minhas, fê-lo de modo deturpado.
Você afirmou que
Leônidas havia se vendido a elementos de influência do futebol italiano,
interessados na conquista, pela Itália, da Copa do Mundo de 1938?
- Nunca faria tal
afirmação. Inicialmente por não ser do meu feitio acusar, sem provas. Segundo:
sou filho de italianos, joguei na Itália, tenho pelo povo italiano uma grande
admiração e nunca partiria de mim palavras que viessem empanar o brilho da
conquista da Copa do Mundo de 38. O que afirmei e reafirmo, é que o ambiente
para nós, componentes da Seleção brasileira, era tão inseguro que até mesmo
insinuações de suborno existiam, mormente contra Leônidas, cujo contusão,
alegada às vésperas do jogo Brasil e Itália, mereceu restrições, foi alvo de
desconfiança, aumentadas quando o “Diamante” se fez presente dois dias após
contra a Suécia. Apenas isto.
E o caso do penalti de
Domingos?
- Afirmei e volto a
afirmar, pois o fato é notório, que o pênalti sobre Piola poderia ser evitado,
caso Domingos houvesse sido menos precipitado. Disse que, atualmente, não
acredito que Domingos fizesse o que fez. Faltou ao grande zagueiro maior dose
de experiência. Investiu sobre Piola, dando-lhe um pontapé, sem bola, reagindo
contra provocações do “peninsular”.
Leônidas afirma que
nunca falsificou certificado de reservista, por você afirmado.
- Em absoluto. Nada
tenho com a vida particular de Leônidas. Se ele falsificou ou deixou de
falsificar, isto é, com ele. Não fui eu quem afirmou tal fato. O repórter dev
ser ouvido de outras pessoas.
Finalmente, que questão
é esta de senhoras presentes à delegação brasileira e que foram motivos de
desentendimentos?
- Afirmei que muita
coisa desagradável surgiria em Buenos Ayres e na França, por ocasião dos
certames Sul Americano de 36 e Mundial de 38, como por exemplo a tentativa de
agressão do Bahia no Castelo Branco, bebedeiras, farras etc., fatos não
contados por mim, mas por vários outros jogadores da seleção, entre eles o
Hércules em recente reportagem inserida em Manchete Esportiva. Disse mas não
citei nome, que determinada esposa era pivô de desentendimentos, mas fiz
questão de não declinar o nome. Surgiu o nome da esposa de Leônidas. Não me
responsabilizarei por um erro que não cometi. A esposa de Leônidas nem mesmo
foi a Europa.
E encerrou.
- Lamento, reafirmo, os
rumos tomados pela entrevista por mim concedida, mas não temo Leônidas. Creio
mesmo que ele está coberto de razões. Não o temo, por não ter culpa no
cartório. Não me responsabilizarei por acusações que não partiram de mim. Se
levado a depor, reafirmarei o que disse. Minha consciência está tranquila e
agradeço a Manchete Esportiva pela oportunidade a mim concedida.
PINHEIRO.
As más línguas pegaram
Pinheiro de “sola”. E pintaram Pinheiro como um verdadeiro alcoólatra e carne
com bebida. Pelo que se dizia, Pinheiro ia de mal a pior, ameaçada de sucumbir
de uma outra para outra, arrasado pelo “delirium tremens”. Torturado pelas visões
de pesadelos, perseguido por dragões trespassando portas; de morcegos saindo do
teto rasgando ratos pelo ventre; de serpentes que não lhe saiam, aos pedaços
pela boca. E liquidavam, de maneira irreponsável, pelo disse-me disse, um jovem
craque que era bom de coração e cuja cabeça era boa, apenas um tanto ou quando
criança. Eis, porém, que Pinheiro acorda para a vida, chocado com o mundo que o
maltratava tanto, a ponto de prestar falso testemunho, de acusá-lo na má-fé,
pelo simples prazer de acusá-lo. Não bebera quando foi projetado do carro, mas
tal constou até que o exame médico o absolveu. Não era amigo unha de carne da
bebida, mas tal constou até que o Fluminense, padrão de disciplina, se
convenceu que Pinheiro era um ótimo rapaz e se convenceu que podia confiar
mesmo nele, sem reservas. E Pinheiro, justiça seja feita, parou na hora exata.
E, hoje, eleito por Silvio Pirilo, o guia da equipe tricolor. O “capitão” que
deve servir como exemplo e de modelo, para a geração atual e futura.
Evidentemente, tal prova de confiança sensibilizou o craque. A propósito,
Pinheiro faz as seguintes considerações:
Talvez eu não levasse o
futebol a sério. Entretanto, exageravam os meus defeitos e, sobretudo, os meus
vícios. Se eu tivesse me atolado em vícios, como diziam, nada me salvaria. Já
não teria fígado, não teria coração e estaria com os nervos irremediávelmente
em frangalhos. E quem, em sã consciência, pode admitir que eu não tenho bom
fígado, que não tenho bom coração? Quem treme, treme e não bate pênalti. Ou
bate e não acerta um. Mas tive pernas e tive nervos, quando cobrei,
alternadamente, nada menos de doze penalidades máximas no Torneio Início. Se eu
tivesse me atolado em vícios, como dizem, que restaria de mim, senão ruínas
sobre ruínas? Eu estaria, hoje, aos vinte e poucos anos de idade, decrépito para
o futebol e para a vida. Mas, graças a Deus, não me falta caráter, não me falta
brio. Tenho lutado muito para fazer uma carreira brilhante. Muitas vezes fui
útil ao Fluminense, muitas vezes útil ao futebol brasileiro. E de todos os
prêmios que recebi, nenhum me deixou tão sensibilizado como esse dado por
Sílvio Pirilo, designando a mim o “capitão” do time o Fluminense. Confesso:
fiz, como qualquer rapaz, as minhas extravagâncias, pode ser que tenha
exagerado, às vezes. De qualquer modo, fui bastante sensato para não insistir:
risquei a boêmia do meu caderno. Meu destino está ligado ao futebol, para o bem
ou para o mal. Não abusarei da sorte que Deus me deu. Sou profissional sei que
a carreia é curta, e não posso pensar e nem posso só em mim. , há maus irmãos e
há minha mãe, a quem tanto devo.
GENTIL CARDOSO.
- O técnico Gentil Cardoso começou
perguntando –
- Você sabe o que aconteceu comigo?
- Você conhece o fato,
mas ignora o que senti. Não basta que você imagine. É preciso que eu diga.
Ponha-se no meu lugar. Imagine-se levantando um campeonato. É claro que o tão
esforço bem sucedido não foi de um só. Cada vitória, em futebol, traduz um efeito
coletivo. Por outras palavras: a vitória veio porque a equipe funcionou. Seja
como for, porém, eu era o técnico campeão. Agora eu pergunto – Como me
trataram? Fui posto no olha da rua, sumariamente, despedido sem mais sem mais
aquela, para quer em meu lugar entrasse outro técnico. Ora, eu podia afetar uma
superioridade que seria na verdade que seria, na verdade, hiprocrisia. Prefiro,
porém, confessar humanamente que sofri, então minha grande decepção.
Você é ressentido do
Vasco?
- Do Vasco?
Absolutamente! Afinal de contas os homens passam e o Vasco continua. E de
resto, mesmo no momento em que recebi o prêmio da demissão, fui consagrado pelo
quadro social e por toda torcida cruzmaltina. Creio muito na multidão. E por
isso, não posso riscar de minha história individual o tempo que passe em São
Januário.
Você tem algum ódio?
- Nunca e Deus me
livre! Ódio por que? E de quem? Eu teria vergonha de mim mesmo no dia em que
odiasse alguém. Prefiro milhões de vezes o amor. Não se pode ser técnico, não
se pode dirigir um time sem grande amor ao próprio ofício, à própria função.
Falei do Fluminense, falei do Vasco, clubes que tiveram todo o meu entusiasmo,
todo o meu devotamento.
CANHOTEIRO
Canhoteiro era um
ponteiro de verdade. Sabia ir a linha de fundo para um cruzamento e entrar
enviesado pelo meio da área, batendo forte para o gol adversário. Driblava bem,
e tinha um excelente preparo físico que lhe permitia fazer tudo isso. Era um
futebol inteligente e criativo.
Agnaldo Berenguer veio
de Recife para o nosso futebol se integrou ao plantel do Estivadores e chegou a
ser vice-campeão alagoano em 1963. Era uma grande equipe onde Canhoteiro
aparecia como uma de suas grandes estrelas. Depois, foi contratado pelo CSA,
onde continuou jogando um grande futebol e, se tornando campeão várias vezes.
Não demorou muito para ser observado pelos grandes clubes do Nordeste. O grande
passo na sua carreira de jogador profissional foi sua ida para o Esporte Clube
Bahia. No tricolor da Boa Terra se tornou ídolo, foi muitas vezes campeão,
ganhou muito dinheiro e que poderia lhe oferecer uma vida tranquilo no futuro.
Ainda jogou pelo América do Rio sem muito brilho.
Canhoteiro nunca nos
pareceu um jogador ajuizado. Sempre gastava tudo ou quase tudo que ganhava. Sem
estudos nem visão dos negócios que chegou a possuir, foi aos poucos perdendo
controle da situação. Nesse negócio não há luvas, gratificações nem ordenados
compensadores. A vida de rei que levava quando jogava futebol, acabou. A vida
de Canhoteiro mudou e ele sentiu que não estava preparado para os novos
caminhos que teria de seguir. Problemas familiares surgiram e ele terminou
perdendo o pouco que tinha. Começou a beber e chegou ao fundo do poço. Graças a
Deus ele encontrou um amigo que o levou para uma Associação e terminou o
libertando da bebida. Recuperado, ele vive em Recife de bem com a vida.
Este é mais um exemplo
para os novos jogadores profissionais. Procurem estudar, se preparar para
quando deixar o futebol não sentirem i impacto da mudança. Muito só pensam no
futebol como uma profissão de grandes oportunidades, onde em cada esquina
existe uma fortuna a espera de quem possa apanhá-la. Mas, esquecem que o
destino fica espreitando os jogadores a espera de uma chance para ceifar, de um
só golpe, todos seus belos sonhos de atleta.
NILTON SANTOS
Nilton Santos s despede
da Seleção Brasileira.
Em 1959, depois do jogo
Brasil 2 x Inglaterra 0, no Maracanã, ainda no vestiário, Nilton Santos
comentou:
- Este foi meu último
jogado defendendo a camisa do Brasil. Fiz uma promessa que depois da Copa não
atuaria mais. Quebrei minha jura e quase quebrei minha perna. Não sou um homem
de grande experiência mas a quem eu consegui já me aconselhou a parar.
Mas você acha que
acabou?
- Justamente porque
ainda não acabei é que eu acho que devo parar. Um jogador que se respeita, ou
que respeita seu passado esportivo deve sair de campo aplaudido. Em um clube é
diferente, já há um entrosamento natural, já se pode pensar em termos de clube,
diria bem se eu disse assim. No Botafogo e ao Botafogo eu acho que poderia ser
útil mais uns três anos.
Decidido que este será
o último jogo com a camisa do Brasil?
- Tudo diz sim. Não se
trata de má vontade, o duro é que eu queria ter vontade, queria ser o primeiro
a manifestar essa vontade, mas, infelizmente, só tenho mesmo é pena de não ter
vontade. Não são dois nem três, porém dez anos de treino, dez anos de jogo, dez
anos atrás de uma bola, num trabalho insano, milhares de vezes repetido. Com
licença da palavra, amigos, isso é demais, isso enche. Sim; de longe em longe me dão férias. E que faço nessas
férias? Para variar me oferecem um Sul Americano Extra, um Torneio em Caracas,
e até pela “Cortina de Ferro” fui levado, para mudar de cenário. DE vida, não.
São dez anos correndo atrás de um homem (o homem que devo marcar, lógico), são
dez anos dando umas escapadas para ver se faço um gol (as vezes faça), são dez
anos a explicar por que vencemos, por que perdemos. Era para perder a voz, para
perder a cabeça, mas, depois desses dez anos, estou mesmo é sem pernas.
Esclareça-se a tempo:
Santos não faz “blague”. Fala sério, sério realmente, mas para soturno, quase
sinistro. E num tom de voz mais cavernoso, bate no peito e mostrar o que salta
à vista:
- Reparem: ossos sobre
ossos. O peso, a falta de sorte que levei nas costas, no Botafogo, durante nove
anos, se foi. Mas também o peso do meu esqueleto, o peso que a balança acusa,
este está por baixo. Perdi três quilos e não consigo recuperar esses três
quilos. Sem vontade, sem peso, vamos e venhamos, fica difícil jogar bem. Sou
bem um espelho do futebol brasileiro. Arranca-se, do jogador, até a última gota
de suor, durante anos e anos. Depois se estranha que ele vá para um campeonato
mundial cheio de bola até o pescoço. Um molambo de craque que, estafado por
campanhas ininterruptas e intermináveis. Como qualquer jogador, considero uma
honra vestir e lutar pela camisa que representa o futebol brasileiro. Nas seria
justo que me poupassem, a mim e todos os outros, para mim todos os outros que
fossemos – isto é vital – babando pelo caminho com fome de bola. Quem pensa
disso, porém? Depois falam de tremedeira, pernas bambas, jogadores que caem à
toa.
Observação nossa:
Nilton Santos, quebrou a promessa e ainda jogou a Copa do Mundo de 1962.
Parte da reportagem de
Paulo Rodrigues para a Revista Manchete.
BIGUÁ
E seu amor pelo Flamengo.
Nunca na história do
futebol carioca, houve tanta identidade entre torcida e jogador, como é o caso
de Biguá. Um lance célebre como exemplo dessa paixão coletiva por um jogador.
- No segundo turno, em
1945, jogando contra o Vasco, em São Januário, estava 1x1 e eu marquei um gol contra. Lelé acertou um
tremendo chute na trave, eu já havia saltado, tentando desviar para corner, ao
mesmo tempo que tentava impedir um avanço de Chico. Quando me virei para ver o
que aconteceu, a bola bateu na minha cabeça, encobriu Luís Borracha e entrou. O
Vaso venceu por 2x1 e o Flamengo perdeu o que seria o seu tetracampeonato.
Abatido, Biguá esperava
no vestiário que o estádio se esvaziasse, quando apareceu o escritor José Lins
do Rêgo, imortal autor do romance “Menino de Engenho”, torcedor fanático do
Flamengo, que o convenceu a sair ao encontro dos torcedores.
- Saí para aruá
acompanhado do Zé Lina e senti que mãos me seguravam por trás. Palavra que não
via nada. Senti meu corpo erguido, enquanto gritavam meu nome.
Bria, velho amigo e
companheiro de Biguá na famosa linha média Biguá. Bria e Jayme, ainda se
emociona, quando se lembra daquele jogo em 1945.:
- Ele sempre foi um
jogador sensacional, mas naquele jogo, não sei por que, estava se superando.
Defendia e atacada, queria vencer de qualquer maneira e aconteceu de marcar um
gol contra. Para ele, aquilo soou como uma tragédia. E depois a torcida o
recebeu com festa, como um herói. É inacreditável.
Parte da reportagem do
jornalista Aristélio Andrade para a Revista Placar.
ADEMIR NOS BRAÇOS DA TORCIDA DO VASCO
DEPOIS DO CAMPEONATO DE 1945
Não foi só bola, jogo,
gol. Ademir era quase um semideus no seu tempo. Pode perguntar a qualquer
Ademir de tal que você encontra. Se tiver uns vinte e poucos anos, garanto que
o pai dele é torcedor do Vasco. Ou fanático pela seleção.
- Teve um torcedor que
me chamou para batizar o filho em 1946. Fui lá e batizei. Ademir, é claro. Uma
semana depois fui para o Fluminense. Apareceu o tal torcedor: “Quero
desbatizar, você traiu o Vasco”.
E mudou mesmo o nome do
garoto. Um ano depois, quando voltei ao Vasco, não é que o torcedor foi me
procurar para batizar der novo o mesmo garoto. Mass aí eu não topei mais. Em meio às memórias lamentáveis de 1950,
Ademir, um mês atrás, foi despertado por um episódio feliz.
- Um garoto vascaíno ia
ser operado na época da Copa. Mas, gritava muito, dizendo que só aceitava se
falasse comigo antes. Me buscaram lá na Casa das Pedras. Fui ao hospital,
brinquei um pouco com ele. Mais calmo, foi operado e curou-se. Há um mês, eu
estava andando pela cidade, e um rapaz alto, forte, me pAra e me convida para
um café. Era mesmo, não é preciso dizer. Hoje, é um bem sucedido engenheiro.
Parte da entrevista de
Teixeira Heizer pata a Revista Placar.
ARY BARROSO
O NARRADOR DA RÁDIO TUPI DO RIO DE JANEIRO
Ary Barroso foi um craque como narrador de futebol no rádio carioca.
Primeira parte.
A rádio Mayrink Veiga
tinha adquirido a exclusividade da transmissão dos jogos do Campeonato Sul
Americano de 1942, a ser realizado em Montevidéu. Com isso não se conformara
Ary Barroso. Preparando cuidadosamente um plano, que foi levado à apreciação do
Dr. Assis Chateaubriand. O chefe dos “Associados” apoiou a ideia com
entusiasmo, pois a Tupi não podia ser passada para trás. E trabalharam para
vender, por preço altíssimo na época, a transmissão do jogo Brasil x Argentina,
de grande importância no campeonato. Certos dirigentes da emissora de que Ary
daria um jeito de irradiar esse jogo. Como deu.
Para Montevidéu, pelo
avião dos “Diários Associados”, o “Raposo Tavares”, seguiram Ary, João Gaspary
e o dirigente da Tupi, Teófilo de Barros. Na capital uruguaia tentaram, de
todos os modos, conseguir permissão para transmitir o jogo. Até no telhado do
Hospital das Clinicas, situado perto do campo de futebol, pensaram em montar a
instalação da Tupi. O Oduvaldo Cozzi , que iria irradiar para a rádio Mayrink
Veiga, soube w interditou o local. Depois conseguiram com o diretor da Rádio
Nacional de Montevidéu, a cessão de um canal. Mas a turma da rádio Mayrink
Veiga movimentou-se novamente e barrou-lhes os passos. E para a que a Tupi não
tentasse com nova jogada, requereram uma cominatória contra o estádio, contra a
Federação Uruguaia de Futebol e contra a Cia. de Telégrafos e Rádio
Comunicações para evitar que furassem o bloqueio.
Não havia outra
solução. Ary Barroso, de acordo com seus companheiros, resolveu botar seu plano
em execução. Sem que ninguém soubesse viajaram para Buenos Ayres. E nesta
cidade conseguiram com um velho amigo das “Associadas”, dono da “Casa Brasil”,
um apartamento emprestado. Faltava-lhes, porém, obter uma linha que ligasse
esse apartamento ao nosso país. Foram ao Telégrafos local. Mas o diretor
argentino estranhou:
- Transmitir de Buenos
Ares jogos que estão se realizado em Montevidéu? Não estou entendendo...
Teófilo de Barros veio
com uma explicação:
- Não vamos
propriamente transmitir os jogos. Daremos apenas algumas informações. Chegamos
tarde a Montevidéu e todas as linhas estavam ocupadas. Vamos ouvir as notícias
que nos vêm de Montevidéu e enviá-las daqui para os nossos jornais.
A explicação foi
convincente e eles saíram do gabinete do homenzinho com a autorização. Foi essa
linha que, na palavra experimentada de Ary Barroo, trouxe para o Brasil todos
os lances do jogo Brasil x Argentina realizado em Montevidéu, nossa terceira
partida naquele Sul Americano.
Continua.
Ary Barroso foi um
craque como narrador de futebol no rádio carioca.
Conclusão. Ele aparece na foto ao lado da cantora Angêla Maria outra fanática torcedora do Flamengo comemorando o tri campeonato de 1955.
Vejamos como isso foi
possível. Ary e seus companheiros eram hóspedes do mesmo hotel onde estavam
instalados todos os outros locutores, jornalistas, juízes, etc. Na manhã do jogo
encontravam-se em Montevidéu, tomando tranquilamente seu café matinal, quando o
juiz José Ferreira Lemos (o popular Juca) perguntou a Ary Barroso:
- Como vai transmitir o
jogo?
- Perfeitamente –
respondeu Ary.
- De onde? Quis saber
Juca.
- Isso é problema
meu...
Na hora que todos
saíram para o estádio, mais ou menos ao meio dia, Ary e seus companheiros
estava com eles. Numa rua paralela à do hotel, porém, conseguiram driblar os
colegas e tomar um taxi que já os estavam esperando. Este carro levou-os ao porto
de um hidroavião, fretado pelos “Associados”, voou com Ary para Buenos Ayres.
Chegaram 40 minutos depois. Lá um outro taxi aguardava o locutor da Tupi. E
deste Ary foi levado para o apartamento onde havia instalado uma linha direta
para o Brasil. Com todas as adaptações pedidas, feitas por um técnico
especialmente contratado.
Levara, na sua bagagem,
um “pick-up” e um disco com ruído de multidão, ovacionando. A uma e meia da
tarde tudo estava pronto. Ary comunicou-se, então, com a rádio Tupi do Rio de
Janeiro, dano o necessário “ok”. Quando perguntou se a voz estava chegando bem,
responderam-lhe que nunca estivera melhor.
Tudo acerto, Carlos
Frias pôs a boca no mundo e, de 10 em 10 minutos, passou a anunciar a anunciar
que a Rádio Tupi apesar de todas as proibições, iria transmitir a partida
Brasil x Argentina, em disputa do Campeonato Sula Americano de 1942. E assim
que o juiz deu o apito inicial, e a bola foi movimentada pela primeira vez,
ouviu-se em todo Brasil a inconfundível voz de Ary Barroso transmitindo a
peleja.
Lá no apartamento de
Buenos Ayres ele ouvia, por um fone, Oduvaldo Cozzi e, por outro, Luís Elias
Sojit, excepcional locutor esportivo da Argentina. Passados os primeiros
minutos do jogo, com medo de cair numa armadilha preparada por Cozzi, Ary
passou a ouvir apenas o “speaker” platino. E com um atraso máxima de 4 segundos
descreveu toda a partida.
No Rio de Janeiro, o
povo delirava com a façanha de Ary Barroso, em Montevidéu, Cozzi e os demais
componentes de sua equipe (que haviam recebido a notícia da transmissão da
Tupi) viraram a cidade pelo avesso para descobrir de onde a emissora associada
estava irradiando. E a cada vez que Ary tocava a sua gaitinha, confirmando um
gol, recebiam verdadeira punhalada no coração.
Terminado o jogo, Ary
agiu da mesma maneira, só que em um sentido inverso: taxi até o porto de Buenos
Ayres; hidroavião até Montevidéu; taxi até o hotel, na capital uruguaia. Entrando
quase na mesma hora em eu seus colegas voltavam do estádio. Quando Juca
perguntou-lhe:
- Como é, transmitiu o
jogo?
Respondeu triunfante:
- Naturalmente.
Fim.
Parte da terceira
reportagem, escrita por Mario Moraes, sobre a vida do Ary Barroso na Revista O
Cruzeiro.
CHICO
O ATACANTE DA SELEÇÃO BRASILEIRA DE 1950
O ponta esquerda Chico
quer contar um segredo dos bastidores da tragédia de 50.
- O que foi contar ninguém vai achar em livro – garante.
Chico primeiro repete a recomendação que ouviu de Flávio
Costa:
- Nosso treinador disse
a Bigode que exigia disciplina. Se houvesse derrota com indisciplina, o
indisciplinado seria o responsável. Bigode, então, modificou o estilo de jogo.
“Quando o Brasil estava
ganhando de 1x0, tive um pressentimento: o Uruguai iria ganhar o jogo. Lá
dentro do campo, pedi o apoio de Zizinho e Ademir porque eu ia tirar o Obdúlio
Varela de campo. Todos nós sabíamos que Obdúlio Varela era chave do time do
Uruguai. Um jogador que exercia comando, o líder absoluto. Eu conhecia bem o
gênio daqueles uruguaios. Bastava que eu desse uma entrada desleal no Obdúlio e
pronto. Tenho certeza que ele não resistiria. Mas aí meus companheiros
perguntaram se eu tinha esquecido a ordem da disciplina dentro do campo”.
Chico lembrou outro
detalhe importante.
- Nós estávamos concentrados
na estrada Niemeyer. O contato com os jogadores era difícil. A condução era
dificílima. Naquela época, pouca gente tinha automóvel. Não sei porque a
concentração foi mudada para o Vasco em São Januário. É aí que entra o dedo da
direção, nesse erro. Passou a existir uma frequência diária de visitantes na
concentração. Tínhamos que fugir porque estávamos cansados de tanto dar
autógrafos. Atender os torcedores era prazer, uma alegria, porque a gente sabia
que essa gente tinha vindo de longe. Tínhamos de atender, mas aquilo estava nos
prejudicando. Sem dúvida, a movimentação na concentração era maior do que
deveria. Evidente. Houve reuniões e apresentações de políticos na concentração.
Nenhum jogador participou da mudança da concentração para São Januário. Não
fomos ouvidos. A mudança foi automática. Quando vimos, já estávamos
transferidos. O estádio de São Januário era uma concentração boa – ótimo, até -
mas ficava num ponto de fácil acesso. Então, a mudança nos trouxe prejuízo.
Éramos apresentados a vereadores, deputados, candidatos. A politicagem nos
prejudicou.
(parte
do depoimento de Chico para o livro de Geneton Mo
O ÁRBITRO PELÓPIDAS ARGOLO
O árbitro de futebol tem
problemas que ninguém tem. Para exercer sua profissão somente tem dificuldades.
Os juizes alagoanos são iguais a todos os outros do mundo inteiro. Até mesmo
nas “cantadas”.
As “cantadas”, mesmo de forma
indireta, surgem das mais diversas formas. O ex arbitro, Pelópidas Argolo, em
depoimento para o Museu dos Esportes, fez sérias denuncias contra alguns maus
dirigentes. Esses maus dirigentes são os grandes problemas dos árbitros. Eles
perseguem, criticam, xingam, e muitas vezes, tentam subornar.
Pelópidas Argolo conta que estava
escalado para apitar Capelense e Penedense, na cidade de Capela. Com um empate,
o Penedense estaria classificado para o quadrangular final do campeonato. No sábado
pela manhã, Pelópidas recebeu, em sua casa, a visita do presidente do
Penedense, Severino Camilo, que estava acompanhado do treinador do Capelense,
Eraldo Lessa. É isso mesmo. Eraldo Lessa era técnico do time adversário.
Enquanto o dirigente elogiava a residência do arbitro, o técnico foi direto ao
assunto. Disse que o Penedense não podia perder o jogo e esperava que Pelópidas
tivesse uma boa atuação. Ao mesmo tempo, Severino Camilo abria sua capanga e,
acintosamente, mostrava um punhado de dinheiro. Pelopidas pediu que ele
fechasse sua capanga. Já nervoso, Camilo disse que estava apenas tirando um
endereço telefônico para entregar a Eraldo Lessa. Ao se despedir, o presidente
do Penedense declarou que confiava na arbitragem de Pelópidas.
Depois que os intrusos foram
embora, o arbitro e sua esposa foram ao
mercado fazer compras. Ao retornarem, encontraram em sua varanda, um
saco de arroz. Seu filho explicou que tinha sido os dois homens que o visitaram
logo cedo. Pelópidas arranjou duas testemunhas, colocou o saco de arroz no
carro e foram direto para a Casa dos Pobres. Lá, procurou a madre superiora e
fez a doação. Ainda recebeu da madre um recibo também assinado pelas duas
testemunhas.
O caso foi levado ao presidente
da Federação, Heider Silveira, que não gostou da atitude do dirigente
penedense. Entretanto, pediu para que o caso não fosse divulgado pela imprensa.
Pelópidas Argolo foi a Capela e teve sua arbitragem elogiada pela imprensa e o
jogo terminou em zero a zero. Antes do inicio do jogo, o arbitro contou o caso
ao funcionário da Federação, Walfredo Oliveira que falou com Severino Camilo. O
presidente se desculpou e disse que o saco de arroz tinha sido um pedido do
Eraldo Lessa que queria oferecer a um doutor.
DANILO
E as lições da Copa.
Para Danilo, não foi só
a fatalidade que tirou a vitória do Brasil na Copa de 50. Houve muitos erros.
Alguns repetidos em 1954, até que a lição fosse aprendida e o Brasil se
organizou para garantir seu verdadeiro lugar no futebol mundial.
- Na minha opinião, o
maior erro de 50 foi a transferência da concentração para o estádio do Vasco,
em São Januário. Estávamos tranquilos na Barra da Tijuca, então um lugar de
difícil acesso para o público. De repente os cartolas mudaram tudo, e no campo
do Vasco foi aquele inferno. A época era de campanha eleitoral, e não pararam
as fotos, s entrevistas, as reuniões com figurões que disputavas cargos políticos.
E tudo isso em ritmo alucinante, de manhã, à tarde e à noite. Na manhã do jogo
com o Uruguai a coisa piorou: todo mundo era campeão do mundo, amigo e protetor
do jogador A ou B. E tome de fotografia, de discurso, de um movimento digno de
feira livre. Nós a mercadoria, estávamos apodrecendo e não sabíamos. Ainda não.
- Além do mais, fomos
muitos inocentes, muito diplomatas. Ninguém perderia assim uma Copa em casa. Eu
acho que a imagem daquela final solidificou o Maracanã como o único campo
realmente neutro do mundo. Jogamos limpo; o juiz apitou serenamente. As 200.00
pessoas que encheram o estádio eram, na verdade 200.000 de desportistas. Nem um
aperto no juiz; nem uma entrada desleal; nada de pressão contra os uruguaios.
- Eu já disse que a
gente devia colocar uma pedra sobre tudo isso. Mas é preciso falar. Transmitir
a lição. A questão dos erros técnicos, por exemplo. É claro que Flávio Costa
não foi o culpado direto, mas teve seus pecados, como a dispensa de Cláudio, do
Corinthians. Depois de Tesourinha, Cláudio era o melhor da época. Aí Tesourinha
se machucou e nós ficamos com Maneca na ponta. Maneca era um craque, mas não
era ponta. E sua índole não se coadunava com o espirito de uma decisão como
Brasil e Uruguai. Na reta final, Maneca sentiu dores nas pernas. Aí entrou
Friaça: fez o gol, mas não ganhamos. O Friaça não teve culpa, como Alfredo,
jogando de ponta direita e fazendo um dos gols no empate de 2x2 contra a Suíça.
Eles estavam quebrando o galho. E o Cláudio acompanhando a Copa como um
torcedor qualquer.
Reportagem da Revista
Placar.
BIGUÁ NA SUA VOLTA OLÍMPICA NA DESPEDIDA DO FUTEBOL
Na tarde de 3 de
novembro de 1953 – Biguá vai deixar o futebol.
Uma ruptura nos
ligamentos do joelho direito e um incidente de seu amigo Bria com Fleitas
Solich (coincidentemente, foi quem lanço Bria no time do Olímpia, de Assunção,
e que o afastou do time do Flamengo, escalando Dequinha) apressaram a
despedida.
Naquela tarde, Biguá
vestiu o uniforme do Flamengo e entrou em campo com o time no gramado do
maracanã. Posou para as fotos e descalçou as chuteiras. Chorando, iniciou a
volta olímpica no sentido contrário ao dos ponteiros do relógio – deixaria a
torcida do Flamengo para os últimos metros.
Ainda entregou suas
chuteiras a um menino que pintava bem: Carlinhos. Tentou chutar a bola para a
arquibancada, enquanto a massa rubro negra gritava seu nome. A emoção foi maior
do que a vontade: falhou no chute, a bola caiu a poucos metros, nas gerais.
Correu e entrou no
primeiro túnel que encontrou: o do Botafogo. Quando percebeu que tinha errado,
não pôde voltar, pois Carlito Rocha já estava de braços abertos, pronto para o
abraço enternecido, e a frase que ficou para a história: - Pena que no futebol
poucos tenham sido iguais a você.
Parte da reportagem do
jornalista Aristélio Andade para a Revista Placar.
NETINHO
Netinho foi um craque no CSA. CRB. Auto Esporte e Esporte Clube
Alagoas. A torcida se encantava com suas jogadas. Era um jogador elegante,
clássico e dono de um vistoso futebol.
Não adianta nossa preocupação em encontrar razões para explicar as
coisas ruins que surgem em nossas vidas. Não nos cabe outra alternativa senão
apontar os acontecimentos. Por razões extracampo, Netinho começou a cair de
produção. Seu estupendo futebol foi murchando, sumindo. A torcida já não via
mais suas grandes apresentações. A imprensa não lhe dava a mesma atenção. E
aquele que foi ídolo, que teve seus dias de glória, começou a ser esquecido por
todos.
Netinho desapareceu. Começou a beber. Não parava em qualquer emprego.
Dava pena ver Netinho, no Mercado Publico, pedindo dinheiro para beber. Era um
quadro triste onde ele aparecia como uma figura deformada. Netinho estava
perdido, tragado pelo lamaçal da bebida. Alguns amigos procuravam ajudá-lo. Em
princípio, ele tomava jeito. Parecia ter expulsado a bebida de sua vida.
Parecia querer reencontrar a porta para uma saída que lhe colocasse novamente
na sociedade sadia e equilibrada. Tudo isso, porém, durava pouco tempo. Logo
ele voltava a ser superado pelo álcool.
Diz o poeta que “o coração tem razões que a própria razão desconhece” E
Netinho deve ter tido fortes razões para se deixar devorar pelo vicio da
bebida. Jovem ainda, mas com o físico debilitado, Netinho encontrou a morte
prematuramente. Nunca mais tivemos a chance de assistir aquele futebol
inteligente, cheio de talento e habilidade.
FRIEDENREICH
O futebol que tinha
sido toda sua vida (por ele largou os estudos quando estava no terceiro ano de
engenharia) serviu apenas para piorar seus últimos dias. No dia 6 de setembro
de 1969, Artur Friedenreich, El Tigre, aos 77 anos, morria sozinho. Perdido
dentro da própria saudade (muitas vezes esquecia até o próprio nome), esquecido
entre a poeira e tristeza que cercavam seu tesouro de glórias numa velha casa,
no bairro do Pinheiro em São Paulo.
- Ele foi muito
esquecido e ninguém nunca se lembrou que tinha sido El Tigre, rapaz de futebol
perfeito, elegante, melhor até que Pelé.
Dona Joana continua a
mesma velhinha simpática, paciente, que apesar dos 57 anos vividos o lado de
Friedenreich, como mulher, enfermeira e, antes de tudo, admiradora, fala com o
mesmo entusiasmo e amor dos primeiros tempos.
- Vi poucas vezes Fried
jogando. Mas assim mesmo me lembro que era um futebol diferente: mais elegante,
humano. Na Revolução de 32, efe foi como sargento, voltou como tenente e herói.
Comandava o pelotão dos desportistas e subiu o morro debaixo de tiros para
tomar a posição.
- Nos últimos anos, eu
e meu filho notamos que Fried estava sentindo muito esquecimento em sua vida.
Quando havia futebol na televisão, virava o rosto e fingia dormir. Não gosta e
comentar nada. Só uma vez, em 1965, foi assistir um jogo de futebol, do Santos.
Mas foi outra desilusão: para entrar teve que pagar ingresso, depois de muita
confusão para poder sentar na Tribuna de Honra. Ninguém o reconhecia e El Tigre
sentia isso.
Parte do texto do
jornalista Paulo Mattiussi para a revista placar.
1943 - Isaias no Vasco da Gama.
O Vasco estava com tudo. Tinha
dinheiro, tinha torcida e muita sorte, mas nem naquele ano de 1946 conseguimos
o titulo. Com a surpreendente saída do técnico Ondino Viera, o time se
desorientou e perdeu um pouco do entrosamento. Ondino não aceitou a oferta de
renovação do contrato e foi embora, sendo substituído por seu auxiliar Ernesto
Santos. Não deu certo. Ernesto era um ótimo técnico, sabia tudo, mas era bom
caráter demais para agüentar um clube grande. E, além de tudo, era bom e
ingênuo. Só tinha que ser engolido, porque aquela turma de raposa só entendia
uma linguagem: a da porrada. Logo Ernesto saiu e o Vasco contratou Flávio
Costa, outro homem duro como Ondino. Flávio assumiu o time no meio do caminho e
não teve tempo de recuperar o grupo. Já no ano seguinte as coisas melhoraram,
principalmente com a volta de Ademir Menezes, um dos maiores goleadores que vi
em meus quarenta anos de futebol. Novamente entrosada e disciplinada, o Vasco
deu um passeio em todo mundo e foi
campeão invicto.
A alegria foi obscurecida logo
depois, por um acontecimento muito doloroso: a morte do nosso querido
companheiro Isaias, aquele centro avante de sete fôlegos que desmoralizava
quase todos os goleiros do Brasil com seus chutes violentos e traiçoeiros. Nós estávamos nos preparando para uma viagem
ao Uruguai, onde haveria um torneio e o entusiasmo era geral. Uns dias antes,
Isaias me procurou na concentração. Fiquei pasmado ao vê-lo. Não era possível.
Diante de mim, rouco e triste, estava um fantasma. Quase não o reconheci, tão
magro ele estava. Isaias respirava com dificuldade. Sentou-se e balbuciou:
-
Estou muito mal, Mario, acho que vou morrer.
Levei-o
imediatamente ao Dr. Amílcar Gifffone, mas, ao que parece o médico não se
impressionou tanto quanto eu. Deu-lhe um remédio e mandou que ele voltasse no
dia seguinte. Ele voltou e eu mais uma vez me espantei. Já nada mais restava
daquele negro raçudo e alegre que um dia, quando jogava pelo Madureira, eu vira
marcar quatro gols no poderoso Fluminense. Já não era mais aquele Hercules de
Ébano que um dia marcou um golaço de letra também contra o Fluminense. O que
estava a minha frente, agora, era um moribundo, um esqueleto ambulante. O
médico diagnosticou tuberculose galopante e ele foi internado num Hospital de
Petrópolis, onde deveria receber uma injeção de ouro que fora encomendada nos
Estados Unidos. Mas não chegou a toma-la. Sua família, contrariando as ordens
médicas, tirou Isaias do Hospital para tentar uma cura num centro espírita.
Isaias
morreu quinze dias depois. Ocorreu, então, um fato que só de lembrar me enche
os olhos de lágrimas. Nós tínhamos um amistoso marcado contra o Olaria,
justamente na data do enterro. Para
surpresa nossa, dirigentes do Vasco não quiseram adiar o amistoso. No
sepultamento de Isaias, só Ademir Menezes se fez presente, mesmo assim, porque
estava contundido e não tinha condições de jogo para enfrentar o Olaria. Essa é
uma mágoa que tenho do Vasco da Gama.
Mendes
O goleiro indisciplinado em 1923
Na época do amadorismo aconteciam
coisas que jamais poderiam acontecer nos dias de hoje. O goleiro Mendes,
chamado de Gato do Nordeste, jogava futebol no CSA, mas também gostava de remar
na Lagoa Mundaú. A diretoria azulina havia proibido jogadores do seu clube ter
acesso a garagem de barcos que existia no mutange. Mendes desrespeitou a ordem,
arrombou a porta da garagem, tirou uma yole e foi passear na Lagoa. Para seu
azar, na volta, quebrou a yole. Mesmo assumido a responsabilidade de seus atos,
o goleiro teve um desentendimento com o diretor Luciano Lordeslen, e foi
suspenso por quinze dias.
Ao invés de passar quinze dias
fora do time, Mendes ficou trinta dias sem comparecer ao mutange. Achava que a
punição mais certa seria um mês. Depois dos quinze dias, a diretoria pediu ao
Mendes para voltar porque precisa dele para disputar partidas importantes. Ele
não aceitou. Então os dirigentes foram falar com Álvaro Peixoto, uma das
figuras mais importantes do clube azulino. Entretanto, o patrão do grande
goleiro afirmou que, Mendes era empregado da firma e não do CSA. Por isso, ele
é quem devia decidir se voltava ou não. Por esse motivo, Luciano Lordeslaen
renunciou o cargo de Diretor Náutico do CSA.
Castanha
O massagista que evitou o gol do CRB.
Para jogadores, treinadores e, mesmo, para os “cartolas”, a fama no futebol é coisa relativamente fácil. O jogador porque faz um gol ou defende um pênalti e evita a derrota do seu time. Os “cartolas” porque aparecem nas rádios, jornais e, até televisão, concedendo entrevistas e falando sobre seu clube. Mas outras profissões, ainda que importantes no futebol, a fama não existe. Por exemplo, para um massagista, que cuida dos músculos dos atletas, que os prepara para os jogos, tudo não passa de rotina. A fama e a glória não existem para os massagistas, mesmo nas alegrias de uma vitória. Muitas vezes, o recado do treinador é dado pelo massagista com rapidez e oportunismo, e pode transformar a sorte de uma partida. Ninguém duvida que os massagistas além de massagear pernas famosas, muitas vezes, se tornam confidentes de seus jogadores.
Entretanto,
alguns massagistas, ganham manchetes no noticiário esportivo, graças a uma ação
deliberada ou surpreendente que cometeu. Um desses casos aconteceu em Alagoas
envolvendo Cícero Lopes de Araújo, o popular Castanha, que foi massagista do
CSA por mais de dez anos. Um caso curioso que ganhou notoriedade por ter criado
uma polemica incrível. Foi num clássico CRB x CSA, ocorrido no dia 8 de abril
de 1976, no Trapichão. O jogo era válido pelo quadrangular decisivo do primeiro
turno. O vencedor seria campeão do
turno. O juiz era Pedro Rufino. O jogo estava empatado em 1x1. Então aconteceu
um ataque do CRB. O lateral Espinosa fez um cruzamento para a área azulina e o
goleiro Paulo Sérgio saindo precipitadamente, não segurou a bola que
caprichosamente sobrou para o ponteiro Silva. Era a chance do gol da vitória
regateana. Silva vinha chegando e chutou
em direção as redes azulinas. Foi no momento exato em que o massagista Castanha
se aproximava da meta de Paulo Sérgio para transmitir um recado do treinador.
Vendo que o chute de Silva tinha endereço certo, não pensou duas vezes, entrou
no gramado e, junto ao poste lateral direito, não deixou a bola entrar no gol
do CSA, dando um chute em direção ao meio campo.
A
torcida do CSA vibrou como se seu clube tivesse marcado um gol. A torcida do
CRB ficou revoltada. Todos queriam o gol que parecia iminente. Como a bola não
ultrapassou a linha de meta, o juiz não confirmou o tento, mas expulsou o
massagista Castanha. O caso durou muitos anos nos noticiários esportivos e
causou debates violentos entre as duas torcidas de Alagoas. Um acontecimento inusitado, no qual, pela
primeira vez um massagista ganhou notoriedade e fama.
Juca da Praia
O árbitro da Federação Metropolitana de Futebol.
Juca da Praia, árbitros
dos mais conceituados no futebol brasileiro e Sul Americano, teve várias
passagens rumorosas no futebol. Vamos contar um dessas histórias.
Uma passagem rumorosa
foi por ocasião dos incidentes do jogo Fluminense e Botafogo. Juca validou o
gol de Botafogo que o Fluminense reputava off-side escandaloso. E o presidente
Marcos de Mendonça afirmou que Juca não apitaria mais jogos do seu clube. Mas
pela regulamentação então vigente no Colégio de Árbitros da Federação, do qual
era diretor o senhor Joaquim Guimarães, Juca teria que apitar o jogo seguinte
do Fluminense x Vasco. No dia do jogo houve um corre-corre danado. Juca não
abria mão do seu direito de apitar o jogo. Joaquim Guimarães chamou o
presidente Vargas Neto para conversar com Juca. Vargas Neto chamou João Lira, o
pacificador de todas as encrencas. E houve uma reunião agitadíssima na sala do
presidente da Federação. Gritos, lágrimas, revolveres na mão... Juca
descontrolado gritava que iria ao campo de qualquer maneira, nem que tivesse de
abrir caminho a bala. Marcos de Mendonça manara avisar a Vargas Neto que Juca
só entraria em Álvaro Chaves passando por cimo dos cadáveres dos diretores do
Fluminense que ficariam na porta para impedir a entrada do juiz. A situação era
gravíssima e daí a reunião dos dirigentes com o juiz. Afinal, João Lira venceu
o duelo Juca desistiu de ir a Álvaro Chaves, tentar abrir caminho a bola. E
Mário Vianna foi chamado às pressas na Polícia Especial, quase na hora do jogo,
para ir apitar a partida do Fluminense com o Vasco. E quando Mário chegou ao
portão de Álvaro Chaves encontrou realmente a diretoria tricolor a postos,
esperando a chegada de Juca para o “entrevero”.
Da Revista – O Globo
Esportivo de 1948.
DEDA
Deda saiba jogar bola. Era todo arrojo, ímpeto e bravura.
Fazia jogadas sensacionais e empolgava os torcedores. Ele conta como chegou ao
fundo poço e conseguiu sua recuperação.
- Quando eu ainda estava no CSA e não bebia nem fumava,
dirigentes do Bangu tentou me levar para o futebol carioca. O CSA não deixou.
Fui a Federação Alagoana de Desportos e constatei que tinha passe preso. Quando
assinei meu primeiro contrato com o CSA, seus dirigentes afirmaram que era
passe livre no final do compromisso. A partir daí comecei a sentir que não
poderia acreditar em dirigentes do futebol. Lamento não ter tido um amigo ou
alguém que me orientasse para viver nesse mundo do futebol. Eu pensava somente
no presente. Depois de três anos vestindo a camisa do CSA fui contratado pelo
CRB. Acho que foi um erro jogar no CRB. Não estava vivendo um bom momento e a
torcida do CRB queria que rendesse o mesmo quando jogava no CSA. Foi nessa
época que começou minha derrocada. Não podia errar em campo. Minhas condições
físicas não estavam boas e quando entrava em campo procurava acertar e não
conseguia. Comecei a beber e sair da linha.
Deda fez uma pausa para depois continuar seu grande drama no
futebol.
Em pouco tempo me
senti perdido. Era a areia movediça que me arrastava para o fundo do poço.
Continuei bebendo e tendo problemas com minha família. Até muita gente que se
dizia meus amigos começaram a se afastar. Um dia, eu estava bebendo no bar de
seu Alciro, em Murici, quando Cleane, minha esposa, apareceu e me entregou a
página esportiva da Gazeta de Alagoas onde tinha uma matéria assinada pelo meu
amigo Lauthenay Perdigão que fazia comentário sobre um craque da Seleção
Brasileira chamado Fausto dos Santos. Esse craque que disputou duas Copas do
Mundo, depois de viver na boemia, a noite toda com bebidas e mulheres, faleceu
longe dos amigos, esquecido por todos e somente ao lado da mãe. Um jogador que
foi chamado de “A Maravilha Negra” poucos souberam que ele tinha falecido.
Emocionado, Deda concluiu.
Depois de ler a reportagem, tomei uma decisão. Ou procuro me
curar ou vai acontecer a mesma coisa que aconteceu com Fausto dos Santos. Fui
para casa do meu sogro e pedi ajuda a esposa e a família. Me colocaram em um quarto que ficava em cima
da Farmácia do meu sogro e fecharam a porta. Muitas vezes, eu batia na porta pedindo para sair. A esposa e meus cunhados não abriam. As vezes chegava a
ouvir o choro dos meus filhos pedindo para ver o pai e eu me revoltava comigo
mesmo. Sentia vergonha de tudo que tinha feito. Somente depois de uma semana
tomando agua é que senti o cheiro de comida boa, e pedi a Cleane para me trazer
um pouco. Era a primeira vitória. A recuperação estava começando. Mais uma
semana e eu já estava me alimentando bem. A porta ficou aberta, mais eu não
saia. Um mês depois, comecei a sair e me tornei um grande amigo do meu sogro.
Depois que ganhei a luta contra o vício. Me transformei completamente. Consegui
um emprego na Salgema de onde saiu aposentado.
ZÉ ROBERTO
Zé Roberto começou no
juvenil do CSA nos anos 70 quando mostrou logo o estilo artilheiro para jogar.
Em 1980 foi para o profissional do clube azulino, foi campeão e marcou o título
de campeão. Logo depois foi para o Moto Clube. Em nove anos que passou
defendendo as cores do Moto, assinalou 280 gols.
“Nessa época me
estruturei financeiramente, conquistei fama e dinheiro, virei ídolo no
Maranhão. Porém tufo foi por agua abaixo no dia em que eu deixei o Brasil,
ilusão de ir jogar na Bélgica”.
Zé Roberto conta que
para deixar o Brasil teve que comprar o próprio passe, na época pertencia ao
Sampaio Correia.
“Para isso, vendi meu
apartamento, carro, tirei todo dinheiro que tinha no Banco e gastei tudo.
Comprei também a passagem para ir para a Bélgica. Peguei o avião e fui embora.
Quando desembarquei no aeroporto de Bruxelas, não tinha nenhum empresário me
esperando. Ainda telefonei para ele que disse que não poderia me pegar.
Sozinho, chorei e fiquei desesperado. Uma última pessoa destruiu a minha vida”.
Zé Roberto revela que
foi com a ajuda de um amigo, o jogador Serjão, que tinha jogado no Sampaio
Correia, e estava jogando no futebol belga que conseguiu se instalar. “Pedi
socorro e ele me levou para jogar no Arobick, time da segunda divisão da
Bélgica, onde fiquei dois anos. O Serjão
ainda me conseguiu cerca de U$$ 10 mil para eu recomeçar a vida. Com esse
dinheiro mandei minha família, que estava no Maranhão, de volta à Alagoas assim
como a mobília que tínhamos”
No clube Belga, Zé
Roberto foi campeão e o time subiu para a primeira divisão. Ele foi o
artilheiro. Depois voltou para ao Brasil para jogar no Maranhão Atlético Clube,
que estava a seis anos sem conquistar um campeonato. Depois voltou pra Maceió,
onde jogou no Dínamo e Ferroviário.
“Tudo que aconteceu na
minha vida considero que foi por falta de experiência e por ter ficado
deslumbrado com a possibilidade de jogar na Europa. Todo jogador sonha com
isso, quer estruturar a família, dar conforto, ganhar muito dinheiro, mas
comigo não deu certo. O problema é que ainda hoje muitos atletas jovens se
iludem com promessas de empresários e não pensam antes de tomar uma decisão”.
FAUSTO DOS SANTOS
A mãe de Fausto dos Santos. dona Rosa.
Miséria depois da
glória do filho.
Dona Rosa, a mãe de
Fausto, falou sobre os últimos dias do filho famoso.
“Desconfiei.
Surpreendi-o, e uma feita, nervoso, em prantos, fechado em um velho coração de
mãe, que é que se pode esconder? Quando meu filho começou a adoecer para se
acabar, quando começou a sentir que os pulmões ameaçavam romper-se de tanto
tossir, Fausto foi ficando sozinho, foi ficando isolado. Eu e ele, ele e eu.
Passamos aí, a contar apenas com pouquíssimos amigos dos bons e maus momentos”.
O repórter perguntou. E
o dinheiro das economias? O dinheiro dos dias de glória?
“Nessas alturas dos
acontecimentos já não havia mais economia. O dinheiro foi sumindo, foi se
acabando. Acabou nas custas do processo entre ele e o Flamengo. Acabou em
remédios. No fim, adeus casa, adeus
guardado, adeus projeto de casa própria. Bem que avisei a ele. Bem que lhe
disse: cuidado Fausto! Um dia isso termina! Meu filho sofreu muito na doença,
no abandono, no exilio. Sofreu muito mais quando teve que jogar uma preliminar
no campo do São Cristovão. Aquilo o matou moralmente”.
Fausto durou alguns
meses depois daquela preliminar. Morreu tentando a cura. Em Santos Dumont,
longe da casa. Longe da sua mãe. Longe dos poucos amigos. Monologando. Ele e
sua sombra. Ele e o seu fantasma. Esquelético. Febril. Anônimo. Foi enterrado
anonimamente. O que foi que sobrou dona Rosa?
“Um vestido que ele me
mandou da Espanha e algumas medalhas, que trocadas por dinheiro não dariam
nada, mas que eu não trocaria, embora valessem, uma fortuna!”
Depois da morte do seu
filho famoso, dona Rosa mora, de favor, em um pequeno quarto. E o resto ela
consegue fazendo com o trabalho nas camisas que passa e com as compras que
mandam ela fazer.
Matéria de Geraldo
Romualdo da Silva para a Revista Globo Esportivo.
DIDI
Depois da conquista do
mundial de 1958, Didi falou ao repórter – Ronaldo Bôscoli – sobre as promessas
que foram feitas para os campeões que nunca receberam nada.
O próprio Didi explica:
“Ninguém, e juro por essa luz, ninguém pediu nada. Os homens é que prometeram.
Em São Paulo a coisa andou melhor”.
E quais foram essas
promessas? Você pode enumerá-las?
“Não sem antes explicar
que interpreto o pensamento de todos os companheiros cariocas que estiveram na
Copa. Não sou ovelha negra, nem quero onda para o meu lado. Lembrou-me da
Comenda que nos seria ofertada pelo CND com a ordem de Cavaleiro do Esporte. Em
segundo lugar os tais talões que teríamos durante um ano para não pagar a
gasolina que nossos carros consumiriam. Eu, toda vez que entro num posto,
desembolso o quando estiver marcando o aparelho que serve gasolina para o meu
Oldsnobile. Mais uma, e aí coisa já vai ficando mais séria. Falava-se que o
comércio daria milhões de prêmios. A maior parte deste mesmo comércio – ficou
só na conversa. Viajamos sob promessas de milhões e...nada. Eu citaria, também,
a desavença com a tal caixa única. Pelé ganhou um carro e eu, depois disso,
ganhei uma radiola. Quero dizer que a partilha dos prêmios não foi adiante. Mas
duas promessas mais sérias deixei para citar no final. A da Fundação da Casa
Popular. Até hoje aquilo ficou no papel. Teríamos terreno para construirmos
nossas casas. Até agora, nada. Finalmente o emprego público, tantas vezes
adiado. Na época o Presidente JK havia suspendido as nomeações, mas depois
daquilo houve mais duas chances. Claro que preciso de um emprego. Amanhã meu
futebol acaba. Minha renda cai de oitenta por cento. Só os leigos acreditam que
eu seja mesmo um milionário. Você mesmo conhece minha vida. Não vivo
miseravelmente, mas nunca esbanjei. E depois assumi compromissos que terei de
saldar, muito depois do final do seu futebol. Eu preciso de um emprego público,
sim senhor”.
BALTAZAR
Sem amigos e sem
dinheiro, o “Cabecinha de Ouro” prova que só usou a cabeça para fazer gols.
Por confiar demais no
seu cartaz e não pensar no futuro, Baltazar (o famoso Cabecinha de Ouro”
atualmente está passando maus momentos em Santos. Quando a sorte o bafejou,
gastou dinheiro e viveu uma vida de rei. Agora está sentindo o erro de não ter
economizado para os dias incertos do futuro. Talvez tenho pensado que o futebol
lhe seria eternamente rendoso.
Os amigos também não
são muitos, pois ele não soube fazer. Se assim tivesse acontecido, hoje,
naturalmente seria amparado. Dentro do gramado era uma fera como centro avante.
Certa feita em São Paulo, jogou Castilho com bola e tudo para dentro do gol com
uma cabeçada. O goleiro tricolor era seu companheiro na seleção. Seu gênio
incontrolável permitia-lhe cometer muitos desatinos dentro do gramado. Assim,
nunca teve grandes amigos dentro do campo.
Depois de ter sua época
de ouro no futebol, Baltazar, ídolo do Corinthians, começou a cair e foi parar
no interior, mostrando seu futebol por pouco dinheiro. Praticamente, Baltazar
acabara para o futebol. A cabecinha de ouro já não funcionava mais. Chegara ao
fim uma carreira que fora iniciado sob o signo da fortuna e da popularidade. A
fama tomou conta de sua mente e não o deixou pensar no futuro. Fez ótimos
contratos com o Corinthians, onde foi ídolo como artilheiro, mas o dinheiro se
extinguiu rapidamente, pois ele gostava imensamente de automóveis.
E assim acabou o
futebol de Baltazar, pode-se dizer. Não economizou, não fez amigos e a pobreza
rondou-lhe os passos. O antigo e vigoroso craque não soube fazer cálculos para
o futuro. Hoje, nem futebol, nem amigos, nem dinheiro. Só tristeza por ter
usado a cabeça apenas para marcar gols. Mas uma coisa não se pode negar, dentro
do seu estilo foi um dos maiores centroavantes do Brasil.
Matéria na Revista do
Esporte.
PAULO CESAR CAJU
Quando ele diz que
superou o sistema, a máquina montada sobre os oprimidos, Paulo Cesar se refere
à briga que teve com André Richer, diretor da CBD, e Cláudio Coutinho, técnico
que o ressuscitou para a Seleção, nas eliminatórias de 1977, e que depois
também se enquadrou nos esquemas do futebol. Sabe que foi banido porque
reivindicou bichos melhores contra Peru e Bolívia o mesmo argumento que afastou
Marinho Chagas.
- Lembro da reunião
como se fosse hoje. Richer foi ríspido na defesa dos interesses da CBD e eu
respondi à altura. Não levo desaforo para casa.
Paulo Cesar ouve novas
acusações: mal profissional, porque arruma contusões para não jogar quando há
corridas de longas distâncias nas Paineiras, foge dos jogos nos campos do
interior e não cumpre as determinações táticas.
- Se sou mesmo tudo
isso, como consegui ser campeão em todos os times que defendi? Inclusive o
Grêmio, que joga no interior, onde existem verdadeiros alçapões. Não gosto de
me exibir em campos que só servem pra peladas doidas e de baixa categoria. Os
melhores bailarinos do mundo se exibo em nos melhores palcos. No futebol
acontece o mesmo: o craque deve mostrar seu talento no Maracanã.
Muitas recordações ele
prefere esquecer para sempre, mesmo momento em que o adeus se aproxima
lentamente e começa a acuá-lo, a encher seu futuro de temores e incertezas. As
distensões, as torções, as pancadas são cada dia mais frequentes. Crescem na
proporção em que declina seu prestígio. É Paulo Cesar sentindo o peso da idade,
o correr dos dias que o afastarão dos campos e principalmente do Maracanã,
santuário e provável túmulo de uma carreira polêmica. Paulo Cesar, negro de infância humilde que hoje, cheio de dinheiro, de autoproclama o
Muhammad Ali do futebol. Mas com uma diferença: saberá se retirar de cena no
momento certo.
ELY
O relato é de médio
vascaíno, Ely do Amparo.
Quando foi convocado
para o Pan Americano fiz ver a Zezé Moreira que não modificaria minha forma de
jogar. Era um homem calejado e sabedor de que, lá fora, não se ganha campeonato
sem peito, sem grito. Zezé concordou plenamente e declarou-me capitão do time.
Convoquei os rapazes antes do primeiro encontro e adverti-lhes do que
certamente iria acontecer. Estufei o peito e gritava dentro do campo como uma
fera ferida. Tropeçamos contra nos peruanos e continuamos a campanha de cabeça
erguida. Quem se escondesse ouvia minhas broncas.
Veio jogo contra o
Uruguai. Logo nos primeiros minutos, um atacante uruguaio começou a sambar na
minha frente, entrei duro. Carballo, o valentão uruguaio, correu ao meu
encontro. Esperei de cara feia, o rapaz preferiu argumentar. Só então os
companheiros entenderam que ali estava a receita para vencermos. Combinamos com
os reservas: se eles invadirem o campo, invadam também. Não deu outra coisa seu
moço. Eles invadiam, nós também. Vencemos o encontro.
No derradeiro jogo
contra o Chile, e decisivo, expulsei Ademir de campo. O grande craque
conquistou dois gols de saída e começou a se encolher. Mandei-o ir para frente
e ele não obedeceu. Os chilenos começaram a endurecer o jogo. Corri para Zezé:
Se você quer vencer o jogo, tire o Ademir.
“Mais quem é que vai
entrar?”
Outro qualquer. Zezé
fez que não entendeu. Os chilenos ameaçavam. Corri para Ademir e o mandei para
fora de campo. Zezé veio ao meu encontro.
“Quem é que pode entrar?”
Apontei Pinga. E Pinga
entrou para fazer gol. Levou uma grande corrida dos chilenos enfurecidos com as
comemorações. Colocou-se atrás de mim. Abro os braços e disse: Aqui ninguém
entra. Vencemos então, no grito, no peito e na raça. Quando saímos do campo choveram
muitas garrafas jogadas pela torcida chilena. Fiquei sozinho, dentro do Estádio
Nacional, esperando amainar a onda. E trouxemos o título.
LELÉ AFIRMA QUE GOL DO FLAMENGO FOI IRREGULAR
Lelé não se lembra somente das emoções que teve no
futebol. Lelé fazia parte do trio do
Madureira – Lelé. Izaias e Jair – que foi contratado pelo Vasco em 1942. Tinha
um canhão nos pés e foi várias vezes convocado para a seleção brasileira e
conquistou muitos títulos pelo Vasco da Gama. Em seu depoimento a revista
placar, Lelé comentou sobre a decisão do titulo carioca de 1944.
“Eu tenho a amarga lembrança da final do campeonato
carioca de 1944 quando perdemos o titulo para o Flamengo. Era uma decisão o
Vasco tinha um time melhor e o Flamengo jogava desfalcado de alguns titulares.
O Vasco não poderia perder aquele jogo, pois o Flamengo seria tri campeão. No
final, uma vitória do rubro negro por 1x0, fruto de um gol ilegal marcado por
Valido, ponta direita do Flamengo. Tínhamos tudo para ganhar e acabamos
derrotas por um gol irregular”.
“Eu só me lembro do momento em que cruzaram a bola para a
área. O Valido viu que não conseguiriam cabecear e apoiou os dois braços nos
ombros de Argemiro. Conseguiu a cabeçada e o gol saiu. O Argemiro, nesse lance,
até caiu sentado, pois Valido jogou toda a força nos ombros do nosso lateral.
Discutimos bastante, mas naquele tempo já existiam os juízes que davam uma
colherzinha-de-chá para certos clubes. O Vasco ainda tentou de todas as formas
possíveis invalidar o gol e também a partida. O lance do gol do
Flamengo foi filmado e os dirigentes do Vasco utilizaram o filme como prova na
Federação Carioca de Futebol. Mas de nada adiantou, pois a Federação não anulou
nada e o Flamengo acabou tri campeão carioca. Daquele jogo, sempre terei as
piores recordações – concluiu Lelé.
Primeiros dias do Dida no Flamengo.
É Dida quem conta.
- Aos 17 anos fui
convocado para a Seleção Alagoana, que iria disputar o campeonato brasileiro. E
isso me incentivou muito. Durante a competição, no jogo contra a Paraíba, a
delegação de voleibol do Flamengo, que estava excursionava pelo Nordeste,
estava lá, assistindo. O nosso time perdia de três a um e eu marquei os dois
últimos gols, virando o jogo para quatro a três. Quando cheguei em casa, já
estavam lá dois representantes do Flamengo, que me propuseram a transferência
para o Rio.
Apoio do pai, choro da mãe, Dida acabou embarcado para a cidade grande,
em maio de 1954. Mas, na escala do avião da FAB, em Salvador, os problemas de
saúde começaram a aparecer. Não que ele fosse doente. Esmo assim, Dida chegou
ao Rio de Janeiro debaixo de injeções e cheio de timidez.
- Fiquei em tratamento durante 40 dias. Foi minha sorte. Os 20 últimos, o
time principal que era campeão da cidade, estava excursionando pela Europa,
voltou. Com isso, pude fazer um bom ambiente, antes do meu primeiro jogo, o que
oi muito importante para mim, garoto bobo, chegado do Norte, que tinha até
vergonha para tantos craques, quanto mais jogar junto. Mas com o tempo fui
fazendo as amizades e ficando à vontade. Assim, entrei no time de aspirante,
que foi campeão de 1954, enquanto o principal conquistava o bicampeonato. Nesse
ano, joguei pelos aspirantes quatro meses e entrei em alguns jogos do time de
cima. No aspirante tinha grandes jogadores como Duca, Moacir, Henrique, Babá e
outros. Acabamos bicampeões, em 1955, quando o time principal no qual também
joguei, conquistou o tricampeonato.
Haroldo Miranda concedendo seu depoimento para o Museu dos Esportes.
Com ele estão os cronistas Lauthenay Perdigão e Luiz Alves.
O saudoso Haroldo Miranda viu o rádio esportivo nascer em Alagoas. Com
outros companheiros, fez a sua história. Aprendeu e ensinou nas suas andanças
por esse Brasil. Inaugurou dezenas de prefixos pelo Nordeste. Viveu emoções e
decepções na longa caminhada de jornalista autêntico, verdadeiro e que combatia
e era combatido. Apesar de ter participado do rádio alagoano antes da
inauguração da Rádio Difusora de Alagoas, Haroldo Miranda não viu a inauguração da Pioneira. Estava no rádio baiano. Como ele não queria morrer
teve que sair de Maceió. Marques Mesquita foi quem o tirou de avião de Palmeira
dos Índios.
E Haroldo Miranda falou sobre a primeira emissora de rádio em Alagoas -
- Antes de tudo isso, mesmo faltando uma
emissora de rádio e Alagoas, que somente veio em 1948, existia em Maceió, o CRF
e o PRFC, a primeira estação de rádio da nossa terra. Jaques Mesquita e Luiz
Gonzaga construíram um transmissor, conseguiram burlar os Correios e Telegrafos
e colocaram a voz de Alagoas no ar. Mas, logo depois, proibiram e calaram essa
voz.
Como era homem de palco e fazia teatro Haroldo teve uma ideia.
- Resolveu falar com o Miguel para saber como podia transmitir uma
partida de futebol, já que tinha visto em Aracaju uma transmissão do jogo da
bola. Essa transmissão teria que ser feita através do telefone. Na época, os
telefones eram raros. Mesmo assim, a linha telefônica da Fábrica Alexandria
passava ao lado do campo do Mutange. Miguel, usando um amplificador, puxou uma
linha da Fábrica, mesmo sem pedir permissão. Desta forma, nos anos quarenta fizemos a
primeira transmissão esportiva no Estado de Alagoas para uma enorme rede de
doze altos falantes espalhados pela cidade. Não tinha comentarista e no
intervalo se transmitia uma seleção de músicas. O primeiro patrocinador foi
Arestor Marques, dono de uma casa funerária. E eu anunciava assim -
“Arestor Marques, o amigo certo para as horas incertas”.
ZIZINHO NO BANGU
Certa manhã, o
presidente do Flamengo, Dario de Melo Pinto, telefonou para Silveirinha, patrono
do Bangu. Tinha negócios a tratar. Combinaram um almoço. De repente, como não
podia deixar de acontecer. A conversa passou para o futebol. Em determinado
instante, Dario achou chegado o momento de tentar a compra de Mariano. Depois
de ouvir Dario, o patrono do Bangu admitiu a venda do Mariano, desde que o
Flamengo lhe cedesse um jogador.
Dario deu a entender
que aceitava a proposta. Silveirinha apelou - “É que o diabo o Flamengo, time
grande de cobras, só tem jogadores inegociáveis”.
Dario rebateu: “Inegociáveis
não. Dependendo do dinheiro, o Flamengo venderia qualquer um”.
Silverinha – “Até o
Zizinho?”
“Até o Zizinho” –
Confirmou Dario, longe de pensar que Silveirinha queria exatamente ele.
Como estava interessado
em comprar Mariano, Dario resolveu liquidar a conversa sobre Zizinho, com uma
proposta que julgava inaceitável – “ Zizinho custa 800 mil cruzeiros”.
”Eu pago”, atalhou
Silverinha. Dario tentou recuar. Explicou que Zizinho não trocaria o Flamengo
pelo Bangu, que não desejava sair da Gávea. Silverinha não se deu por vencido –
“Quem sabe se uma conversa com Zizinho não resolveria tudo?”
Zizinho estava
concentrado com a Seleção Carioca, que disputaria com a Paulista a final do
Campeonato brasileiro. Era fácil localizá-lo. O próprio Silveirinha foi ao
telefone. Contou a história. Zizinho Parecia não entender – “800 mil
cruzeiros?” Sim! Confirmou o patrono do
Bangu. Zizinho sem querer acreditar – “Mas seu Dario disse que me vende por 800
mil cruzeiros”. Disse, não. Vende, interrompeu Silveirinha.
E Zizinho desabafou –
“Pois então compre meu passe, seu Guilherme, que agora quem não quer ficar no
Flamengo sou eu. Compre meu passe”. Silveirinha voltou à mesa e gritou,
erguendo os braços – “Negócio fechado!”
Dario balançou a cabeça
afirmativamente. Quem assistiu à cena disse que havia um espanto e tristeza em
sua face. Na semana seguinte, os cariocas golearam os paulistas por 4x0 e
Zizinho fez dois gols. Logo depois, já banguense, embora apenas ter vestido a
camisa do clube para as clássicas fotografias, seguiu para Araxá, primeira
etapa dos preparativos para a Copa de 1950.
A torcida do Flamengo
nunca entendeu a saída do Zizinho do clube. Para evitar uma reação pior, Dario
falava em reforços. Anunciou a contratação de uma revelação gaúcha, Hermes, um
goleador. Ele chegou cercado de carinho, era uma esperança. Mas, na primeira
vez que Zizinho jogou contra o Flamengo, Hermes não fez nada. O Bangu ganhou de
5x0, Zizinho deu um show. A torcida do Flamengo ficou sem entender nada.
Da Revista Placar.
FRIEDENREICH
Friedenreich, El Tigre,
viveu um de seus maiores momentos no futebol no Campeonato Sul Americano de
1919. O campeonato que foi realizado no Brasil. O Fluminense construiu um
estádio com capacidade para 25 mil pessoas especialmente para o evento. Era o terceiro campeonato realizado.
Friedenreich, em
entrevista para a Manchete Esportiva, jornalista José Romualdo da Silva, contou
sua emoção na conquista daquele campeonato.
- Se vocês, hoje em dia,
consideram os argentinos autênticos “bichos papões” multipliquem por dez o que
eram os uruguaios na minha época. Para vencermos o Sul Americano de 1919
tivemos que jogar 2 horas e 15 minutos. Vinhamos, como eles, de quatro partidas
sem derrota. No primeiro encontro perdíamos por 2x0. Viramos e conseguimos um
2x2 em cima da hora. Credenciamos a uma segunda disputa. Jogaríamos numa
quarta-feira, por esse motivo foi decretado feriado para nossa sorte. Como não
existia refletores a peleja foi marcada para as 3 horas, possibilitando assim, as prorrogações. Terminou o jogo: 0x0.
Prorrogação de 30 minutos: 0x0. Nova prorrogação de 30 minutos. Idêntico 0x0.
No terceiro desdobramento aconteceria aos dez minutos a maior emoção da minha
vida. Neco no meio campo fintou um adversário e deslocou-se para a direita
cedendo a Millon que devolveu a Neco. Houve a repetição de lance mais próximo à
área uruguaia. MIllon calculou e centrou. Senti que a bola não seria alcançada
por mim. Heitor pediu - “deixa Fried”. Parei. Heitor cabeceou. Saporiti,
goleiro uruguaio, rebateu e perdeu o equilíbrio. A bola veio em minha direção.
Matei-a no peito e, de pé esquerdo, conquistei o campeonato de 1919. O delírio
foi indescritível. O número de chapéus de palha jogados no campo determinou a
interrupção do jogo. Os empregados do clube tiveram que recolhê-los. Saímos do
estádio do Fluminense carregados, atravessamos as ruas da cidade, passamos pelo
Palácio e o Presidente Bernardes nos saudou. Voltei para casa a uma madrugada completamente
rasgado e sem um pingo de voz. A festa
dos dez mil chapéus de palha não me sai da lembrança.
( Parte da reportagem de Ronaldo Boscoli para a Manchete Esportiva de
1957)
MÁRIO VIANNA
- Era véspera do jogo
entre Hungria e Brasil pela Copa de 1954. Eu estaca de folga num hotel em Berna
onde ficavam todos os árbitros. Puskas, o fantástico craque húngaro, não ia
jogar e vi quando ele entrou no hotel e foi para o quarto no Mr. Ellis, juiz
escalado para apitar o jogo. Eles ficaram lá dentro mais uma hora. Eu
desconfiei. No dia seguinte, ao ver o Brasil ser vergonhosamente roubado
(resultado final foi de 4x2 para a Hungria), botei a boca no mundo.
- Contei tudo que sabia
à imprensa e chamei a FIFA de camarilha de ladrões. Meses depois recebi um
comunicado da FIFAS, me consultando sobre as tais declarações. Diziam eles que
se eu confirmasse as denúncias, seria expulso do quadro de árbitros. Como não
sou homem de duas palavras, preferi ser expulso.
Mario não se emendou.
Quando era comentarista de arbitragem na Rádio Globo, ao comentar uma partida
apitada por Abraham Klein, mandou este para ar –
- Esse juiz além de
judeu é ladrão!
Quase perdeu o emprego,
porque os patrocinadores eram, como Klein, judeus.
Gafe semelhante
voltaria a cometer numa mesa redonda de televisão, comanda por Luís Mendes. Sentindo-se
asfixiado pela fumaça dos cigarros dos companheiros desabafou:
- Parem de fumar, isso
é um veneno, polui os pulmões!
Enquanto isso, por trás
das câmaras, Luís Mendes, com gestos desesperados, tentava lembra-lo de que o
patrocinador ninguém menos do que a Souza Cruz.
Chico
na seleção brasileira de 1950
O ponta esquerda Chico
quer contar um segredo dos bastidores da tragédia de 50.
- O que foi contar ninguém vai achar em livro – garante.
Chico primeiro repete a recomendação que ouviu de Flávio
Costa:
- Nosso treinador disse
a Bigode que exigia disciplina. Se houvesse derrota com indisciplina, o
indisciplinado seria o responsável. Bigode, então, modificou o estilo de jogo.
“Quando o Brasil estava
ganhando de 1x0, tive um pressentimento: o Uruguai iria ganhar o jogo. Lá
dentro do campo, pedi o apoio de Zizinho e Ademir porque eu ia tirar o Obdúlio
Varela de campo. Todos nós sabíamos que Obdúlio Varela era chave do time do
Uruguai. Um jogador que exercia comando, o líder absoluto. Eu conhecia bem o
gênio daqueles uruguaios. Bastava que eu desse uma entrada desleal no Obdúlio e
pronto. Tenho certeza que ele não resistiria. Mas aí meus companheiros
perguntaram se eu tinha esquecido a ordem da disciplina dentro do campo”.
Chico lembrou outro
detalhe importante.
- Nós estávamos concentrados
na estrada Niemeyer. O contato com os jogadores era difícil. A condução era
dificílima. Naquela época, pouca gente tinha automóvel. Não sei porque a
concentração foi mudada para o Vasco em São Januário. É aí que entra o dedo da
direção, nesse erro. Passou a existir uma frequência diária de visitantes na
concentração. Tínhamos que fugir porque estávamos cansados de tanto dar
autógrafos. Atender os torcedores era prazer, uma alegria, porque a gente sabia
que essa gente tinha vindo de longe. Tínhamos de atender, mas aquilo estava nos
prejudicando. Sem dúvida, a movimentação na concentração era maior do que
deveria. Evidente. Houve reuniões e apresentações de políticos na concentração.
Nenhum jogador participou da mudança da concentração para São Januário. Não
fomos ouvidos. A mudança foi automática. Quando vimos, já estávamos
transferidos. O estádio de São Januário era uma concentração boa – ótimo, até -
mas ficava num ponto de fácil acesso. Então, a mudança nos trouxe prejuízo.
Éramos apresentados a vereadores, deputados, candidatos. A politicagem nos
prejudicou.
(parte
do depoimento de Chico para o livro de GenetonDida
o garoto de ouro do Flamengo.
A estreia de Dida no
time principal, foi em 1954, contra o Vasco, no Maracanã. Era o chamado jogo
dos invictos do turno e o estádio estava repleto (160 mil pessoas). E o Dida contou como
aconteceu.
- Só fui avisado de que
iria entrar, na véspera do jogo. E, é claro, me emocionei. Também olha o time:
Garcia. Tomires e Pavão. Jadir. Dequinha e Jordan. Joel. Rubens. Índio. Eu e
Babá. No ataque, além de Joel. Rubens e Índio, ainda eram titulares o Benitez e
Zagalo. Quando Benitez se machucava, o Evaristo entrava no seu lugar. Mas
acontece que Benitez e Evaristo se machucaram ao mesmo tempo. Então tive a
minha chance. E o Fleitas Solich colocou também o Babá, que jogava comigo nos
aspirantes para ele me dar apoio. No final ganhamos de 2x1, gols de Rubens e
Índio. Em seguida, veio o Fla-Flu, zero a zero, que também joguei. Depois
Evaristo se recuperou e voltou a posição. Só entrei no time outra vez contra o
Olaria quando marquei três gols. Daí em diante, fui me firmando como titular. O
curioso é que só fui artilheiro em 1955, com 16 gols, no time de cima e 24 nos
aspirantes.
Tempos da Seleção
Brasileira em 1958 teve uma das suas maiores alegrias, ao passar a titular do
time que estreou contra a Áustria na Copa da Suécia, onde sofreu, também, a sua
maior decepção que o futebol lhe trouxe.
- Depois de ganhar a
condição de titular, mesmo machucado no tornozelo, estreei na Copa contra a
Áustria, ainda sem totais condições. Joguei evitando os choques, abrindo
espaços para os companheiros. Mas, apesar da vitória, não me pouparam críticas.
Houve que me chamasse de covarde, omisso e medroso. Entre eles, Leônidas da
Silva, como me contaram depois. Logo ele, que tinha sido meu maior ídolo, o
melhor jogador do meu time de botão, nos tempos de garoto. Do que ele fez
naquela época não esqueci até hoje e não o perdôo. Carreguei aquela fama por
muito tempo e isso foi responsável pela pior fase da minha carreira. Depois,
perdi a condição de titular, já que contra a Inglaterra entrou Vavá. Quando a
crise acabou, isso já no campeonato carioca, voltei a marcar gols e jogar
normalmente. Fiquei no Flamengo até 1963, indo para a Portuguesa de Desportos,
nos dois anos seguintes, e jogando mais dois anos pelo Junior de Barranquila,
da Colômbia. Parei de jogar em 1968.
João Saldanha
Jogadores brasileiros atuam dopados
João Saldanha aponta nomes.
Paes Barreto garante que só usava sal. Ex-presidente
acusa Dr. Hilton Gosling.
Confirmando que os jogadores
de futebol usam drogas em campo, uns por ignorância, outros com olho grande nos
“bichos” e outros mais por interesses dos próprios clubes, o comentarista João
Saldanha deu a nota de sensação no inquérito instalado contra o tráfico e o uso
de entorpecentes no País. João Saldanha fez questão de frisar que falava como
ex-técnico e mais de 20 anos de experiência em vários esportes.
Saldanha começou explicando
que o uso de psicotrópicos (calmantes e estimulantes), injetáveis ou em
comprimidos, no Rio ou em São Paulo, tem como objetivo colocar o jogador em
campo na plenitude de suas energias. Afirmou que o uso de estimulantes foi
incrementado após a última Grande Guerra, quando surgiu anunciado como droga
miraculosa o Perventin. Disse que o finado Heleno de Freitas usava e abusava
dessa droga, tendo sucumbido vitima dela.
Para Saldanha, a prática de saunas, às segundas feiras, por iniciativa
dos clubes ou dos próprios atletas, é visando a desintoxicação do organismo, em
conseqüência do uso do psicotrópicos.
Exemplificou o comentarista que, no campeonato carioca de 1948, por
ocasião do jogo Botafogo e Madureira, em Conselheiro Galvão, ele,
inadvertidamente, tomou um café que (foi informado mais tarde) continha uma dose
concentrada de cafeína. Resultado: ficou dois dias sem dormir. Revelou que o
mesmo aconteceu com o técnico Tim quando estreou no Guarani de Campinas. Por
causa disso, Tim proibiu que fosse servido café, chá ou laranjada antes dos
jogos. Saldanha ainda comentou que quando era técnico do Botafogo, no jogo em
que seu clube goleou o Fluminense e conquistou o titulo de campeão, o time
estava quase todo dopado. Apenas Nilton Santos, Garrincha e Servilho não usaram
drogas. Disse ainda que Paulinho estava dopadissimo. Paulinho Valentim fez
cinco dos seis gols do Botafogo naquela tarde. Para relembrar o time do
Botafogo daquela tarde foi Adalberto. Beto. Tomé. Servilho e Nilton Santos. Didi e Pampolini.
Garrincha. Paulinho. Edson e Quarentinha.
O médico Nilton Paes Barreto,
do Fluminense, que teve seu nome arrolado entre os depoentes, disse que jamais
fez uso de estimulantes nos atletas em toda sua carreira. Confirmou, porém, que
nos jogos importantes dava uma pitada de sal de cozinha aos jogadores do seu
clube, mais por motivos psicológicos do que por outra coisa. E acrescentou em
tom de brincadeira – Se sal de cozinha dopa, eu sou o maior dopador de todos os
tempos.
O ex-presidente do Bangu,
Fausto de Almeida, discordou ao depor na Comissão de Inquérito contra o uso de entorpecentes.
Fausto afirmou que a “escola de doping” ou “o milagroso sistema de recuperação
rápida e estimulante” foi criado por Dr. Nilton Paes Barreto, cujos
ensinamentos foram assimilados pelo Dr. Hilton Gosling. Disse ainda que quando assumiu a presidência
do Bangu, em 1957, ali se fazia uso abertamente de estimulantes e afirmou que
uma de suas primeiras providências foi substituir quem se encontrava à frente
do departamento médico. Segundo Fausto de Almeida quem o advertiu sobre os
problemas foram os jogadores Zizinho e Nivio.
Entretanto, os craques Zizinho e Nivio desmentiram o presidente e
defenderam o Dr. Hilton Gosling. Zizinho acusou Dr. Nilton Paes Barreto,
apontando-o como aplicador de “doping”.
Reportagem da Revista do
Esporte de 1963
PAULO CESAR CAJU
Quando ele diz que
superou o sistema, a máquina montada sobre os oprimidos, Paulo Cesar se refere
à briga que teve com André Richer, diretor da CBD, e Cláudio Coutinho, técnico
que o ressuscitou para a Seleção, nas eliminatórias de 1977, e que depois
também se enquadrou nos esquemas do futebol. Sabe que foi banido porque
reivindicou bichos melhores contra Peru e Bolívia o mesmo argumento que afastou
Marinho Chagas.
- Lembro da reunião
como se fosse hoje. Richer foi ríspido na defesa dos interesses da CBD e eu
respondi à altura. Não levo desaforo para casa. Paulo Cesar ouve novas
acusações: mal profissional, porque arruma contusões para não jogar quando há
corridas de longas distâncias nas Paineiras, foge dos jogos nos campos do
interior e não cumpre as determinações táticas.
- Se sou mesmo tudo
isso, como consegui ser campeão em todos os times que defendi? Inclusive o
Grêmio, que joga no interior, onde existem verdadeiros alçapões. Não gosto de
me exibir em campos que só servem pra peladas doidas e de baixa categoria. Os
melhores bailarinos do mundo se exibo em nos melhores palcos. No futebol
acontece o mesmo: o craque deve mostrar seu talento no Maracanã.
Muitas recordações ele
prefere esquecer para sempre, mesmo momento em que o adeus se aproxima
lentamente e começa a acuá-lo, a encher seu futuro de temores e incertezas. As
distensões, as torções, as pancadas são cada dia mais frequentes. Crescem na
proporção em que declina seu prestígio. É Paulo Cesar sentindo o peso da idade,
o correr dos dias que o afastarão dos campos e principalmente do Maracanã,
santuário e provável túmulo de uma carreira polêmica. Paulo
Cesar, negro de infância humilde que hoje, cheio de dinheiro, de autoproclama o
Muhammad Ali do futebol. Mas com uma diferença: saberá se retirar de cena no
momento certo.
Zizinho
Na Seleção Carioca.
No campeonato brasileiro de 1942
deu-se um fato que marcou muito o mestre Zizinho como jogador violento e
desleal para a imprensa paulista. Em jogada com o zagueiro Agostinho da seleção
de São Paulo e ídolo da torcida corinthiana, Zizinho saltou e caiu sobre a
perna do zagueiro paulista que havia se atirado de carrinho para tirar a bola
do craque carioca. Resultado do choque foi à perna quebrada do zagueiro
Agostinho.
Uma semana depois, um advogado e
duas testemunhas processavam Zizinho por haver inutilizado Agostinho. José
Padilha, como advogado do Flamengo, argumentou que futebol é assim, um jogo
violento e o lance pode acontecer com qualquer um. Depois o juiz ouviu o
pronunciamento de Zizinho.
- Bem, era uma bola dividida. Agostinho correu e eu também. A menina
estava entre nós dois. Ele entrou de carrinho e se a gente facilita acaba
levando a pior. Mas eu não quis inutilizar ninguém seu juiz.
O juiz não entendeu nada. Aquele
negocio de menina, carrinho e bola dividida, era tudo estranho para o juiz que
nada sabia de futebol. E ele pediu que Zizinho repetisse o depoimento. Zizinho
repetiu e o juiz continuou sem entender nada e solicitou que o jogador do
Flamengo contasse a história novamente. Zizinho irritou-se e perdeu a calma.
- Eu acho que o senhor está de mau humor, seu juiz. Porque não toma um
sal de frutas? O que não posso é ficar aqui repetindo sempre a mesma coisa.
Resultado: Zizinho foi condenado
a dois meses de prisão da qual se livrou por causa de um “sursis”.
(do livro: Mestre Ziza).
Friaça
Convocado para a seleção brasileira de 1950.
FRIAÇA NÃO ESQUECE A COPA
DE 1950.
Quando voltamos para
São Januário, eu, o Bauer e o Rui estávamos transtornados e ficamos dando
voltas em torno do gramado. Depois de um tempo, subimos para o dormitório e aí
apagou tudo. A coisa seguinte de que eu me lembro é que estava na porta de
hotel em Teresópolis. Eu não sei o que me aconteceu, mas peguei o carro e fui
dirigindo até lá. Acho que foi Deus que me guiou, porque eu estava fazendo as coisas sem saber direito.
Chegando lá, o porteiro
do hotel me reconheceu e começou a conversar comigo, mas eu não devia estar
falando coisa com coisa, porque ele chamou o doutor Magliardi e o doutor me
levou para uma casa de saúde. Minha família estava desesperada, todo mundo
procurando por mim, mas eu nem me lembrei de falar com eles. Eu estava
totalmente ausente, fora do ar mesmo, só me recuperei uns dois dias depois.
O SUPER ZÉ FOI TRAÍDO POR FALSOS AMIGOS
José Maria Rodrigues Alves foi
lateral do Corinthians campeão paulista em 1977 e um dos jogadores mais
queridos da torcida corinthiana. Sua lamentação foi vê sua carreira chegar ao fim
quando poderia ter sido mais longa e feliz. Em 1966 Zé Maria conheceu Zé
Roberto quando começou no Botucatu. Foi seu amigo, matou sua fome e o Zé
Roberto o fez sofrer como não se faz a um cão danado. Eram amigos inseparáveis.
Zé Maria abriu as portas de sua casa,
dividia com ele suas refeições, pagava as cervejas que tomava nas noites de
farra, e para complementar, ainda lhe emprestava dinheiro. Até que um dia
acabou sendo traído. Zé Roberto furtou alguns talões de cheques da bolsa do Zé
Maria e passou a usa-los, falsificando sua assinatura. Depois, para confundir o
inquérito policial, Zé Roberto ou alguém em seu nome, declarou levianamente que
Zé Maria era homossexual. E a sórdida trama acabou dando certo. Mal aconselhado
por dirigentes do Corinthians, Zé Maria retirou a queixa e, sozinho, passou a
viver um drama que duraria alguns anos. Ainda hoje, o Super Zé não sabe quem
lhe causou o mal maior: se o falso amigo ou os diretores que não deixaram o
craque tirar tudo a limpo.
Seu Durvalino, pai de Zé Maria,
sempre fez questão de administrar a carreira do filho. Em 1970 forçou a ida do
Zé para o Corinthians onde poderia ganhar mais. Comprou seus primeiros imóveis,
discutia renovação de contrato, recebia seus salários, pagava suas dívidas e
chegava a dividir o dinheiro com os outros filhos que ganhavam pouco. Depois da
morte de seu Durvalino Zé Maria se viu transformado no chefe da sua complicada
família. Sua casa foi invadida pelos
“amigos”, muitos dos quais somente se aproveitaram da situação. Todos os dias,
Zé Maria levava para casa com pelos menos dois amigos para comer e dormir.
Alguns, como Marco Antonio “Visgo”, chegaram a ficar mais de três meses. Depois
saiam se dizer nem muito obrigado.
Outros como Mirandinha, Augusto e o seu compadre João, abusaram da
hospitalidade e ainda deixaram dívidas para Zé Maria pagar. Pior que seus “amigos”, só as trapalhadas dos
irmãos. Tuta acabou seu Volkswagen que o Zé ganhou depois da Copa de 1970. Gil,
Moisés e Modesto se encarregaram de destruir um Corcel novinho. Até suas roupas
eram de uso comum. Com seu jeito simples, o Super Zé nunca reclamava de
nada. Se seu Durvalino estivesse vivo,
talvez fosse diferente. Zé Maria não teria de assumir a complicada família e,
com certeza, teria extraído melhores frutos de sua bem sucedida carreira. Mas,
na falta de uma orientação segura ele deixou de assinar contratos realmente
bons.
Josephine, que o amou
intensamente, declarava para todos que, se podia dizer tudo do Zé Maria, menos
que ele não é homem em todos os sentidos.
Tão homem que tinham muitas namoradas. Mas, entre as tantas namoradas, o
Zé foi escolher Siomara, mesmo contrariando sua família. Para seu Durvalino,
aquele casamento era coisa de bruxaria. Para Josephine, um caso de amor
unilateral. O irmão Marco Antonio, dizia que era um homem bom dominado por uma
mulher terrivelmente ambiciosa. Quando o Zé estava presente, Siomara tratava
todos muito bem. Quando ele estava ausente, maltratava muito mal a mãe do
craque, a quem chamava de “negra boba”.
A família sabia que não ia dar certo. E realmente não deu. Zé Maria
casou apaixonado, mas sua alegria durou poucos meses. Siomara o proibiu de
reunir seus amigos para as churrascadas, a família se afastou e as brigas
começaram a ficar mais sérias. Até que, grávida de oito meses, Siomara
abandonou a casa e procurou a policia para acusar o marido de agressão física.
Zé Maria nega. A acusação foi apenas um pretexto pra ela sair de casa. Ele
ainda afirma que o erro foi não perceber, antes do casamento, todos os
problemas que poderiam existir entre ele e Siomora. Estava muito ocupado, resolvendo os problemas
da família e da própria mulher.
-
O Zé é bom demais. Tão bom que ás vezes chega
a ser bobo. Essa declaração foi do irmão Gil, com autoridade de quem sempre deu
muitas dores de cabeça ao irmão.
Revista placar
Memórias de Mário Américo
Gentil Cardoso,
bom técnico e mau caráter
Em 1951 estava chegando o fim
do grande Vasco, apesar de que, ainda por mais dois anos, ele manteria parte do
seu poderio. Quando Oto Glória assumiu o
cargo de técnico encontrou mais obstáculos do que esperava. Os jogadores eram
experientes, malandros, mal acostumados, difíceis portanto, sobretudo para um
técnico como Oto Glória, na época um pouco ingênuo. Mudamos a concentração de
Uruçanga para uma casa do cantor Carlos
Galhardo, em Jacarepaguá. Perto da casa
havia uma grande mata e, no centro dela, um botequim de madeira com muita
cachaça. E era apenas eu para tomar conta de todos. Resultado: alguns deles se
enfiavam pelo mato e iam até o boteco encher a cara. Eu disse alguns?
Enganei-me. Eram quase todos. Os únicos que permaneciam na concentração eram o
Tesourinha e o Maneca. Como não poderia deixar de ser, o campeonato foi um
desastre para o Vasco.
Gentil Cardoso sucedeu a Oto
Glória. Bom como técnico, mas mau como caráter. Gentil era inclusive mentiroso
e falso. Tanto assim que, pelo menos naquela época, não conseguiu ficar mais de
um ano no mesmo clube, ganhasse ou não o
campeonato. Em 1952 houve um problema sério, quando ele tentou tirar do time
titular os jogadores Augusto, Danilo, Jorge, Tesourinha, Ipojucan e outros. As
mulheres desses jogadores foram São Januário e botaram ele na parede. Com
intimações como esta:
-
Se nossos maridos não voltarem ao time, vamos
dizer a todo mundo, inclusive a imprensa, que você anda cantando a gente.
No dia seguinte, Gentil
recolocou todos no time. Ele sabia que no final do campeonato, seria
substituído por Flávio Costa e fazia
tudo para brilhar. Foi nessa época que ele mandou buscar um macumbeiro na Bahia
e transformou a vida de todo mundo. O pai-de-santo era doido. Seguia-nos por
toda parte com uma espada de São Jorge na mão e fazia Gentil Cardoso andar com
outra. O fim de Gentil no Vasco seu deu
depois de um telefone do técnico para o Nascimento do Bangu para onde ele
queria se transferir. O telefone tinha extensão e, um diretor do Vasco ouviu
tudo. Pouco depois, ele saiu escondido, mas quando voltou a porta estava
fechada. Foi até a minha janela e chamou:
-
Pombo, Pombo, sou eu, seu chefe. Abra aporta
pra mim.
Eu fui até a cozinha e dei de cara com o diretor sentado
atrás da porta. Ele mandou que eu voltasse para o quarto e abriu a porta. De
longe a gente ouvia briga. O último jogo
do campeonato foi contra o Olaria na rua Bariri. Ganhamos por 1x0 com um gol de
Sabará nos últimos minutos. Fizemos a
volta olímpica com o macumbeiro exibindo sua espada e o Gentil Cardoso também.
Quando ele chegou perto do túnel os dirigentes gritaram para o técnico que não
adiantava festejar, ele estava despedido.
DARIO
No começa da sua
carreira, Dario encontrava-se encostado no Atlético Mineiro. Ninguém lhe dava
bola. O técnico Iustrich, um dia, aproximou-se e abriu o jogo.
- Dario não sei o que
fazer com você. Ninguém do Atlético te quer e nenhum outro clube se interessa
pelo teu passe.
- Mas, seu Iustrich o
senhor nunca me deu uma chance. Só me deixa entrar quando faltam cinco minutos
para acabar o jogo. O dia que começar o coletivo e senhor vai ver do quer o
Dadá é capaz.
Mesmo sabendo que
aquilo não levaria a nada, o treinador ficou com pena e deu a chance pretendida
por Dario. Na metade do coletivo os reservas já ganhavam de 2x0, dois gols do
Dario. Iustrich se surpreendeu.
- Que é isso Dario? O
que aconteceu? Você nunca jogou desse jeito!
- Eu falei pro senhor.
Agora me põe nos titulares que viro este coletivo.
Iustrich topou o
desafio. E os titulares viram para 3x2. Três gols de Dario. Depois desse
treino, Dario participou do tri campeonato mundial da Seleção Brasileira em 1970,
acumulou títulos nacionais e regionais, jogou nos quatro cantos do país e foi
artilheiro por onde passou. Virou o Dadá Maravilha.
MARINHO PERES
Na Copa de 1974,
reviveu ao lado de Luiz Pereira uma dupla de área que se revelou no São Bento.
Era a chance de consagrar-se, de confirmar o talento que vinha exibindo no
Santos. Mas o Brasil fracassou na Copa e poucos jogadores escaparam ilesos
daquele desastre. Um desfecho melancólico, mas absolutamente coerente como
clima que dominava a delegação brasileira na Alemanha.
- Havia um inconcebível
duelo de vaidades entre Marinho Chagas e Leão – afirmava Marinho – Os dois e
mais alguns cujo nome prefiro não citar, só acordava para dar entrevistas e
aparecer na TV. Em campo pouco produziam para o time. Depois das derrotas para
a Holanda e Polônia, foi uma vergonha. Todo mundo se apressava em dar
entrevista e jogar a culpa nos outros companheiros. Mas os atacantes tivemos
muito a ver com o nosso fracasso. Perderam gols e não ajudaram na marcação como
havia sido estabelecido na preleção.
Os erros daquela
seleção, segundo Marinho Peres, começaram muitos antes do time disputar a
primeira partida na Copa. Durante a preparação no Brasil, a equipe era escalada
de acordo com o Estado onde iria se apresentar. Jogo em São Paulo, predominava
os jogadores paulistas. Se era no Rio, jogavam os cariocas e assim por diante.
- Durante os 60 dias,
um longo e desumano regime de concentração, só tivemos dois dias de folga. Um
negócio altamente contraproducente tanto para os solteiros como para os
casados. Então era um tal de passar filmes eróticos às escondidas que não
acabava mais. Até guardas de segurança serviam de intermediários na compra de
revistas pornográficas e o que dava de gente se masturbando era incrível. Aí,
amigo, não há preparação física que aguente.
Depois do trauma da
Copa, restou-lhe o consolo, ao menos de se transferir para o Barcelona de
Johann Cruyiff, o holandês que liquidou o Brasil na Copa da Alemanha.
TESOURINHA
O ano de 1949 traz uma
grande alegria e uma imensa tristeza. A alegria é por ter sido escolhido o Melhorar dos Craques do Brasil, um
concurso nacional com a participação das torcidas. No dia 19 de janeiro, uma
multidão posta-se à frente de sua casa, As 6 horas da tarde quando a Rádio
Nacional anuncia o resultado e ele vai a janela comunicar que está eleito, a
torcida invade o pátio. Tinha recebido 3.888.840 votos e o concorrente mais
próximo, o príncipe Danilo, do Vasco, com 3.388.968 votos. Tesourinha ganhou um
apartamento da Tijuca.
Dali para frente foi só
tristeza como jogador do Internacional. O joelho direito o incomodava muito.
Quantas vezes os diretores lhe pediram para entrar no sacrifício? Mas uma vez
perdido o titulo para o Grêmio, era ele o maior culpado. “Está mascarado. Quer
ir para o Rio” - diziam muitos dos que, tempos atrás, viviam abraçados a ele.
Decepcionado, sentiu que estava acabado aquele relacionamento com o clube em
que, por dez anos, jogou por muito mais do que um ordenado.
Em dezembro, estava
vendido ao Vasco por 300 contos. No torneio Rio São Paulo de 1950, num jogo
contra o Corinthians, Belfare caiu sobre o joelho, e ele não voltou a ser o
mesmo. Esteve convocado para a Seleção Brasileira que disputou a Copa do Mundo.
A cada treino o joelho inchava. Os médicos, Amilcar Giffone e Paes Barreto,
olhavam-no em silêncio, penalizados. Não havia outra saída: Tesourinha foi
cortado.
Ele voltou para Porto
Alegre. Esperava que dirigentes do Internacional estivessem lhe esperado. Não
estavam. O Presidente Joaquim Difini comunicava a seus diretores. “Se ele
entrar por uma porta, eu saio pela outra”. Um dia, passeava pela rua da praia e
topou com Aparício Viana e Silva, conselheiro do Grêmio – “Te querem lá”.
Informou o Aparicío – “Mas como? E o preconceito?”. E o conselheiro respondeu –
“Tem uma ala muito forte que quer acabar. Tu servirias para um golpe
psicológico. Nome nacional, ex jogador do Inter, sabe como é”. Tesourinha
pensava em aceitar. Mas como calar o coração? Como encarar os amigos do peito que
acostumaram a vê-lo com a camisa vermelha? Por outro lado, uma frase lhe
martelava o cérebro – “Se ele entrar por uma porta....” .
No dia em que estreou,
o vice-presidente do Grêmio, Luís Assunção, declarou ao Correio do Povo –
“Tesourinha acabou com o arianismo no Grêmio. É um abolicionista que o Vasco
nos mandou. Tesourinha ficou no Grêmio
de 1952 a 1955.
De Divino Fonseca para
a Revista Placar.
MEMÓRIAS DE MÁRIO AMÉRICO
O Vasco estava com tudo. Tinha
dinheiro, tinha torcida e muita sorte, mas nem naquele ano de 1946 conseguimos
o titulo. Com a surpreendente saída do técnico Ondino Viera, o time se
desorientou e perdeu um pouco do entrosamento. Ondino não aceitou a oferta de
renovação do contrato e foi embora, sendo substituído por seu auxiliar Ernesto
Santos. Não deu certo. Ernesto era um ótimo técnico, sabido tudo, mas era bom
caráter demais para agüentar um clube grande. E, além de tudo, era bom e
ingênuo. Só tinha que ser engolido, porque aquela turma de raposa só entendia
uma linguagem: a da porrada. Logo Ernesto saiu e o Vasco contratou Flávio
Costa, outro homem duro como Ondino. Flávio assumiu o time no meio do caminho e
não teve tempo de recuperar o grupo. Já no ano seguinte as coisas melhoraram,
principalmente com a volta de Ademir Menezes, um dos maiores goleadores que vi
em meus quarenta anos de futebol. Novamente entrosada e disciplinada, o Vasco
deu um passeio em todo mundo e foi campeão invicto.
A alegria foi obscurecida logo
depois, por um acontecimento muito doloroso: a morte do nosso querido
companheiro Isaias, aquele centro avante de sete fôlegos que desmoralizava
quase todos os goleiros do Brasil com seus chutes violentos e traiçoeiros. Nós estávamos nos preparando para uma viagem
ao Uruguai, onde haveria um torneio e o entusiasmo era geral. Uns dias antes,
Isaias me procurou na concentração. Fiquei pasmado ao vê-lo. Não era possível.
Diante de mim, rouco e triste, estava um fantasma. Quase não o reconheci, tão
magro ele estava. Isaias respirava com dificuldade. Sentou-se e balbuciou:
-
Estou muito mal, Mario, acho que vou morrer.
Levei-o
imediatamente ao Dr. Amílcar Gifffone, mas, ao que parece o médico não se
impressionou tanto quanto eu. Deu-lhe um remédio e mandou que ele voltasse no
dia seguinte. Ele voltou e eu mais uma vez me espantei. Já nada mais restava
daquele negro raçudo e alegre que um dia, quando jogava pelo Madureira, eu vira
marcar quatro gols no poderoso Fluminense. Já não era mais aquele Hercules de
Ébano que um dia marcou um golaço de letra também contra o Fluminense. O que
estava a minha frente, agora, era um moribundo, um esqueleto ambulante. O
médico diagnosticou tuberculose galopante e ele foi internado num Hospital de
Petrópolis, onde deveria receber uma injeção de ouro que fora encomendada nos
Estados Unidos. Mas não chegou a toma-la. Sua família, contrariando as ordens
médicas, tirou Isaias do Hospital para tentar uma cura num centro espírita.
Isaias
morreu quinze dias depois. Ocorreu, então, um fato que só de lembrar me enche
os olhos de lágrimas. Nós tínhamos um amistoso marcado contra o Olaria,
justamente na data do enterro. Para
surpresa nossa, dirigentes do Vasco não quiseram adiar o amistoso. No
sepultamento de Isaias, só Ademir Menezes se fez presente, mesmo assim, porque
estava contundido e não tinha condições de jogo para enfrentar o Olaria. Essa é
uma mágoa que tenho do Vasco da Gama.
ZIZINHO
Zizinho terminou a
carreira dignamente. O futebol fascinante, irresistível mesmo, não evitou
vexames inesperados. Num jogo entre carioca e paulista, no Pacaembu, Agostinho
ganhou uma disputa com Jair, mas deixou que a bola se distanciasse. Zizinho
vinha chegando e Agostinho, apelou para o carrinho. Foi tudo muito rápido:
Zizinho escorou a perna do lateral e ouviu um, estalo seco.
“Quebrou a perna em duas”, afirmavam alguns.
“matou”, diziam outro.
O certo é que a fratura
afastou Agostinho dos campos e Zizinho ganhou a fama de violento e desleal.
Afonsinho processou o companheiro. Zizinho defendeu-se perante o juiz disse que
o lance foi casual. Mas o juiz julgou de acordo com os autos, que resumiam uma
lamentável realidade: um homem impossibilitado de continuar sua carreira,
atingido no trabalho por um companheiro de profissão. Zizinho acabou condenado,
mas beneficiado pelo susis, pôde seguir jogando.
Tempos depois, num
Flamengo x Bangu, disputou uma bola com Adauto e o estado que abalou o Pacaembu
repetiu-se em Moça Bonita. Só que, desta vez, a vítima era Zizinho.
“Castigo!”, afirmavam alguns.
“Coisa feita”, juravam
outros.
Perna gessada, sem
previsão de quando voltaria a jogar, houve quem o aconselhasse: “Processa!”.
Zizinho ficou irritado: “Processar o Adauto? Se eu fizer isso estarei passando
recibo de que atingi o Agostinho de proposito”. A ideia morreu ali. O drama do
jogador, não. Ele voltou meses depois, mas ainda sentia dores. Ouvia sempre os
mesmos comentários: “É assim mesmo. Dói um pouco depois passa”. Só que as dores
não passavam. Novas radiografias mostravam que a fratura não estava
consolidada, havia “uma rachadura” como dizia de maneira engraçada Tião. Zizinho
teve que gessar a perna novamente. Meses depois, a volta. Ele voltou melhor.
De Fausto Neto para a
Revista Placar.
SPINELLI
Spinelli era um jogador que atuou nol Fluminense e no Botafogo do Rio de Janeiro. Como jogador não tinha muitos recursos, apesare de ter jogado em grandes clubes como titular. Pelo que conta a história, Spinelli era um bom aliciador.
Nas
Memórias de Jurandir, goleiro do Flamengo nos anos quarenta, é contada uma
história que envolve o ex-tricolor. Jurandir foi taxativo – “Spinelli
procurou-me para uma engavetada”.
Na
semana do clássico Flamengo e Botafogo, a grande sensação era a partida de
aspirantes que decidiria o titulo de campeão. Afastado do time há algumas
semanas, Jurandir recebeu um telefonema do técnico Flavio Costa que pretendia
utilizá-lo no time de aspirantes. O goleiro começou a treinar forte e se
preparar para o grande jogo.
Às
vésperas da partida Jurandir foi procurado por Spinelli, que já tinha fama de
subornador. Ele trazia uma ótima proposta para amolecer o jogo de aspirantes
para o Botafogo.
Dizia
Spinelli – “Vou precisar de você. O Botafogo precisa ganhar o jogo de
aspirantes de qualquer jeito, e estou incumbido de sondar às possibilidades”.
Jurandir
respondeu – “Vá dizendo...”
E
Spinelli continuou – “Você quer vender o jogo?
Jurandir
respondeu – “Vender eu não vendo, pois o jogo não é meu, é de todos nós. Além
disso, para o vencer o Flamengo, o Botafogo não precisa de mim. Pode ganhar
sozinho”.
E
o dialogo continuou –
-
Enfim, você
pensa. Se resolver favorável, estou autorizado a lhe pagar dez mil cruzeiros.
-
É de ordem do
Bebiano?
-
Não. O doutor
Bebiano não tem nada com isso. É de ordem de um diretor de Departamento Amador,
cujo nome não posso dizer.
Jurandir
deixou Spinelli e foi embora. Mais adiante encontrou o companheiro Vevé, ponta
esquerda do Flamengo, e lhe contou o acontecido. O velho amigo Vevé deu uma
enorme gargalhada e disse para Jurandir que era brincadeira de Spinelli. Que o
Botafogo não iria gastar tanto dinheiro em um jogo de aspirantes. O goleiro não
disse nada e aguardou o jogo. Através do telefone, Spinelli ainda procurou
Jurandir que sentiu que a oferta era para valer. Ele desligou e esperou o domingo.
E
Jurandir concluiu- “O Botafogo venceu por 1x0 e se sagrou campeão. Spinelli
estava nas arquibancadas e fiz que não o vi. Ele também fingiu que não me viu.
Mas, joguei bem e o Botafogo venceu porque era melhor”. (Gazeta Esportiva de
São Paulo).
ZÉ MARIO
Zé Mário afirma que
houve má fé do Grêmio.
O Grêmio propôs ao
Vasco a compra de Zé Mário por 3 milhões de cruzeiros. O apoiador vascaíno
acreditava que, enfim, havia feito um bom negócio na vida. E fez seus planos: jogariam
dois anos em Porto Alegre e voltaria ao Rio de Janeiro para encerrar sua
carreira jogando pelo Bonsucesso, clube onde começou. Aos 30 anos de idade, Zé
Mario não poderia proposta melhor, e só com os 15 por cento que receberia do Grêmio
poderia ficar tranquilo com relação ao futuro. Mas, para sua surpresa e do
Vasco também, ao fazer exame médico no clube gaúcho, foi vetado e a negociação
acabou desfeita. Zé Mário não entendeu o motivo de sua dispensa, preferindo
acreditar que tenha sido pelo preço de seu passe, pois a desculpa dos exames
não convenceu.
“Confesso que não
entendi porque não me aprovaram no exame médico. Só pode ter sido má fé do
clube gaúcho. Quando fiz o exame com o médico Luiz Marchek, ele nem sequer
pediu uma radiografia ou me exigiu testes físicos. Limitou-se a apalpar meu
joelho e garantiu que estava tudo certo e que não havia derrame. Só mais tarde
é que soube que não tinha sido aprovado, pois, segundo o médico, precisaria de
um prazo de dois a seis meses para me recuperar”.
EDER JOFRE
A rigor, essa luta
excepcional não começou exatamente naquele dia, 18 de agosto de 1960, mas dez
dias antes, no momento em que Eder chegou aos Estados Unidos com excesso de
peso para a categoria. Ele ficou obrigado a passar vários dias sem comer. Isso
aumentou a preocupação, que já era grande, pois enfrentar um lutador muito
forte. No dia da pesagem passou quase um quilo do limite permitido. Teve um
choque muito grande. Já estava desgastado, pois teve poucos dias para uma adaptação,
e enfraquecido, pois na véspera não almoçara nem jantara para atingir o limite.
De repente, surgiu aquela inacreditável necessidade de perder quase um quilo em
pouco mais de uma hora. Ele e seu pai, Aristides Jofre, voltaram às pressas
para o Hotel Alexandria, onde Eder envolveu-se em três quilos e meio de roupas
de lá e plástico e começou a treinar duro para suar muito. Fez o que
correspondia cinco ou seis rounds de muita movimentação. Conseguiu chegar ao
exigido na hora da pesagem oficial, só que estava mais morto do que vivo.
Voltou ao hotel, tomou sucos de frutas, mel, comeu doces e saladas. Descontou
um pouco e as 16 horas tomou outro lanchezinho. Voltou a descansar até hora de
ir para o Oympic Auditorium.
Eder Jofre nunca tinha
cruzado com Joe Medel, mas foi seu mais duro adversário. Na luta em Los
Angeles, Eder Jofre teve suas maiores emoções. Aquela luta foi tudo para Eder.
Lutou como um campeão. Se não aparecesse na carreira de Medel, acha que ele
ficaria invicto. Ele ganhou até do
Harada. E Eder ainda derrotou o Medel, mais uma vez, em 1962, em São Paulo. Na
luta de Los Angeles, Joe Medel foi um adversário duro que no segundo round Eder
quase foi a nocaute.
(Continua da quinta feira)
DANILO ALVIM
Na seleção tive meus
momentos de glórias. Lembro, por exemplo, que em 1949, tivemos uma conquista
que me gratificou particularmente, que foi a do Campeonato Sul Americano,
realizado no Rio de Janeiro. Esse campeonato serviu também para preparar o time
que disputaria a Copa do Mundo, realizado um ano depois. Não resta dúvida que,
em termos de seleção, uma das maiores emoções que vivi foi o campeonato de 50,
quando iriamos disputar, com o Uruguai, o título máximo, com a com a vantagem
de um empate para os brasileiros. Até o momento do segundo gol uruguaio, aquele
dia era para mim, e meus companheiros, uma mistura de orgulho, emoção,
deslumbramento. Eram várias sensações ao mesmo tempo. Após o segundo gol do Uruguai,
senti como se o mundo tivesse desabado. Parecia que eu tinha perdido um parente
muito chegado, tal a tristeza que me dominou. Aliás, com time todo. Aquela era
uma partida em que já estávamos vitoriosos por antecipação, por termos o melhor
time, a melhor campanha e grandes jogadores. Portanto, naquele dia, o povo
tinha ido ao Maracanã para assistir a vitória do Brasil, e não à disputa de uma
disputa de futebol. Na verdade, ninguém estava preparado para a derrota, nem o
público, e muito menos nós, jogadores. Então em poucas horas, passamos do
êxtase ao pesar profundo.
JULINHO
Julinho recebeu a maior
vaia de uma torcida. Aconteceu no maracanã antes de um jogo amistoso entre o
Brasil e a Inglaterra. Julinho nunca esqueceu.
“Eu e o Garrincha
disputávamos a posição. Ele era ídolo, campeão do mundo em 1948, endiabrado.
Mas estava muito gordo, fora de forma. Na concentração das Paineiras, onde
ficamos 10 dias, o técnico Vicente Feola me disse que eu ia jogar. Responde que
haveria muita vaia. Os fãs de Garrincha apareciam na concentração exibindo
faixas que exigiam sua presença no time”.
“No Maracanã, do
vestiário nós ouvíamos a torcida nas arquibancadas. E até o locutor do estádio
provocou. Foi anunciando a escalação: Gilmar. Djalma Santos. Belini. Orlando e
Nilton Santos. Dino Sani e Didi. Julinho...aí parou, deu uma pausa, para dar
ênfase as vaias. E elas foram de ensurdecer. Eu disse a Djalma Santos, esta
torcida vai engolir, vai engolir”.
“Mas eu tinha fé. Muita
fé. E ela me ajudou. Começou o jogo, em 10 minutos eu já tinha virado o
panorama. Dei um passe para Pelé entre as peras do lateral, o Pelé me devolveu
entre as pernas dele de novo. O lateral fechou as pernas e caiu, eu saí com a
bola. E aos 13 minutos fiz o primeiro gol, entrando na corrida para encher o pé
num cruzamento de Canhoteiro. Aos 25 minutos veio o segundo gol. Outra jogada
minha. Driblei o goleiro e chutei em diagonal, o Henrique completou de carrinho
para fazer o gol. Aí a torcida já estava comigo. Toda vez que eu pegava na
bola, eram aplausos. Nunca ou esquecer aqueles momentos. Pode não ter sido
minha melhor atuação na seleção. Mas, em termos de repercussão, aquele jogo
contra a Inglaterra foi o mais importante”.
ADEMIR MENEZES
Ele era um pesadelo
para a torcida do Flamengo, uma garantia para a Seleção Brasileira, um atacante
que muitos consideraram acima de qualquer marcação.
Ademir comentou sobre seu tempo de jogador de futebol nos
anos 50.
“Em 1950, depois de uma
paralização de doze anos devido à guerra, eu repetia Leônidas da Silva, como
detalhe de fazer um gol a mais. Foi também uma Copa de algumas contagens
extravagantes. A maneira de jogar mudara um pouquinho. Era a época da diagonal,
que Flavio Costa utilizou durante todo o seu reinado. Dois laterais presos,
Bauer e Danilo soltou no meio-campo, Jair e Zizinho indo e vindo, de acordo com
o lado da jogada, eu lá na frente, com função específica de marcar gols”.
“Eu dei sorte, sabe?
Tanto na seleção como no Vasco. Na seleção, estava entre Zizinho e Jair. No
Vasco, entre Maneca e Ipojucan. Mas a diagonal ainda manteve o futebol
descontraído e o centro avante tinha espaço para jogar. Ficava naquela de
esperar o lançamento, geralmente longo. Eu virava o corpo e, como tinha
velocidade, ganhava sempre na carreira. Como a marcação era pouco móvel, cada
um ficava com o seu, os zagueiros sofriam muito”.
“Mas, entre 1950 e
1952, um fato isolado marcou o começo das dificuldades para o centro avante.
Dificuldades que o chamado homem-gol já sentia quando enfrentava os times
armados por Zezé Moreira. O Botafogo trouxe um zagueiro argentino excepcional,
o Basso, logo depois da Copa de 50. Além de muitas qualidades técnicas e com
perfeita colocação em campo. Foi com Basso que comecei a perder terreno. Ele
não colava em mim, como os outros, e também não me acompanhava quando eu
procurava fugir da área para ser lançado. Marcava a área, a zona. O Basso sabia
que, encostando, poderia perder no pique. O que ele fazia era ganhar terreno,
obrigando-me a tentar o drible ou o passe para o lado”.
Luiz era reserva do titular Jurandir no gol do Flamengo.
Sempre que entrava, fazia defesas eletrizantes com saltos acrobáticos. Assim surgiu
o apelido “Luiz Borracha” que foi dado pelo locutor esportivo Ary Barroso. O
técnico Flávio Costa foi quem o lançou na equipe principal do clube rubro
negro. E foi ainda com Flávio que defendeu a seleção carioca e brasileira.
E foi num jogo contra o Botafogo
que aconteceu o lance fatal para o goleiro. A bola era para Luiz Borracha. Seu
companheiro Biguá se chocou com ele e na sobra Braguinha fez o gol do Botafogo.
Biguá olhou para Luiz Borracha com as mãos na cintura e o
jogou contra a torcida. Ali, em General Severino, sem saber, ele estava sendo
enterrado para o futebol. Dirigentes o acusaram de venal e ele terminou saindo
do time. Se transferiu para o Bangú. Depois passou pelo São Cristovão, jogou no
clube da Universidade de Caracas na Venezuela, correu meio mundo e, sempre que
alguém desconfiava, as portas se fechavam para o goleiro. Luiz Borracha
continua sendo vitima de uma injustiça de alguns dirigentes do Flamengo.
O lado exclusivamente humano
reclamava a injúria. Luiz Borracha era uma vitima. Nunca ninguém conseguiu
provar as acusações que lhe foram feitas. Mas, para que uma injustiça seja
reparada é preciso que haja o altruísmo da confissão de quem a cometeu. Oito
anos depois, Luiz Borracha voltou ao Flamengo como massagista, e dele, voltou a
merecer toda confiança. Naquele jogo de 1948, depois de uma derrota
inexplicável, dirigentes rubro negros resolveram antecipar o fim do seu
goleiro. Foi acusado e afastado do clube. O rotulo de venal acompanhou o resto
de sua carreira. E terminou como limpador de automóveis. Os dirigentes do
Flamengo de 1956 acolheram uma solicitação de Jaime de Almeida, antigo
companheiro de Luiz Borracha, e lhe ofereceram um cargo de auxiliar de
massagista no clube. Foi retirada a calunia que morava em seu nome e ele passou
a viver em paz. Luiz Borracha é um homem recuperado para a sociedade. Mas, seus
anos perdidos no futebol nunca ninguém pagará. Foi um preço alto demais para um
craque de um clube tradicional como o Flamengo, e das seleções carioca e
brasileira.
ALMIR
Bandido e idolatrado. Foi talvez o maior marginal do
futebol brasileiro. Mas dava a vida pela vitória. Por isso, foi ídolo de todas
as torcidas. Fez gol metendo a cara na lama, estremeceu o maracanã, armou
grandes brigas, quebrou pernas, não teve medo de nada e acabou assassinado.
Implacável, o tempo muitas vezes faz até os heróis
caírem no esquecimento. Poucos, na verdade sobrevivem na memória do povo, e um
deles é Almir Pernambuquinho, certamente o craque da raça mais passional da
história do futebol brasileiro. Em campo ele experimentou todas as emoções:
vencer era uma questão de vida ou morte e, se a violência não contribuía para
uma boa imagem, pelo menos lhe
assegurava gordas gratificações. Odiado pelos adversários e temido pelos
próprios companheiros, foi um antético anti-herói. Assim viveu seus 36 anos
incompletos. Como num faroeste, estava sempre desafiado a um novo duelo por algum desconhecido.
O zagueiro Helio, do América, ficou inutilizado aos
32 anos de idade num choque com Almir. Dizem que o estalo da perna foi ouvido
da arquibancada do maracanã. Para Almir, a cena se resumiu a uma simples
explicação: - Era ele ou eu – O episódio marcaria definitivamente sua carreira.
Cronistas carregavam o nome de Almir com qualificativos como “marginal”,
“bandido” ou “facínora”, expressões repetidas quando ele, com a cabeça cheia de
anfetaminas levou o Santos, em 1963, a ser bi campeão mundial de clubes, no
maracanã, diante do Milan. Intimidou os italianos com um pontapé na cabeça do
goleiro Balzarani e uma entrada violenta em Amarildo que foi jogado para fora
do campo. Se a imprensa o punia como covarde, a torcida o atirava aos céus.
Assim era Almir. Em constante estado de autopunição, não queria cultuar atos de
bravura. Tratava-se de um passional na luta pela sobrevivência.
Jogou no Sport, Vasco, Corinthians, Boca
Juniors, Fiorentina, Gênova, Santos, Flamengo e América. Entretanto, foi no
Flamengo que ganhou status de craque da
raça. Em sua concepção, aquela camisa, rubro negra como a do Sport, não podia
ser humilhada e nada o revoltava mais que a humilhação. No Flamengo fez um gol com a cara na lama,
contra o Bangu em 1966. A bola estava presa numa poça, mais próxima do goleiro
Ubirajara, e ele, herói daquela noite chuvosa, foi arrastando milímetro por
milímetro o rosto pela terra. O gol foi
registrado em página dupla
Foi esse homem incompreendido, que trilhou,
inclusive, caminhos condenáveis para se transformar em um craque da raça, que numa noite, durante uma
discussão de bar com homossexuais que insistiam em perturbá-lo, levou dois
tiros de uns desconhecidos. Estirado naquela calçada inunda de Copacabana,
ganhou apenas uma rosa vermelha atirada por uma mulher da vida. É que ela, só
ela, parecia identificar em Almir o que era o sofrimento de viver.
FELIX
Na Portuguesa de Desportos nunca conquistou um título de campeão. Quando
contratado pelo Fluminense, em 1968, ganhou os títulos do campeonato carioca
nos anos de 1971, 73, 75 e 76, a Taça Guanabara, em 1971 e a Taça de Prata, em
1970. Mas, de todas as suas glórias, só 22
jogadores tem igual, a Copa do Mundo de 1970.
Na Seleção Brasileira, Felix teve as emoções que nenhuma outra conquista
pôde lhe proporcionar em sua longa carteira. E não foi só o título, o momento
final da consagração, quando o juiz apitou, encerrando o jogo contra a Itália e
passando as mãos brasileira a posse definitiva da Taça Jules Rimet. Foi muito
mais que isso. Foram detalhes comovedores, momentos inesquecíveis, defesas
brilhantes, gols sensacionais. As emoções, em Guadalajara e na cidade do
México, aconteceram a casa dia, a cada jogo, a cada chute.
“Todos pensam que o meu maior momento foi na defesa que fiz contra a
Inglaterra, na cabeçada de Bobby Charlton, quando os ingleses mais apertava.
Porém, não foi; pelo para mim. Sei que naquela partida eu provei que sabia sair
bem do gol, que tinha reflexo e tranquilidade; que a tal defesa foi importante
para o time, mas, mesmo assim, não esse meu melhor momento daquela Copa do
Mundo. Aliás, não há um só lance, mas, sim, dois que me gratificaram ainda
mais”.
“Faltavam quatro minutos para acabar o jogo Brasil x Uruguai e vencíamos
por 2x1. A bola veio alta para a área e encontrou no caminho a cabeça do
atacante uruguaio Cubillas. E eu vi a bola entrando no ângulo. Seria o gol do
empate dos
uruguaios, o que nos obrigaria e disputa de mais 30 minutos de
prorrogação. Porém, fui lá em cima e consegui defender. A bola nem chegou a
sair de campo e fomos, em seguida, ao ataque, marcando o terceiro gol através
do Rivelino. Era a vitória assegurada em pouco mais de um minuto. Aquela defesa
e o gol no contra-ataque nos garantiu a passagem à finalíssima contra a Itália.
Esse sim, foi meu dias e foi meu momento de glória”.
RUI REI
Expulso no jogo final
do Campeonato Paulista, Rui Rei viu desabafar sobre ele o ódio de muita gente.
Ontem, se ele dava um drible ouvia os aplausos, se marcava um gol sentia a
vibração. Hoje, se fala, ninguém ouve. Se diz que não tem culpa, duvidam.
E Rui Rei, aos 24 anos
de idade, vive os piores momentos de sua carreira por ter sido expulso no
início da partida final contra o Corinthians, na disputa do título de campeão
paulista. Por causa das críticas violentas a até ameaças, passou vários dias
trancado em casa, sem disposição para sair. Dele, o mínimo que falam é que
provocou propositadamente a sua expulsão.
“Se discuti com o juiz
logo no início do jogo é porque não acreditava que pudesse ser expulso assim,
tão rápido. Não esperava mais do que uma advertência. Mas o que posso fazer?
Dulcídio Vanderlei Boschila não gosta de mim. Até cultivou o costume de me
chamar de macaquinho. Reconheço que caí numa armadilha, que fui ingênuo. Ele me
advertiu antes do jogo, ameaçou com uma punição se eu reclamasse. Queria que eu ficasse caladinho, sem agitar
os zagueiros como sempre faço. Mas eu lutava por um time e não podia aceitar
uma intimidade dessas. Levei um chute sem bola e reclamei. Vi o cartão amarelo
e gritei – Eu apanho e ainda tenho que ficar quieto? E ele puxou o cartão
vermelho – Agora eu pergunto: se fosse um jogador do Corinthians, teria
acontecido a mesma coisa? Nunca. Jamais!”.
Uma ocorrência que
talvez tenha prejudicado um pouco sua carreira.
“Não vejo as coisas
assim. Siou um grande artilheiro, faço gols e nunca tinha sido expulso antes,
com a camisa da Ponte Preta. Ou será que esses detalhes não serão levados em
conta pelos meus críticos? E eu ainda jogava sem contrato, com seguro. O que
houve ali, naquele dia, foi uma revolta natural a um jogador de sangue quente,
como eu. Se perdi a cabeça foi batalhando pelo meu clube".
(Reportagem de Brasil
de Oliveira para a Manchete Esportiva).
A INCRÍVEL HISTÓRIA DE BAUER
Bauer na Seleção Brasileira.
“Vim para ser campeão e voltei
para São Paulo no chão do trem”.
Bauer veio de São Paulo para o
Rio para ser campeão mundial de futebol. Jamais imaginaria que iria fazer uma
viagem de volta, derrotado e dormindo no chão de um trem.
Precavido, Bauer comprou uma
passagem de trem para domingo à noite. Queria fazer a festa com o pai e a mãe
em São Paulo – “Antigamente era assim, cada um cuidava de si. Então, comprei a
minha passagem de trem para depois do jogo com o Uruguai”.
Durante a semana, um repórter da
revista O Cruzeiro o procurou para
dizer que ele não poderia viajar no domingo para São Paulo. Haveria uma
comemoração com os campeões, os brasileiros, é claro. A missão do repórter era
acompanhar todos os passos de Bauer. Insistente, o repórter conseguiu convencer
Bauer a devolver a passagem de trem – “O repórter me obrigou a devolver a
passagem, para ter a certeza de que eu ficaria no Rio depois do jogo. Fui até a
Central do Brasil. Eu até já conhecia o homem do guichê, Seu Paixão. Recebi o
dinheiro da passagem de volta”.
E Bauer continuou – “Mas domingo,
quando a tragédia calou o maracanã, a comemoração virou pesadelo. Não tinha
revista, não tinha repórter, não tinha ninguém. E eu estava sem a passagem.
Naquele domingo o Rio de Janeiro morreu. Então, em companhia do falecido
Geraldo José de Almeida e de um amigo, voltei até a estação. A gente embarcou
no trem. Aquele fiscal que marca as passagens queria parar o trem porque eu não
tinha passagem. Queria que eu descesse. Conseguimos convencer o homem. A cabine
era de dois. Comigo três. Pedi um cobertor. Fui dormindo no chão. A verdade é
essa”.
E completou – “Quero dizer o
seguinte: sou católico, mas até hoje recrimino aquela missa que foi rezada às
sete horas da manhã para os jogadores, no dia da final da Copa do Mundo de
1950. Não perdemos por causa daquela
missa, celebrada como parte de um dia glorioso em que poderíamos ser campeões
do mundo. Mas a inconveniência do horário foi uma das causas”.
JAIR DA ROSA PINTO
Jair da Rosa Pinto tinha 28 anos e num domingo de 1949
enfrentaria sua ex-equipe, que estava mais forte do que nunca, enquanto seu
atual time vinha sendo formado por veteranos como Bria, Jaime, Gringo e
Esquerdinha. Dava para comparar? E ainda
tinha gente queriam que ele dissesse que ia ganhar.
Quando lhe perguntaram - Ganhamos do Vasco? - Jair levantou os olhos e viu a figura de Ary
Barroso, popularíssimo narrador de rádio e rubro negro fanático.
Ganhamos Jair? – Não sei não –
respondeu seu entusiasmo – Se Deus ajudar...
Abatido por causa de certas
incompreensões de que se julgava vitima e pessimista por conhecer o poderio do
Vasco, Jair estava desanimado principalmente com o técnico do Flamengo, Kanela,
que viera do basquete e criara para o jogo uma tática complicada. Ele queria
que Jair fizesse um tipo de marcação em Danilo que lhe exigiria uma intensa
mobilidade no gramado. Jair não gostava disso, discutiu com Kanela e pediu para
não ser escalado. No domingo, porém, voltou atrás e todas suas previsões
começaram falhando. O Flamengo fez 2x0 e partiu para uma goleada sobre o
imbatível Vasco da Gama. De repente, num ataque rápido, Jair ficou frente a
frente com o goleiro Moacir Barbosa, considerado o melhor do Brasil. O que se
passou naquele momento ninguém mais conseguiria reconstituir com exatidão.
Presença de espírito de Barbosa, que fechou o ângulo? Nervosismo de Jair? O fato é que a bola foi para fora. E a partir
daí ocorreram duas coisas espantosas: o Flamengo inteiro se encolheu, com Jair
se escondendo para trás do grande circulo, e o Vasco iniciou uma fulminante
reação, marcando um, dois, três, quatro, cinco gols. Final: Vasco 5x2.
Ary Barroso, transmitindo a
partida, não pôde conter sua indignação pelo que via. Aquilo era uma vergonha,
algo indigno das tradições rubro negras. Ao microfone, relembrou seu diálogo
com Jair na concentração. – “Um covarde” – bradava o locutor, para quem o
jogador, depois de sua resposta, de seu gol perdido e de sua omissão, não tinha
condições de defender o Flamengo. E incitou a torcida, pelo ar, a queimar a
camisa de Jair.
Até morrer, em 1964, Ary
Barroso garantiu que a camisa fora queimada. E até enquanto estava vivo, embora
detestasse abordar o assunto, Jair afirmava o contrário. A camisa realmente
queimada durante a revolta irada dos flamenguistas foi uma camisa qualquer,
apanhadas ao acaso para simbolizar o inconformismo da massa.
Jair ficou inconformado e não
poderia continuar no Flamengo nem no Rio de Janeiro. Uma semana depois, se
transferiu para o Palmeiras e recomeçou tudo outra vez.
(da Revista Placar)
PERÁCIO
A História tem o sabor
das coisas pitorescas da vida de Perácio. Aconteceu num trem, durante a viagem
de uma Seleção Carioca para São Paulo, onde se disputaria jogos decisivos do
Campeonato Brasileiro. Como geralmente acontecia, a viagem foi noturna. De manhã,
um cartola começou a acordar o pessoal: “Vamos pessoal, são 6 horas! Já é dia!
Um a um todos eram
despertados, orientados para que procurassem o banheiro antes que a maioria dos
passageiros o fizesse, prejudicando o café que a delegação inteira tomava em
conjunto. O center-half, também do Botafogo, dividia a poltrona com Perácio.
Foi um dos primeiros a correr para lavar o rosto e escovar os dentes. Perácio o
secundou. De volta, Martim notou que tinha esquecido a escova de dentes sobre a
pia. Correu para o bandeiro, empurrou a porta e surpreendeu Perácio escovando
os dentes – justamente com sua escova.
- Perácio, essa escova é minha - gritou Martim espantado.
- Desculpe Martim,
pensei que fosse do trem.
O falecido Mario Filho
– dono do Jornal dos Sports e autor de várias obras sobre o futebol brasileiro
- costumava dizer que era impossível escrever sobre Perácio sem se colocar o
humor à frente da bola. Tinha toda razão. De fato, além da lembrança, do chute
violento, o que marcou a imagem de Perácio foram suas histórias. Ou as
histórias a ele atribuídas. Ele reunia tantos lances engraçados, mistura de
humor, ingenuidade e desconhecimento. De poucas letras, comunicativo e alegre
como uma criança, Perácio foi sobretudo um ingênou. Uma pessoa que
conviveríamos cem anos sem um arranhão na amizade – diziam os amigos mais
antigos.
Parte da reportagem de
Fausto Neto para a Revista Placar.
HÉLVIO
Acusado de “gaveta”,
foi destruído quando ostentava sua melhor forma. Tinha amigos, muitos. As vezes
era carregado em triunfo. Enquanto a maré lhe foi favorável era um “Deus”
daquela gente. Humildes, vaidosos, ricos e pobres, bancos e pretos tinham nele
um ídolo. Pernas compridas, possuindo um físico elogiável, veio do Fluminense
para o Santos. Muito cedo ganhou o posto de titular. Mais tarde, também nas
seleções paulistas seu nome era obrigatório.
Com o tempo sua sorte
mudou. Aqueles mesmos diretores que o carregavam em triunfo, a mesma imprensa
que gastou manchetes com suas exibições, a mesma torcida que o adorava, mudaram
da noite para o dia.
- “Ele é um gaveteiro.
Vendeu tal jogo, Fez dois pênaltis em troca de dinheiro”.
Neste dia estava
iniciada sua via crucis. Não teve
mais sossego. Mesmo em sua melhor forma foi afastado da equipe. Falamos de Hélvio Peçanha, um dos
jogadores mais injustiçados do futebol paulista. Ninguém conseguiu provar se o
zagueiro era realmente gaveteiro. Falar, todo mundo falou. Acusar, todo mundo
acusou. Provar, ninguém provou. Fizeram com Hélvio uma das maiores injustiças
de todos os tempos. Sofreu calado. Deus e aqueles que realmente acreditam no
Hélvio, sabem que ele não errou, não se vendeu.
Depois de abandonar o
futebol e quando estava descansando em Santos, foi procurado pelo mesmo diretor
que tinha lhe acusado naquela tarde exigido sua dispensa do clube da Vila
Belmiro, foi procurá-lo para ser treinador para ser o treinador substituto de
Filpo Nunes. Hélvio bem que gostaria, mas com aquele diretor, não aceitou.
Mesmo assim, não tenho
mágoas de ninguém. Foi taxado de gaveteiro,
não era. Sofreu calado essas perseguições e perdoou todos aqueles que lhe
fizeram mal.
(Da Gazeta Esportiva).
RANULFO
Ranulfo foi um dos mais brilhantes jogadores do América
vice-campeão carioca de 1950. Jogando pela meia esquerda, era o termômetro dos
americanos. Pelas brilhantes atuações no
campeonato, Ranulfo terminou sendo convocado para a seleção carioca que
disputou o campeonato brasileiro de seleções. E Ranulfo foi titular com jogando
com Telê. Didi. Ademir e Nivio. Ranulfo Pereira Machado nasceu na Bahia, onde
começou jogando pelo Ipiranga. Em 1949 foi contratado pelo América do Rio onde
formou com Natalino. Maneco. Dimas e Jorginho, o ataque que levou o América ao
vice-campeonato carioca. Na decisão, perdeu para o Vasco da Gama, base da seleção
brasileira, por 2x1.
Jogando um belo futebol, começou
a ser procurado pela torcida feminina. E Ranulfo conheceu uma mocinha, filha de
um grandola que podia levar alguém para a cadeia. O jogador do América fez
bobagem, passou dos limites, foi denunciado e preso. Foi um crime de sedução
que acabou com sua carreira. Os pais da garota exigiram uma reparação. Ranulfo
não tinha certeza de que o filho era seu. A garota era daquelas que saia com
todo mundo. O craque resolveu se casar com outra mulher. A mulher que le
gostava. E aconteceu a vingança dos pais da garota levada. Veio o processo que
começou a mexer com Ranulfo. Sem ambiente no Rio de Janeiro, foi para a
Portuguesa de Desportos onde passou apenas três meses. Também passou pelo São
Paulo e depois se transferiu para o Noroeste de Bauru no interior paulista.
Nesse período que estava ausente do Rio de Janeiro, o processo correu a revelia
e Ranulfo terminou sendo condenado pela justiça carioca. Ele confiou nos
dirigentes do América que prometeram acompanham o processo e defender seu ex-atleta.
Os diretores não cumpriram o prometido e Ranulfo se ferrou. Foi preso e ficou
no Sanatório Penal de Bangú.
Cumprindo sua pena, Ranulfo via o
tempo demorar a passar. Parecia um pesadelo. Seu bom comportamento fez muitos
amigos na penitenciária. Jogava bola, organizava partidas, esperava o tempo de
quatro anos passar mais depressa. Um erro com uma pessoa errada fez o futebol
carioca perder um grande jogador de futebol.
BARBOSA
Quase cinqüenta anos depois
do desastre do maracanã, o goleiro Barbosa ainda convivia com aquele gol de
Gighia. Dia 16 de julho de 1950, decisão do mundial. Maracanã lotado. O maior
estádio do mundo foi construído para a vitória, estava completamente cheio e
pronto para comemorar o titulo de campeão mundial de futebol. Aos trinta e seis
minutos do segundo tempo com o resultado de 1x1, veio o lance fatal. Gighia
recebeu de Schiafino em profundidade, bate bigode na corrida, e chuta entre
Barbosa e a trave. Era o gol do titulo para os uruguaios, o gol do desespero
para os brasileiros. A derrota que transformou o dia 16 de julho de 1950, no
dia de finados para o nosso futebol. Um lance que marcou para sempre, um dos
maiores goleiros da história do futebol brasileiro – Moacir Barbosa.
Para o resto de sua vida, aquela tragédia permaneceu
vida na memória de Barbosa. Nunca deixaram que ele apagasse o lance fatal.
Duzentos mil torcedores comprimidos no maracanã e a lembrança é todo estádio em
silêncio, pessoas imóveis, caladas, tristes, recebendo com espanto e sem
acreditar naquele gol que permanece até hoje.
Barbosa foi culpado? Achamos que não. Não se pode
culpar um único jogador por uma derrota. Entretanto, a justiça dos torcedores
foi cruel no seu veredicto – Barbosa foi condenado por um crime que não
cometeu. Ele que estava a pouco menos de dez minutos para se transformar em herói,
de repente, passou a ser um eterno e desacreditado vice-campeão. Moacir Barbosa
faleceu e levou consigo a mágoa de ter sido crucificado pela opinião publica
por um erro que não foi somente seu.
MARINHO
Problemas com bebidas também
colocaram o ex-craque do Bangu, Marinho, à beira de um precipício no qual ele
despencou depois de uma tragédia. Em 1988, seu filho Marlon, de um ano, morreu
afogado na piscina da casa. Marinho entrou em uma roda-viva de noitadas que o
afastou de tudo que um dia havia importado para ele. “Depois da tragédia morava
na minha Mercedes, o porta-malas servia de guarda-roupa, e o banho era de
perfume Azzaro. Futebol já não tinha mais valor, os amigos corriam de mim, a
família foi embora. Fiquei só” – diz com olhos marejados.
A virada de Marinho, há 16
anos, se deve a um desconhecido. “Um dia, sentei num boteco, às sete da manhã e
comecei a chorar, desabafei com o dono. E ele me disse – Meu filho, peque seu
carro e vá ver a sua mãe. Conte tudo a ela – Obedeci, nem sei bem o motivo.
Minha mãe ouviu tudo calada e me pediu o telefone de Emil Pinheiro (presidente
do Botafogo). Eu não ia treinar há muito tempo, mas ele me recebeu de volta.
Voltei para os treinos e nunca mais sai”.
Hoje (2005), tem uma vida
tranqüila ao lado da segunda mulher, Liza Minelli, e dos filhos, Laís de
Minelli, 12 anos e Stevie Wonder, 14 anos jogando no infantil do Botafogo.
“Eles têm esses nomes, mas eu, Mario José, é quem sou o artista da família. Sou
um cidadão trabalhador, respeitável, mais feliz do que quando tinha dinheiro.
Trabalho bebo minha cerveja, durmo e acordo cedo. Meus quatro filhos se
orgulham de mim – referindo-se também aos dois do primeiro casamento, Marinho
com Priscilla.
Diz que tirou o “diploma da
vida” e que orienta os meninos dos juvenis do Bangu, onde trabalha a nove anos.
“Digo para eles fazerem o que eu falo, nunca o que fiz. No meu trabalho tento
primeiro formar o homem, para só depois treinar o jogador”.
(Da revista placar de 2005)
JURANDIR
Jurandir estava jogador
no Ferro Carril na Argentina. Ele comentou como tentaram suborná-lo.
“Certo dia estava
pregando fotografias em meu álbum quando bateram à porta. Alguém me esperava lá
fora. Encontrei um cavalheiro impecavelmente vestido, falando depressa e com
maneiras que demonstravam tratar-se de um vigarista. Ele enrolou a língua
durante um bom tempo e, no final pôs as cartas na mesa. Era um torcedor rico do
San Lorenzo chamado Martinez e propôs-me o seguinte: - Dou 7.500 pesos para você amolecer o jogo
de domingo. Fiz uma aposta de 15 mil. Se eu ganhar nós repartimos o lucro. Você
é brasileiro e o nosso futebol pouco lhe importa. O Ferro Carril pequeno e dois
pontos a mais ou menos não fazem diferença e nem lhe trará mais glória. O San
Lorenzo precisa da vitória e eu do dinheiro. Você aceita?
Era a conversa de todos os emissários.
E continuou – Além do
que você se venderá para seu futuro clube, pois você já está na lista das
contratações imprescindíveis do próximo ano. Compreendeu?
- Compreendi...volte as
6 horas da tarde com dois mil e quinhentos pesos. É o sinal para fazer o
negócio – O vigarista respondeu: hoje mesmo você terá os dois mil.
- Mal o homem virou as
costas corri para o presidente. Contei com todas as minucias a conversa que
mantive com aquele vigarista. O presidente ficou possesso, começou a tremar e a
mudar de cor e gritou: Esse miserável merece uma bala na cabeça. Vou convocar a
diretoria imediatamente...iremos direto a delegacia!
- Na polícia, os repórteres farejaram a coisa e a bomba
deveria estourar naquele dia mesmo. Foi um escândalo dos diabos. Às 6 horas
chegamos à pensão. Disfarçadamente vieram os repórteres, diretores e dez
“tiras”. Era uma quinta feira, três dias antes do jogo. A dona da pensão
desesperada com tamanho aparato bélico começou a pedir pelo amor de Deus para
que todos abandonassem, a casa, pois isso ia arruinar a reputação do
estabelecimento. O homem não apareceu. Escondera-se por perto quando viu o
movimento, fugiu. Dez minutos depois telefonava:
- Você quis me trair, mas não teve sorte. Sou
mais esperto do que você. Perderá o jogo, o dinheiro e não me prenderá. Trouxa!
Sei onde você e vou dar uma surra. Faço parte de uma quadrilha. Vamos lhe
arrebentar.
Se eu já era querido,
depois destes acontecimentos a simpatia dos argentinos transformou-se numa
quase idolatria. Agora, era respeitado não apenas como profissional, mas como
homem também. Domingo chegou. O jogo também. Estava nervoso e assustado com as
ameaças do bandido. O San Lorenzo espremeu o nosso quadro dentro da área e o
jogo terminou em zero a zero. Fiz uma grande partida. Foi a minha consagração
no futebol argentino.
(Memórias do Jurandir - da Gazeta Esportiva de São Paulo).
BIGUA E O TRI
CARIOCA DE 1944
Quando estava vivo, o craque
Biguá do Flamengo relembrou a conquista do tri campeonato de 1944. Aqui está o
relato do antigo jogador do Mengo.
Foi a maior
emoção que tive como jogador do Flamengo. Nosso time ficou desfalcado durante
toda a campanha do tri de seu maior jogador, o Domingos da Guia. Aliás,
Domingos foi o maior jogador de futebol da sua época. Ele jogou conosco em 1942
e 1943, mas no ano seguinte foi para o Corinthians. O time sentiu muito a sua
falta. Afinal era a nossa peça mais importante. Em seu lugar entrou Quirino,
que procurou dar tudo de si para que ninguém sentisse a falta do grande
Domingos da Guia. Mas não era a mesma coisa. Nosso técnico, Flavio Costa, costuma
chamar o Quirino e dizer que ele podia jogar igual ao Domingos, bastava querer.
O rapaz ficava empolgado e às vezes, até surpreendia, tal a sua vontade de
vencer. Naquele ano, além de Domingos, o time ficou desfalcado de Perácio, que
foi para a guerra. No seu lugar entrou Tião. Mas, da mesma forma que o Quirino
não substituía bem o Domingos, o Tião não era igual ao Perácio.
A partida
decisiva pelo tri campeonato foi contra o Vasco, na Gávea. Ganhamos de 1x0, no
peito e na raça. Quando ninguém mais acreditava no titulo, eis que os jogadores
se superaram e arrancaram o tri campeonato histórico para as cores rubros
negros. Foi uma conquista memorável. O time do Vasco era superior ao nosso e
estava completo. Mas nós tínhamos a vantagem de jogar em casa, onde
dificilmente perdíamos. Prá falar a verdade esse era o nosso único ponto
positivo e nós não podíamos deixar escapar um titulo tão importante, dentro do
nosso terreno. Entramos em campo certos de que enfrentaríamos uma batalha dura,
mas sabíamos também que cada um de nós daria o máximo para chegar a vitória. A
vitória de 1x0, gol de Valido, foi contestado pelos vascaínos. Para o Flamengo
o que interessava é que conquistamos o tri campeonato carioca em 1944 e aquele
dia se tornou um dia de glória para os jogadores da Gávea. Foi um titulo muito
importante e um dia muito especial na minha carreira – concluiu Biguá.
(da Manchete Esportiva)
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